Coisa legítima

Diz-se aqui e acolá que os brasileiros do Sul não têm tempo para fazer política. Precisam trabalhar. À conta disso, em que pese a força econômica da região, não produzem força política adequada ou necessária ao encaminhamento de suas aspirações. E isso se reflete em realizações públicas que dependem da política, como estradas e demais serviços de infra-estrutura, inclusive aquelas ligadas ao turismo, à saúde, à segurança e à educação.

A falta dessa força política de que falamos deixou-nos transitando longos anos por uma estrada federal chamada BR-101 (no Paraná ela nem existe!) pela hora da morte. Empurrou-nos à privatização do Anel Rodoviário que, embora sem significativas melhorias, é hoje objeto de inúmeras cancelas de pedágio. Num outro extremo, viu desaparecer sem reação a malha ferroviária que um dia prometia novos tempos na economia da antiga Quinta Comarca de São Paulo.

A interligação rodoviária entre os próprios estados da região Sul é precária: pela BR-116 está simplesmente uma lástima depois da divisa com Santa Catarina (o trecho melhor, até Rio Negro-Mafra, terá pedágio em breve); pela BR-101, duplicada até Florianópolis e também prestes a ser pedagiada, há o gargalo que vai até depois da divisa com o Rio Grande do Sul; pelo caminho que leva à Transbrasiliana, ao centro, as péssimas surpresas são conhecidas desde a entrada para o caminho da Lapa, cuja comunidade recorreu ao pedágio para se livrar dos buracos. De São Paulo para baixo, a velha Rodovia Régis Bittencourt encerra e resume a timidez política do sul-brasileiro, trabalhador e ordeiro, mas pouco articulado em torno de seus interesses coletivos. A análise vale para quase todas as outras áreas.

O deputado federal Gustavo Fruet acaba de colocar o dedo nessa ferida ao denunciar o que já se sabia: “As diretrizes políticas (do governo federal) preponderam sobre as técnicas na hora de liberar recursos”. Desde abril – meio ano, portanto -, o parlamentar teve que esperar pacientemente para obter a resposta do governo federal a um seu pedido de informações sobre distribuição de verbas amealhadas com os sucessivos recordes de arrecadação de tributos. Descobriu que enquanto o Paraná recebeu R$ 35,9 milhões em transferências voluntárias da União, o Piauí, governado pelo petista Wellington Dias, abocanhou quase o dobro – R$ 67,8 milhões. Aprofundando suas denúncias sobre o clientelismo que predomina no governo, Fruet mostrou que no primeiro semestre deste ano, enquanto os quatro estados governados pelo PT tiveram aumento médio de 84,1% nos repasses, o total nacional caiu 3%! Apenas uma coincidência?

As observações do parlamentar já foram por este jornal publicadas, mas merecem a repetição: “Isso mostra claramente que não há critério técnico para o repasse de verbas. Assim, administrações não alinhadas politicamente com o governo federal ficam prejudicadas pela falta de recursos, o que é inadmissível”. Antes de lembrar a ameaça, dita e repetida em São Paulo pela candidata do PT, segundo a qual se ela não ganhar o município terá que passar os próximos quatro anos a pão e água, faça-se, a bem da verdade, um pequeno reparo: a atual administração do Paraná não pode ser entendida como não alinhada ao governo federal. Mesmo assim – os números estão aí -, tem merecido apenas a metade da atenção dispensada ao Piauí.

Temos para nós que a análise do deputado Fruet é correta circunstancialmente, mas carece ir mais além para fazer justiça ao entrevecimento histórico de que sofrem nossas forças políticas, tímidas em quase todos os episódios da vida regional e também daquela nacional, independentemente de alinhamentos ou desalinhamentos políticos. Sem o inútil apelo a regionalismos ou separatismos, que volta e meia permeiam discursos menos preparados, só os números acima apresentados já constituiriam combustível suficiente para mover a classe política paranaense (e a de todo o Sul) no sentido de colocar a boca no trombone. É coisa legítima.

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