Os hospitais, pacientes e o problema da cobertura dos planos de saúde

A precariedade do serviço público de saúde brasileiro impôs aos cidadãos mais favorecidos a utilização de serviços médicos prestados por particulares, especialmente através dos planos de saúde.

Em vista desse quadro caótico da saúde pública, não se pode negar que a atividade explorada pelas operadoras de planos ou seguros de saúde é de grande repercussão social, vez que a cada dia que passa, mais e mais brasileiros aderem a este tipo de serviço, visando a proteção e a segurança contra os riscos que envolvem sua saúde e de sua família.

Todavia, mesmo se valendo dessa opção, o brasileiro ainda encontra dificuldades quando precisa tratar de sua saúde. Além do alto custo das mensalidades e dos reajustes anuais da carteira, um dos mais sérios problemas enfrentados pelo paciente credenciado a um plano de saúde é a cobertura dos serviços a serem prestados.

Muitos já devem ter experimentado a situação de estar internado e precisar de um medicamento ou de ter de se submeter a um exame que não estava coberto pelo plano, tendo que arcar com os gastos decorrentes da negativa do convênio.

Tal situação, rotineira nos dias de hoje, não vem recebendo a devida atenção das autoridades competentes (Ministério da Saúde e Agência Nacional de Vigilância Sanitária -Anvisa), o que obrigou os beneficiários do plano de saúde, de uns tempos para cá, a buscar seus direitos junto ao Judiciário, ante sua condição de consumidor perante os planos de saúde.

Logicamente que é de conhecimento geral os elevados custos da medicina na atualidade. Entretanto, a produtividade e o lucro das operadoras dos planos de saúde jamais podem se sobrepujar à verdadeira missão do médico que é defender a vida do paciente, utilizando-se de todos os meios e técnicas disponíveis, cobertas ou não pelo plano de saúde.

Nessa toada, importante salientar que quem detém a autoridade para eleger o tratamento do paciente é única e exclusivamente o médico e nunca o plano de saúde. Ou seja, não pode o plano de saúde, de forma alguma, interferir em um tratamento sob o argumento de que o mesmo é de custo elevado, ou de que existem técnicas mais baratas.

Já existem inúmeras decisões judiciais obrigando os planos de saúde a cobrirem despesas decorrentes de tratamentos quimioterápicos, fornecimento de medicamentos para tratamento de doenças como AIDS, Hepatite C, etc., mesmo havendo restrição de cobertura no contrato firmado pelo paciente junto ao plano de saúde. Tal posicionamento se justifica, na medida em que referidas restrições são abusivas em face do consumidor, haja vista que tais contratos versam sobre o bem jurídico de mais elevado valor para o consumidor, que é a sua saúde, a qual é protegida em sede constitucional, inclusive.

Em decorrência disso, permite o artigo 47 do Código de Defesa do Consumidor, que o julgador faça uma interpretação mais favorável do contrato ao consumidor, obrigando o plano de saúde a pagar eventuais despesas no tratamento ditas como não cobertas.

Assim sendo, nota-se que o consumidor encontra-se de certa forma protegido, desde que se socorra junto ao Judiciário, contra os abusos perpetrados pelos planos de saúde no que se refere à negativa de cobertura de determinados tratamentos.

Entretanto, o mesmo não pode ser dito em relação aos Hospitais, em especial àqueles que não são vinculados ao Sistema Único de Saúde.

Tal afirmação é verdadeira, na medida em que os Hospitais particulares não podem ser vistos como consumidores do plano de saúde, muito menos podem interferir no tratamento indicado pelo médico.

Assim, se o médico determina a realização de um tratamento não coberto pelo plano, o Hospital é obrigado a fazê-lo, esteja o plano pagando ou não, sendo que em caso de não pagamento por parte do plano, deverá cobrar diretamente do paciente.

São nessas situações em que ocorrem as maiores perdas dos Hospitais particulares nos dias de hoje, pois na maioria das vezes o paciente não tem condições financeiras de bancar o tratamento não coberto pelo plano, ficando o Hospital com o prejuízo.

A grande realidade é que os hospitais particulares ficam entre a cruz e a espada, na medida em que não podem se negar a continuar o tratamento, mesmo sabendo que o mesmo foi negado pelo plano de saúde, sem, contudo, poder tomar qualquer atitude frente ao plano de saúde, tendo que contar com a sorte de receber algo do paciente, em decorrência de um contrato de prestação de serviços firmado com o mesmo quando de seu internamento.

Deste modo, verifica-se que a única garantia de recebimento dos hospitais nesses casos é o contrato de prestação de serviços médico-hospitalares, o qual poderá ser objeto de demanda judicial em caso de não pagamento voluntário da dívida, tendo o nosocômio credor que aguardar os trâmites legais lentos e burocráticos da justiça para receber por serviços e medicamentos fornecidos na época do internamento.

Nota-se, portanto, que enquanto não houver uma maior proteção aos hospitais particulares frente às mazelas criadas pelos planos de saúde para com seus beneficiários, o contrato de prestação de serviços firmado entre hospital e paciente se revela como o instrumento garantidor de recebimento dos serviços prestados, de sorte que os hospitais devem possuir contratos redigidos de forma clara, abrangendo todas as situações cotidianas decorrentes da prestação de um serviço médico, observando os ditames legais concernentes à espécie.

João Paulo Bettega de Albuquerque Maranhão é avogado em Curitiba-PR.

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