O “Coração Valente”, que transforma sonhos em realidade

 

fotos/ João de Noronha
É um grande exemplo de vida. Um dos mais efetivos avantes do futebol brasileiro, Washington ressurgiu para o futebol depois de passar por uma delicada cirurgia que livrou-o de um sério problema do coração. Ressurgiu no alto e hoje é o principal artilheiro do Campeonato Brasileiro pelo Atlético Paranaense, já pensando no retorno à seleção brasileira. Para falar de sua vida, de suas emoções, de seus planos e futuro, apreciador que é de frutos do mar, Washington encontrou a equipe do Paraná Online no restaurante Bar do Victor, recém-eleito o melhor do gênero em Curitiba. Confira a conversa.

Luiz Augusto Xavier ? Você teve um sucesso muito grande, chegou à seleção brasileira e, agora, o Brasil volta a falar de você. Parece que te descobriram de volta. Você se sente assim?

Washington ? Acho que sim. Uma pelo fato de, depois de ter vivido um grande momento, chegando à seleção, ter criado um nome dentro do cenário nacional, eu ter ido para a Turquia, que a mídia brasileira não dá muito valor. Fiquei meio escondido e juntou com o problema que eu tive. Daí, com o tempo que eu fiquei na Turquia, mais o um ano que fiquei sem jogar, me deixou realmente um pouco sumido. Mas agora, voltando ao cenário nacional e fazendo uma grande campanha no futebol brasileiro, esse é um reencontro meu com o público e com a mídia.

Xavier ? E você está se sentindo bem assim?

Washington ? Estou me sentindo bem, não só pelo fato de estar vivendo um grande momento dentro do Atlético, fazendo gols. Eu estou me sentindo bem porque eu lutei por isso, me esforcei para que eu recuperasse minha condição de atleta, voltasse a jogar e hoje estar fazendo o que eu mais sei fazer, o que mais gosto de fazer e fazendo aquilo que eu mais pensei e lutei para fazer, que é jogar futebol.

Gisele Rech ? Você foi rejeitado em outros clubes antes de o Atlético abrir as portas para você?

Washington ? Fui rejeitado por um clube, o Fenerbaçhe. E era o clube que tinha os meus direitos, o clube que comprou o meu passe e o clube que eu estava vestindo a camisa quando me aconteceu o problema. Esse foi o único clube que me rejeitou. Houve outros clubes que demonstraram interesse em me recuperar, em me fazer voltar a jogar, mas não tanto quanto o Atlético. Esse realmente, além de mostrar o interesse foi lá, brigou e fez com que eu voltasse.

Xavier ? Isso te dá uma dupla motivação? A impressão que se tem é que você está pagando uma dívida de gratidão, que eu acho até que já pagou.

“Eu não estou, no Atlético, satisfeito em só fazer boa campanha fazendo gols. Eu só vou me sentir satisfeito quando eu for campeão para o Atlético. É uma satisfação que eu tenho, que não é uma obrigação, mas para mim parece que é.”

Washington ? Justamente, eu tenho sim. É engraçado, eu não estou, no Atlético, satisfeito em só fazer boa campanha fazendo gols. Eu só vou me sentir satisfeito quando eu for campeão para o Atlético. É uma satisfação que eu tenho, que não é uma obrigação, mas para mim parece que é. É claro que se vocês perguntarem para o presidente, para o Petraglia, para qualquer dirigente, todos eles vão dizer que eu não tenho obrigação de ser campeão. Mas eu me sinto nessa responsabilidade de fazer com que o Atlético cresça mais, apareça mais e eu apareça junto com o Atlético, sendo campeão.

Cristian Toledo ? E nesse ponto, a gente percebe que pela primeira vez, no Brasil, você tem a oportunidade de jogar em um time de ponta. Você sente que pode se consagrar de vez no Brasil?

Washington ? Em termos de título eu acho que sim, mas em termos de mídia eu acho que não. Porque, na Ponte Preta, infelizmente, nós estamos no eixo Rio-São Paulo. A mídia, infelizmente, é muito maior lá. O Brasil presta muito mais atenção lá. É claro que eu fiz uma grande campanha na Ponte Preta e apareci muito para o Brasil, por isso que cheguei à seleção. Mas em termos de título, realmente, o Atlético Paranaense me dá condições de sonhar com o título. Com a Ponte Preta, eu cheguei a sonhar no Campeonato Paulista, que a gente chegou perto, mas em termos de Brasileiro, com o Atlético Paranaense o sonho parece mais possível.

