Os números mentem?

Há uma expressão que traduz verdade incontestável: os números não mentem. Mas dependem, quando índices ou estatísticas, de comparações que muitas vezes, não devidamente explicadas, nos levam a equívocos gigantescos ou erros grotescos. Há relatividade entre o número que se considera e outros que, por exemplo, medem fenômenos semelhantes em outras épocas ou lugares.

Uma lagartixa, olhada do lado correto de um binóculo, parece um crocodilo. E um crocodilo, visto a partir da parte oposta do instrumento óptico, fica pequeno como uma lagartixa. Assim, pode-se afirmar que os números não mentem, mas quem os exibe pode, conforme a maneira que o faz, promover espetáculos de ilusionismo.

No noticiário do governo e mesmo nas estatísticas que divulga, colhidas em várias instituições sem nenhum interesse em oferecer dados falsos ao público, temos visto que a mensagem que se transmite é que o País está crescendo, que já conquistou a desejada posição de, economicamente, poder andar pelas próprias pernas e que nunca, na história deste País, houve tanto progresso como agora.

Em alguns comentários, neste espaço, alertamos para a relatividade dessa propaganda, orientando para que sejam feitas comparações do que estamos conquistando com o que outros países têm conseguido.

Dentro desse clima de euforia instalado pelo nosso governo, acabamos de levar um balde d´água fria no nosso entusiasmo quando o Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgou, na quarta-feira da semana passada, projeções que dizem que a nossa economia deve crescer, neste ano, 3,5%. Este número não justifica a festa que o nosso governo anda fazendo, tanto mais que no ano passado nosso PIB cresceu menos que os de todos os países da América Latina, exceto o miserável Haiti.

O crescimento agora previsto para o Brasil é mais uma vez menor que a média mundial, menor do que a média da América Latina e, oxalá, pelo menos continue superior ao do Haiti.

O Fundo considera que o crescimento global será de 4,9%, 0,6 ponto acima da projeção que fez anteriormente, o que se deu em setembro do ano passado. Para o ano que vem, prevê um crescimento de 4,7%.

Pelo visto, ou o FMI está olhando o crescimento mundial com lente de aumento, e o nosso, com os olhos do lado contrário do binóculo, ou as nossas autoridades estão jogando com os números, crentes de que o povo brasileiro vai engolir um crescimento de 3,5% como satisfatório.

O FMI não desmente que a economia brasileira mostrou sinais de aceleração recentemente e aconselha que o governo brasileiro continue a redução dos juros para estimular os investimentos.

?Com a pressão inflacionária moderada e a expectativa controlada, há espaço para continuar a redução gradual da taxa de juros iniciada em setembro de 2005?, diz o relatório do FMI. E o Copom do Banco Central parece disposto a seguir essa cartilha, pois acaba de, mais uma vez, cortar os juros básicos (Selic). Mas os bancos resistem.

Neste ano, segundo as projeções da entidade internacional, a América Latina deve crescer em média 4,3% e 3,6% no ano que vem.

Em conclusão, os números efetivamente não mentem e a verdade que nos contam nos coloca na rabeira dos países da América Latina e entre os pobres do mundo. Mas as nossas autoridades, quando é para fazer propaganda do que fazem ou esconder o que não fazem, mentem, e descaradamente.

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