Benê Marques, que por muitos anos dirigiu uma rede de emissoras de rádio no Paraná, um dia foi convidado para candidatar-se a um cargo político eletivo. Disse não. E explicou: ?Quando eu era criança, peguei um botão da caixa de costuras da minha mãe, sem o consentimento dela. Era para completar o meu joguinho de botões. Se eu for candidato e descobrirem, vão dizer que sou ladrão?.
Em comparação com os valores que foram desviados, embolsados, mal usados e surrupiados pelos políticos no escândalo do mensalão, inclusive gente do comando do PT, Lula ter ficado devendo ao partido R$ 29.436,26 é uma ninharia. Só não é ninharia se essa importância for comparada ao nosso ínfimo salário mínimo, aos milhares de brasileiros que ganham ainda menos do que isso e aos que nada ganham e dormem na rua ou embaixo das pontes.
De qualquer forma, ficou o mistério. Pagaram o empréstimo. Quem pagou? Teria sido uma microscópica maracutaia, porém suficiente para deixar o presidente em situação embaraçosa, numa hora em que o seu governo está enredado?
O atual presidente do Sebrae, Paulo Okamoto, ex-tesoureiro da campanha eleitoral de 1989 do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, acaba de revelar que foi ele quem providenciou o pagamento da dívida pessoal do presidente com o PT. Assim, fica claro que era uma dívida pessoal e o PT era o credor. A dívida foi quitada em quatro parcelas, entre dezembro de 2003 e fevereiro de 2004.
?Não contei, não comentei nada com ele (Lula). Não ia ficar enchendo o saco dele com uma coisa como essa?, disse Okamoto, amigo do presidente desde muitos anos e companheiro de lutas sindicais.
Teria Okamoto, nomeado para o cargo no Sebrae por Lula, pago do próprio bolso a dívida do companheiro presidente? Se o fez, foi um agrado talvez merecido, mas de qualquer forma pouco recomendável. Se o dinheiro era do PT, embora pareça que o Partido dos Trabalhadores funcionava como instituição financeira, não era sua missão andar pagando contas particulares de filiados. Mesmo que fosse o seu mais ilustre membro. O Banco do Brasil andou dizendo que o próprio Lula havia pago a conta. Okamoto desmente.
Lula evitou o assunto e o Planalto, através de seus porta-vozes, insistiu que desconhecia o caso.
O dinheiro foi para gastos com viagens, pagamento de passagem aérea da primeira-dama Marisa Letícia, e adiantamentos. Isso é legal? Se for, nada a reclamar.
Se não, o presidente se insere na balbúrdia que tomou conta do governo, do Congresso, de bancos, Delúbios e agências publicitárias, dos Correios e outras estatais. E isso é profundamente lamentável, pois embora a maioria dos brasileiros, inclusive da oposição, rezem para que ele saia indene dessa tempestade, mesmo considerando-o ingênuo e omisso, acabará enredado por causa de algo tão pequeno como o ?botão da caixa de costuras da mamãe?.
No caso de Lula, não basta que ele seja de alma limpa e tenha fama de honesto. Ou proclame aos quatro ventos que é honesto. Precisa, nas circunstâncias atuais, provar a toda hora que é honesto, pois ao redor dele pululam malandros. E malandros não de tostões, mas de muitos milhões.