Irapitan Costa ? E esse sonho inclui, além do título, ser artilheiro do Brasil?

Washington ? É um sonho também, já seria um sonho maior, mas o meu pensamento é ser campeão. Eu troco três vezes a artilharia do Brasil por esse título brasileiro pelo Atlético. É claro que eu valorizo por ser centroavante, eu sei que ser artilheiro do Brasileiro valoriza 100% um jogador, é ótimo. Mas eu estou pensando em ser campeão, independente de ser artilheiro ou não. É claro que se eu for artilheiro, melhor ainda. Mas é uma coisa que eu tenho dentro da alma: eu quero ser campeão pelo Atlético.

Rodrigo Sell ? E ainda pensa na seleção brasileira?

Washington ? Penso sim, ainda tenho como um objetivo.

Sell ? O fato de estar em Curitiba afasta um pouco essa possibilidade?

Washington ? Infelizmente isso é um fato. Por exemplo, se eu estivesse vestindo a camisa de um Corinthians, Palmeiras ou São Paulo na época em que eu estava na Ponte, em 2002, eu teria ido para a Copa do Mundo. Pelo momento que eu estava: tinha sido artilheiro do Campeonato Paulista, artilheiro da Copa do Brasil, vice-artilheiro do Brasileiro e estava sendo um dos artilheiros do Rio-São Paulo. Fui para a seleção mas não fui para a Copa. E digo agora também: se nesse momento eu estivesse sendo um dos artilheiros do Brasil jogando por um dos times do eixo Rio-São Paulo eu teria mais chances de ir para a seleção. Mas isso não impede que eu tenha chance de ir, e eu vou lutar. Eu estou encarando tudo como uma escada: primeiro eu queria voltar bem, estar numa situação boa para voltar jogar futebol, depois usar o Paranaense para ganhar ritmo de jogo, para no Brasileiro já estar mais ou menos, em condições de fazer uma boa campanha. E graças a Deus as coisas aconteceram muito depressa para mim, foi surpreendente até para mim mesmo. No Paranaense já comecei bem e, no Brasileiro, agora, estou muito bem, então eu já sonho um pouquinho mais alto, já sonho com a seleção. Acho que se continuar nesse caminho tenho chances sim. É claro que é difícil, porque tem muitos jogadores de qualidade, principalmente centroavantes, mas acho que tenho chance

Xavier ? E já tem precedentes, não é? Kléberson, Ilan, Adriano, todos do Atlético

Washington ? Justamente, o Atlético é um clube que sempre coloca jogadores na seleção, desde as categorias de base. Você pode ver que tem infantil, juvenil e junior do Atlético na seleção. E no profissional também, esse ano não chegou ainda mas no ano passado teve, como você mesmo citou, o Ilan o Adriano, o Kléberson.

Gisele ? Pelo que você falou dos times do eixo Rio-São Paulo, você ficou tentado quando houve aquela proposta de, antes da sua sexta partida, para você ir para o Corinthians?

Washington ? Se fosse em outra época, eu teria balançado, mas nessa situação que eu estou hoje, no momento que eu estou vivendo hoje no Atlético, não, em nenhum momento. O Tite me ligou, perguntou se eu tinha interesse de ir para o Corinthians, mas eu conversei com ele e disse: “Professor, eu tenho você como um grande treinador, como um grande amigo, mas nesse momento eu não posso e não quero sair do Atlético. É o clube que me deu toda condição, eu tenho orgulho de vestir essa camisa e tenho uma responsabilidade muito grande, neste momento, aqui no Atlético”. Inclusive, quando nos encontramos no jogo contra o Corinthians ele me parabenizou pela minha decisão e pediu até desculpas porque ele viu que eu estava em um momento em que não tinha nem como eu pensar em sair do Atlético. Futuramente, quem sabe, futuramente é outra história, mas agora, não tinha condições de eu sair do Atlético, por isso que nem me balançou. Tanto é que não foi proposta só do Corinthians. Teve proposta da Europa, da Coréia, que, em termos financeiros, eram tentadoras, mas estou com o pensamento tão grande no Atlético, tão grande nesse título, que nada ia me afetar naquele momento.

