Crise no agronegócio põe produtor na rua

A crise do setor do agronegócio, provocada pela estiagem, oscilações no câmbio e aumento nos custos de produção, motivou a organização de um grande protesto ontem, em todo o Brasil. No Paraná, cerca de 9 mil produtores rurais de pouco mais de 50 municípios, de posse de máquinas agrícolas, se concentraram na frente do Sindicato Rural de Londrina. Na PRT-466, Km-82, em Ubá do Sul, nas proximidades de Londrina, houve uma interdição entre 9h e meio-dia e posteriormente a partir das 16h30, por cerca de uma hora. Segundo informações do Cabo Marçal, da Central da Polícia Rodoviária Estadual, 100 veículos, 50 máquinas e 350 agricultores fecharam a estrada.

O objetivo do protesto foi chamar atenção do governo federal, da mídia e da comunidade para a renegociação das dívidas contraídas com a última safra, estimadas em R$ 20 bilhões em todo o País, e garantias para o plantio da safra que será colhida em 2006.

?Foi a forma organizada que encontramos de fazer pressão para que alguma providência seja tomada antes que a próxima safra também seja comprometida?, disse o presidente do Sindicato Rural de Londrina, Luiz Fernando de Almeida Kalinowski. Após o protesto, foi assinada a Carta do Paraná, que reúne as principais reivindicações dos agricultores paranaenses.

Segundo estimativas da Federação de Agricultura do Estado do Paraná (Faep), as perdas dos produtores rurais no Paraná provocadas pela estiagem chegam a R$ 3 bilhões, o que corresponde em média a 20% da colheita. O produto que mais sofreu perdas foi a soja, carro-chefe do setor agrícola no Paraná.

?A estiagem foi apenas um dos fatores agravantes. Não bastassem as perdas provocadas pela falta de chuvas, os produtores sofrem com a queda do dólar?, lamenta Kalinowski. Com a desvalorização da moeda, o prejuízo dos agricultores foi inevitável. ?Os insumos foram obtidos com o dólar a R$ 3,10. Agora, temos que pagar as dívidas recebendo o pagamento da safra com o dólar valendo R$ 2,30?, explica. A variação de câmbio provocou diretamente a queda dos preços das sacas dos produtos. Sem capital suficiente sequer para saldar as dívidas com cooperativas e empresas de financiamento agrícola, o temor é que os produtores fiquem sem crédito para investimento na próxima safra.

?Precisamos de uma liberação emergencial de linhas de crédito e maior prazo para a quitação das dívidas, já que o mercado financeiro não permite o pagamento imediato?, resume Kalinowski. Caso essas medidas sejam atendidas, as associações ligadas aos trabalhadores agrícolas apostam na recuperação do setor de agronegócios.

Protesto foi registrado em vários estados

O protesto dos produtores rurais aconteceu ontem também em outros estados, como Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul, São Paulo e Tocantins, com adesão de produtores do triângulo mineiro, oeste da Bahia, sul do Piauí, sul do Maranhão e nordeste do Pará. Além da reclamação consensual sobre as oscilações cambiais, que fizeram despencar o preço dos produtos agrícolas, alguns reclamaram do excesso de chuvas, em contraponto aos paranaenses, prejudicados pela seca.

?O agricultor que está pedindo refinanciamento é o mesmo que gerou US$ 34 bilhões na balança comercial?, disse o presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Antônio Ernesto de Salvo. O dirigente ressaltou que a crise atinge segmentos específicos, e não a agropecuária, de forma generalizada. As áreas de café e cana-de-açúcar, por exemplo, passam por momento positivo, com recuperação de preços. Mas os setores de grãos, como soja e arroz, principalmente nas áreas atingidas pela seca, precisam de atenção especial.

No Pará, produtores de arroz enfrentam preços de venda abaixo do custo de produção. Em Goiás, o protesto dos produtores ocorreu em cerca de cem municípios, em todas as regiões. Rio Verde e Itumbiara foram os locais com maior concentração de produtores. Em Itumbiara, os produtores se deslocaram para a BR-153, interrompendo o tráfego na ponte sobre o Rio Paranaíba. Os produtores rurais de Mato Grosso do Sul conseguiram adesão de mais de 40 entidades de classe para a mobilização. Foram entregues panfletos que explicam a crise do agronegócio, mostrando que os problemas no campo também atingem os setores de transporte, comércio e indústria.

No Rio Grande do Sul, 350 tratores, 118 ônibus, 262 caminhões foram reunidos em frente ao prédio do Ministério da Fazenda, em Porto Alegre, em protesto organizado pela Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul). Os produtores se concentraram no Parque de Exposições Assis Brasil, em Esteio, e rumaram a Porto Alegre pela BR-116. Além do protesto na capital, produtores rurais de Santa Vitória do Palmar e de Chuí colocaram tratores e colheitadeiras em diversos pontos da BR-471, devendo permanecer às margens da rodovia por três dias. Em Itaqui e São Borja, produtores de arroz também realizam protestos, principalmente contra a importação do grão da Argentina e Uruguai.

Em São Paulo, lideranças do setor agropecuário da região de Palmital realizam a manifestação na rodovia Raposo Tavares, reunindo cerca de 400 caminhões, tratores e máquinas agrícolas. O quadro de calamidade enfrentado pela região é real, inclusive com o decreto de situação de emergência assinado por 22 prefeitos da região. Em condições normais, a produção de soja em Palmital poderia render cerca de 1,5 milhão de sacas que, comercializadas nos preços atuais, resultariam em cerca de R$ 45 milhões, no entanto, a faturamento resultou em pouco mais de R$ 28 milhões, cerca de R$ 17 milhões deixaram de ser gerados no município, só com a soja.

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