OAB lança campanha pela democracia

Rio de Janeiro – "Se a finalidade última do Estado é prover a realização do bem comum do povo, nada mais justo e necessário do que garantir ao próprio povo a plena titularidade dessa soberania." Com essa afirmação, o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Roberto Busato, lançou ontem a Campanha Nacional em Defesa da República e da Democracia.

O movimento objetiva ampliar a participação popular nas decisões nacionais. "Já é tempo de nos darmos conta de que uma república não é, simplesmente, o regime político oposto à monarquia, como, aliás, constou do plebiscito de 1993, determinado pelo artigo segundo do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias." O lançamento do movimento cívico foi feito na sede da Seccional da OAB do Rio de Janeiro, na presença de diversas personalidades, presidentes de tribunais superiores, de associações jurídicas e membros da diretoria do Conselho Federal da entidade.

Durante o ato de lançamento da campanha, o presidente da OAB anunciou o encaminhamento, juntamente com a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), de projeto de iniciativa popular para substituir a Lei n.º 9.709, de 18 de novembro de 1998, que não vigorou na prática. O objetivo é regulamentar as consultas populares, a realização de plebiscitos e referendos no Brasil, criando um regime reforçado para as leis de iniciativa popular. A realização desses instrumentos está prevista no artigo 14 da Constituição Federal.

"Delegados do povo"

Num autêntico regime democrático, todos os agentes públicos são delegados do povo, conforme expressou em seu discurso o presidente da OAB. "Como tais, estão submetidos não só às decisões do soberano sobre as grandes metas da ação dos poderes públicos, mas também sujeitos à permanente censura popular no desempenho de suas atividades", afirmou Busato.

O projeto de lei que será encaminhado objetiva aumentar a participação popular nas decisões nacionais. Isso porque, conforme Busato, a realidade do povo brasileiro, no decorrer da história, tem sido a de mero espectador. "Como se não bastasse, é um espectador sui generis porque é sempre ele, e não os atores, que paga a conta do mau desempenho cênico das peças em cartaz."

Busato ressaltou, ainda, a escolha do Rio de Janeiro como sede do lançamento da campanha. Ele afirmou que, na cidade, encontram-se hoje as forças organizadas da criminalidade, cuja ação das autoridades constituídas têm se revelado impotentes. O lançamento do ato na capital fluminense visa chamar a atenção das autoridades e da opinião pública para o problema da falta de segurança. "Entre os direitos essenciais do homem, os quais não podem sofrer limitações de nenhuma sorte, está o direito à segurança."

"Liberdade está em risco"

Rio de Janeiro – Um dos primeiros parlamentares a chegar à cerimônia de lançamento da Campanha Nacional de Defesa da Democracia, na sede da OAB do Rio de Janeiro, o deputado federal Miro Teixeira (PPS-RJ), ex-ministro das Comunicações no governo Lula, elogiou a campanha. "A Ordem dos Advogados do Brasil está mais uma vez à frente dos acontecimentos. Esta é uma discussão que vem sendo adensada, vem sendo aprofundada em alguns países do mundo. Recentemente, na Espanha, num evento presidido pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, discutiu-se o destino, digamos assim, da democracia", avaliou o deputado.

Ele disse que a democracia e a liberdade estão em risco. "Sobretudo essa democracia – não meramente a palavra democracia – capaz de levar à população avanços que signifiquem verdadeiramente liberdade e poder de decisão. Acredito que a partir desse encontro da OAB vamos discutir outras vertentes da democracia, que a fortalecerão como a democracia semidireta e a democracia direta. O parlamento tem que receber os projetos de iniciativa popular. E a sugestão que eu trago é que se modifique a Constituição, dando a essas iniciativas a urgência urgentíssima para a sua tramitação."

Juízes criticam governo

Rio de Janeiro – O vice-presidente da Associação Brasileira dos Magistrados (AMB), desembargador Thiago Ribas Filho, elogiou a Campanha Nacional de Defesa da República e da Democracia e criticou a postura do Estado brasileiro.

"A Associação dos Magistrados Brasileiros está inteiramente de acordo com o projeto que foi apresentado aqui, visando a regulamentação ao artigo 14 da Constituição Federal. O momento que vivemos é um momento de fragilidade do Legislativo, totalmente dominado pelo Executivo", disse.

Para o vice-presidente da AMB, a reforma do Judiciário também precisa avançar. "A reforma não faz com que o Judiciário seja mais ágil. O que se pretende é que ele seja também dominado pelo Poder Executivo. Por isto, estamos de pleno acordo com a proposta e, como representante da AMB neste ato, assinamos o importante projeto", comentou.

Apoio

Já o integrante do Movimento Social dos Trabalhadores Sem Terra (MST), Gilmar Mauro, parabenizou o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Roberto Busato, pela apresentação de projeto de lei visando à regulamentação dos referendos e plebiscitos no Brasil. Se aprovado, segundo ele, o projeto vai sanar a esquizofrenia do brasileiro no que diz respeito à participação popular. "Nesse país, se construiu uma espécie de autocracia. Houve uma conjugação das oligarquias agrárias com certos setores da burguesia brasileira, que viram sempre o povo como algo distante da participação. O povo servia para trabalhar e não para participar da vida política do país", afirmou. Para Mauro, a participação popular sempre foi inibida no País e é isso que o projeto de lei da OAB vai estimular. "O povo brasileiro deve decidir os destinos desse país. "Se desenvolvermos esse trabalho, possivelmente vamos conseguir um dia chegar a um estágio tal no qual as pessoas, de fato, consigam obter a sua cidadania e a sua dignidade", finalizou.

"Povo está maduro", diz CNBB

"Ao contrário do que se apregoa em certos organismos do nosso País, o povo já tem maturidade e o direito de discutir com profundidade os assuntos que dizem respeito aos destinos da nação." A observação é do representante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Dimas Lara Barbosa, bispo auxiliar do Rio de Janeiro, feita durante pronunciamento no lançamento da Campanha Nacional de Defesa da República e da Democracia. Ao fazer um relato das parcerias realizadas entre CNBB e OAB, o bispo desejou sucesso em "mais esta iniciativa em defesa da cidadania".

"Eu gostaria de lembrar que as parcerias entre a CNBB e a OAB já vão se tornando históricas. Em vários momentos da história do Brasil aconteceram essas parcerias. Lembro o caso das Diretas Já, lembro também algumas iniciativas importantes de cidadania, como é o caso da Lei 9.840, até agora a única de iniciativa popular, contra a corrupção eleitoral, particularmente no que diz respeito à captação de sufrágio", comentou.

Plebiscito

Segundo ele, a CNBB, através do setor social, apoiou juntamente com diversas outras organizações a realização de dois plebiscitos de caráter nacional: o da Alca e o da Dívida Externa. "Este último recolheu inclusive quase oito milhões de assinaturas em todo o Brasil. Eram apenas indicativos esses plebiscitos, uma vez que eles não têm força de lei. Por isso, nós vimos com muita satisfação mais essa iniciativa da CNBB em defesa da cidadania e acreditando que o nosso povo, ao contrário do que muito se apregoa em certos organismos do nosso País, já tem maturidade – e não só maturidade, tem o direito – de estar discutindo com profundidade os assuntos que dizem respeito aos destinos da nação. Então, nossos parabéns à ordem por mais esta iniciativa".

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