Cristian ? Você falou do Tite, por quem você tem muito carinho, até mesmo por vocês terem trabalhado juntos no Caxias. Que outras pessoas ajudaram no seu início no Caxias, antes de você vir para o Paraná?

Washington ? O melhor momento que eu tive no Caxias realmente foi com o Tite. Até com o Nestor Simeonato, que treinou o Grêmio no ano passado, eu estava começando a ter um destaque. Daí ele saiu e veio o Tite. O Tite consolidou meu bom momento no Caxias, porque ele é, sem dúvida nenhuma, um dos melhores treinadores do Brasil, um dos mais inteligentes, com muita visão de jogo taticamente. Ele me deu toda condição, fez com que o time jogasse para mim, até porque o Caxias sabia que eu seria a moeda da vez em termos de negociação, sabia que era meu momento e que eu era o jogador que poderia dar lucro para o clube. O Tite, além de treinador, foi um amigo para mim, nós conversávamos bastante. Eu vim para o Paraná Clube e ele foi campeão gaúcho com o Caxias. Aí ele foi para o Grêmio e fez aquela campanha brilhante e, quando eu estava na Ponte, ele pediu a minha contratação para o Grêmio. No jogo contra o Corinthians ele me disse: “Se você fosse só meu amigo eu não te chamaria para vir para o Corinthians. Eu queria você pelo momento que você está passando. Você é um dos melhores centroavantes do Brasil, eu queria que você me ajudasse aqui no Corinthians. Se fosse só por amizade eu te chamaria para um churrasco, para tomar cerveja e pronto”. Ele realmente foi o treinador que me deu o pontapé no Caxias para vir para o Paraná e depois ter o nome nacionalmente reconhecido.

Irapitan ? O forte do Tite é o tático, o técnico ou o psicológico?

Washington ? O forte dele é o tático e o psicológico, mais ainda o psicológico. Ele é um treinador que te motiva, que pega um jogador que está cabisbaixo e consegue levantar esse jogador. Ele é muito bom treinador taticamente, também, mas primeiro ele usa a psicologia, usa a motivação, ele motiva o grupo, motiva os jogadores.

Gisele ? O que é melhor, aquele treinador que grita o tempo inteiro, que fica vibrando bastante, ou o que espera para falar no vestiário?

Washington ? O treinador teria que ser uma mescla. Ele tem que ser motivador, tem que gritar ou tem que conversar, dependendo do momento, tudo tem sua hora. Cito também o Vadão, um dos grandes treinadores que eu tive também; o Nelsinho Batista; o próprio Felipão, que eu tive na seleção; o Leão, também e, agora, o Levir Culpi, que são os treinadores que eu mais considero, eles sabem que tudo tem sua hora. Tem o momento que você tem que gritar dor e tem o momento de passar a mão na cabeça do jogador. Você não pode ficar só passando a mão na cabeça porque o jogador extrapola, já se acha o dono da razão e acaba o treinador se prejudicando com isso. Tudo tem sua hora.

Irapitan ? Essa é uma regra que vale aqui para o Brasil ou vale também para o exterior?

Washington ? É mais aqui no Brasil. No exterior os jogadores são mais sérios, não digo mais profissionais, mas eles são mais sérios na hora de treinar. Apesar também que lá é difícil você pegar um treinador que passe a mão na cabeça. Eu tive experiência com alguns treinadores lá fora e eles são mais rígidos, eles cobram muito que o jogador dê 100% nos treinamentos, não são tão maleáveis. Por isso, desde sua criação, os jogadores já são um pouco mais responsáveis e, aqui, com treinadores mais maleáveis, o jogador, desde o começo de sua carreira, já tem o costume de lidar com treinadores mais maleáveis

Sell ? Você falou dos bons, mas quem são os treinadores enganadores? E o Mário Sérgio, foi sua maior decepção?

“O Mário Sérgio quer usar muito o esquema tático dele e que dê certo. Não importa se ele ganhou quatro ou cinco partidas, o importante é que dê certo o esquema que ele pensou. E, às vezes, não dá certo, como não deu conosco no Paranaense.”

Washington ? Eu não vou citar nomes, até por ética, não vou falar de treinador que está trabalhando em algum time por aí. Mas quanto ao Mário Sérgio, eu acho que sim. O Mário Sérgio é um treinador que estuda bastante e que tenta trabalhar muito taticamente uma equipe. Ele tenta fazer transformações na equipe. E ele é muito radical nesse sentido. Ele pega um time que ganhou cinco partidas, mas, se na sexta ele achar que precisa mudar o esquema, mudar os jogadores por causa do adversário, ele vai e muda. Dentro do futebol, principalmente o brasileiro, não é assim. Ele quer usar muito o esquema tático dele e que dê certo. Não importa se ele ganhou quatro ou cinco partidas, o importante é que dê certo o esquema que ele pensou. E, às vezes, não dá certo, como não deu conosco no Paranaense.

Xavier ? Você ficou frustrado por ter sido sacado naquela final?

Washington ? Fiquei muito frustrado, respeitei ele, respeitei a opinião dele, mas fiquei frustrado sim. Depois de tudo que passei, você entra em um campeonato e dá tudo certo. Você vai indo bem, indo bem, até surpreendente, como eu fui. Vice-artilheiro do campeonato, jogando menos partidas que o artilheiro e menos partidas que seus companheiros, daí chega a final do campeonato e você é tirado do time com se naquela partida você não serviria. Não sei se foi esse o pensamento dele, mas foi o que eu senti e o que todo mundo pensou: serviu até então e na final não servia mais.

Cristian ? Você chegou a sentir a virilha ou a panturrilha durante a final, chegaram a pedir a sua substituição e você disse que não ia sair. Era isso que fazia você se entregar tanto naquele jogo?

Washington ? Foi, foi mais ou menos isso, depois de ter saído da primeira final com um resultado negativo, a gente tinha que vencer a partida e, por volta dos 20 minutos de jogo, eu senti uma distensão na virilha. E eu falei: “poxa, não pode acontecer comigo”. Eu nunca tinha tido um distensão na vida, tanto é que eu cheguei para o doutor e falei: estou sentindo isso, expliquei os sintomas, mas não sei o que é. Aí eu falei, “mas eu vou voltar”, ele disse que não, que a contusão era séria e eu estava fora. Mas eu insisti em voltar, dizendo que o time precisava de mim e eu tinha que ganhar aquele jogo. Até, inclusive, no lance que eu machuquei nós empatamos e quando eu estava esperando para voltar para o campo, nós viramos. Aí eu pensei em dar o máximo de mim até quando desse. E estava querendo ganhar esse título para o Atlético, estava me superando até pelo fato de ter ficado fora da primeira final, mas infelizmente não deu, a distensão era muito grave e não tive condições de jogar.

Irapitan ? Foi o jogo mais eletrizante que você participou?

Washington ? Com certeza foi um dos mais eletrizantes, só não vou dizer o mais porque eu nem participei dele inteiro. Mas era um Atletiba, decisão de campeonato, movimentou a cidade inteira. A situação do jogo, uma final ser 3 a 3, é difícil acontecer, ainda em um clássico.

Xavier ? Quais foram os outros que você lembra?

Washington ? Teve um que me marcou muito que foi um jogo Caxias x Cruzeiro, antes de eu vir para o Paraná. Era Copa do Brasil, o Cruzeiro com um super time, inclusive treinado pelo Levir Culpi, era um dos favoritos para o título. Em Caxias do Sul, nós saímos perdendo por 2 a 0 e no segundo tempo viramos para 3 a 2, com dois gols meus. Para mim foi um dos mais marcantes, por ser no começo da carreira, quando eu estava começando a explodir para o futebol brasileiro. Mas com certeza, o que vai ficar marcado para a história da minha vida foi o jogo Atlético x Paraná, na Arena da Baixada, minha volta depois de tudo o que se passou, depois de todo sofrimento que vivi e com gol ainda, o “gol da vida” como foi apelidado. Esse foi o jogo que vai ficar marcado pelo resto da minha vida

Cristian ? E logo contra um time que lhe abriu caminho, não é?

Washington ? É verdade. Eu tenho um simpatia muito grande pelo Paraná. É um clube que eu gosto muito, que eu vesti a camisa com muito carinho e onde eu fui muito bem. Fui um dos artilheiros do Campeonato Paranaense, bati o recorde de ter sido o jogador que mais fez gols em um Campeonato Brasileiro na época, embora o Paraná não vivesse uma grande fase, nós fomos rebaixados para a série B. Mas é um clube que eu tenho um carinho enorme e acho até que foi gostoso o Paraná ter participado da minha festa. Para eles foi ruim porque perderam o jogo, mas para mim, eu fiquei muito feliz por jogar no Atlético, ter feito gol e ter jogado com o Paraná, não por o Paraná ter perdido o jogo, mas por ele ter participado da minha festa

Xavier ? Falando em Paraná, eu lembro de uma matéria que o Irapitan fez para o jornal que, apesar da sua estatura você não tinha um bom cabeceio e essa deficiência você não tem mais. Como era na época e como você superou?

Washington ? Era difícil mesmo e quase não fazia gol de cabeça. Quando eu era juvenil, eu tinha medo de cabecear, apesar da estatura, de ser maior que os outros, e só superei depois de muito treino. Por isso que eu digo que, dentro do futebol, você não é nada sem o treino. O treinamento é que te dá tudo, tudo o que você apresenta no jogo vem da base do treinamento. O cabeceio era, realmente, uma deficiência que eu tinha, mas os treinadores todos me pegavam no final do treino e me faziam cabecear, até que virou um ponto forte meu. Eu comparo o exemplo do Ayrton Senna, que, depois de perder uma corrida na chuva, começou a treinar exaustivamente na chuva até que se tornou um especialista. Isso foi o que, mais ou menos, aconteceu comigo com o cabeceio

Irapitan ? E o que te fazia ter medo do cabeceio, era o choque?

Washington ? Não sei direito. Quando eu jogava em Brasília não tinha muita jogada de bola área, então era um costume mesmo. Eu tinha medo de alguma coisa, encolhia a cabeça para cabecear, fechava o olho, não ia de encontro a ela. Mas com muito treino a gente vai pegando e, graças a Deus, hoje é um dos meus pontos fortes.

Gisele ? Como você despertou para o futebol e em Brasília, ainda, que não é um grande centro?

Washington ? Eu sempre tive vontade de jogar futebol, sempre tive o sonho de jogar futebol. Meu começo em Brasília foi numa época em que o futebol era bem precário lá, mais ainda do que é hoje, que tem o Gama e o Brasiliense. Naquela época ainda não se tinha nomes de destaque no futebol. A gente jogava nos clubes, jogava em times que disputavam o Campeonato Brasiliense. Eu fiz um teste no Brasília, fui muito bem no teste e fui chamado para disputar o Campeonato Brasiliense infantil. Ali eu já me destaquei, no segundo ano fui artilheiro e um treinador me viu e me levou para Caxias, quando eu tinha 14 para 15 anos. Na verdade fui para Caxias do Sul para jogar no Juventude. Um diretor ligou para minha mãe e ofereceu todas as condições de escola, moradia, concentração. Cheguei em Caxias do Sul para treinar no Juventude, eles gostaram de mim, mas, quando souberam que eu tinha família em Caxias do Sul, não me ofereceram mais o que tinham prometido para minha mãe. Aí, um tio meu, que é torcedor do Caxias fanático, me levou para o Caxias, fiz um teste lá, passei e eles me ofereceram todas aquelas condições. Então segui para o Caxias.

Irapitan ? Apesar de você ter citado e a gente já saber das dificuldades do futebol brasiliense, ele é ainda um celeiro de grandes jogadores. Qual é o diferencial, é o futebol de várzea?

Washington ? Brasília realmente é um celeiro de craques. Saíram muitos jogadores de lá, apesar de os clubes não darem muitas condições para os jogadores aparecerem, agora estão começando a dar com o Brasiliense e com o Gama. Mas temos muitos jogadores bons de lá, como Carlos Alberto Dias, Amoroso, Lúcio, Maurílio e Renaldo, entre. Acredito que se for explorado melhor, podem sair muitos outros craques de lá.

Cristian ? Como foi o vestibular de centroavantes no Internacional?. Tinham quatro ou cinco candidatos, entre eles o Alberto, que hoje está no Corinthians e o Robson, o Robgol.

Washington ? Fui contratado pelo Inter, na época com o Celso Roth, que tinha treinado também o Caxias. Eu tinha feito uma bela campanha com ele do Caxias e, quando ele foi treinar o Inter, me levou. Só que nesse meio tempo eu tive uma lesão muito grave: rompi os ligamentos do tornozelo. Isso foi em setembro e eu fiquei o final do ano todo me recuperando e só voltei a jogar em janeiro. Só que, na época, o Caxias não tinha nem fisioterapeuta e eu me recuperei assim: fiquei engessado 40 dias e, quando acabou o Gauchinho pelo Caxias, fui para Brasília passar férias e eu mesmo fiz minha recuperação. Ia para a musculação, ia para a piscina, fiz o que achava que tinha que fazer e, quando me reapresentei ao Caxias em janeiro, fui contratado para ser o centroavante do Inter. Então, você imagina: eu nem tinha jogado ainda, tinha me recuperado sozinho de uma lesão e fui jogar pelo Inter. E lá estavam mais três centroavantes, o Robgol, o Alberto e o Christian. E eu fui para ser o titular. Mas na época, eu morava em hotel ainda, quando acordava eu dava duas voltas no meu quarto pisando forte no chão para poder aquecer meu tornozelo, porque eu não agüentava de dor, daí quando parava de doer eu ia treinar. Era nessa condição que eu estava no Inter. Mesmo assim ainda foi aos trancos e barrancos, eu jogava, era titular e fazia alguns golzinhos, mas não estava numa forma boa. Até que, quando a gente ia jogar contra o Paraná, em 97, pela Copa do Brasil, no treino antes do jogo, fazendo treinamento de escanteio, quando subi de cabeça, caí em cima do pé do Marcelo e torci o tornozelo novamente. Aí sim eu fiz a recuperação que deveria ter feito anteriormente, com todo o trabalho de fisioterapia, comecei do zero. E ali perdi muito tempo, fiquei praticamente seis meses afastado e só voltei nas finais do Gauchão. Eles testaram o Alberto, testaram o Robson, mas foi aí que firmou-se o Christian, foi muito bem naquelas finais, estourou e começou uma grande fase do Inter. Daí, voltei para o Caxias.

Carlos Bório ? Como foi para você descobrir que tinha um problema grave no coração lá na Turquia, em um país totalmente estranho, você sozinho, sem família por perto?

Washington ? Foi realmente muito difícil para mim. Eu comecei a ter um sintoma, uma queimação no peito, tipo uma azia, e achava que tinha comido alguma coisa que tinha me feito mal. Treinei numa quinta-feira assim, na sexta também, joguei no sábado sentindo esse sintoma e continuei sentindo até terça-feira, quando procurei um médico, para você ver a sorte que eu tenho. Conversei com o médico, meio no inglês, que mal dava para entender e foi aí que ele marcou comigo para fazer uma avaliação, uma série de exames no dia seguinte. Fiz um teste na esteira e aí eles perceberam alteração nos batimentos do coração e falaram, por meio de um intérprete, que eu teria que fazer um cateterismo para saber qual era o problema. Perguntaram se eu queria fazer naquela hora ou deixar para o outro dia. Eu, que não sabia exatamente a extensão do problema, falei: “já estou no hospital, vamos fazer agora”. Em meia hora eu já estava na mesa de cirurgia. Os médicos não explicavam tudo para o intérprete, o interprete diminuía mais um pouco ao me contar e eu, em uma mesa de cirurgia, cercado de turcos e sem entender o que estava acontecendo. Para mim aquilo só não foi pior porque foi muito rápido, meio que de surpresa. Eles fizeram o cateterismo e constataram a obstrução da artéria aorta, que já estava 90% obstruída, no limite. Fui para a cirurgia e, enquanto o médico me furava, o intérprete fazia careta do meu lado. Constatada a obstrução da aorta, tive que fazer a angioplastia, a colocação de um stant, para desobstruir e fazer o sangue fluir normalmente. Então, para mim foi ruim demais. A primeira pergunta que eu fiz durante a operação foi: “doutor, eu vou voltar a jogar?” Ele desconversou, dizendo que era para a gente se preocupar primeiro com a minha vida, com minha recuperação e que depois a gente voltaria a conversar. Foi muito complicado, eu fiquei mais dois dias no hospital, me recuperando, com minha família do lado, mas foi difícil demais. Você passar por um problema desses, fazer uma cirurgia no coração em um país totalmente estranho, com outra língua, é uma coisa realmente fora do comum.

Xavier ? E você já havia tido uma frustração anterior que foi aquela ida para Portugal…

Washington ? Justamente, quando eu estava no Paraná e fui para Portugal, foi exatamente aquela contusão no tornozelo que eu tive no Caxias e não fiquei no Inter foi que me prejudicou lá. Na verdade eu já não tinha mais nada, tinha feito muitos gols no Caxias, era um dos artilheiros do Paranaense, mas quando eu cheguei no Sporting, ele fizeram uma série de exames e, numa radiografia viram que meu tornozelo estava baleado, sendo que eles me viram jogando. É engraçado isso, porque eles gostaram de mim quando me viram jogar, mas, depois, disseram que não tinha condições de jogar. Foi por isso que eu não fiquei em Portugal

Irapitan ? A sua carreira é marcada por séria lesão de tornozelo e duas fraturas dentro do Paraná Clube. Como é para um jogador de futebol esse período em que o atleta está tentando e só lesão, só lesão?

Washington ? É difícil, você tem que ter muita fé em Deus e tem que acreditar muito em si próprio para poder superar isso. Eu vim para o Paraná, estava em um momento muito bom e, em dois treinos, tive duas fraturas de fíbula, em uma delas tive que colocar três parafusos que tenho até hoje e fiquei quatro meses parado. Mas eu acho que nada vem à toa, tudo na vida vem porque tem que acontecer e você tem que superar. Eu tive essas duas cirurgias e, mesmo sem jogar no Paraná a Ponte Preta me contratou, comprou o meu passe e eu fiz uma bela campanha, sendo um dos artilheiros da Copa João Havelange, em 2000 e, um ano depois da minha segunda cirurgia fui convocado pela primeira vez para a seleção brasileira. Por isso que eu acho que nada vem à toa e digo que, se você tem um problema, enfrente-o e supere-o, que depois virá a recompensa

Irapitan ? Você, em algum momento, chegou a pensar em parar de jogar?

Washington ? Acho que esse foi meu ponto positivo. Nunca, em nenhum momento, cheguei a pensar que eu ia parar de jogar. Desde aquela primeira pergunta que eu fiz ao médico, que ele desconversou, mas na verdade ele achava que eu não iria jogar mais, eu vim para o Brasil, pois o Fenerbahçe não me pagava mais salário e não me dava condições de me recuperar, os médicos falavam que eu tinha alguma chance, mas não me davam nenhuma certeza. Mas eu botei na minha cabeça: “vou voltar a jogar futebol, seja o que for, custe o que custar”. Foi aí que veio toda a história: vim para o Atlético Paranaense, conheci o doutor Constantini, que no começo também ficou meio em dúvida mas daí ele me falou: “você tem uma chance”. E era isso que eu queria ouvir. Se eu tenho uma chance, vamos correr atrás dela. Foi aí que ele fez uma nova cirurgia em mim e me deu condições de eu voltar a jogar. E hoje, graças a Deus, estou jogando bola.

Irapitan ? E depois disso você teve algum contato com os médicos do Fenerbahçe?

Washington ? Nunca mais. Só tive contato com a direção do Fenerbahçe. Fui à Turquia duas vezes para conversar com eles, pedia para voltar a treinar, falava sobre os salários atrasados, mas eles só desconversaram.

Bório ? Hoje eles devem estar arrependidos, vendo você como artilheiro do Campeonato Brasileiro…

Washington ? Provavelmente até estejam, não sei qual é o pensamento deles por lá, mas que eles não souberam tratar, não só um jogador de futebol, mas um ser humano, não souberam.

Gisele ? Você parece bem apegado a sua filha. Na hora em que começou esse problema, você não chegou a pensar que pudesse acontecer algo ruim e que você não pudesse mais estar presente na vida dela para acompanhar o desenvolvimento?

Washington ? Eu tenho a minha filha como minha vida, ela é tudo para mim, mas a minha força de vontade para voltar era tão grande que me dava a certeza que nada ia acontecer. Claro que se eu fosse pensar nisso eu ficaria com o pé atrás. Eu podia pensar que não ia voltar a jogar, mas eu tinha minha família, ia acompanhar minha filha. Foi uma vontade tão grande de voltar, que eu pensei “ela vai crescer me vendo jogar e vai entrar em campo comigo”.

Xavier: Você é uma pessoa com muita paciência, com todas as contusões que você teve, na maioria se tem um prazo médio pra voltar, como você administra isso?

Washington: Essa é uma das virtudes que eu herdei do meu pai, que é baiano e tem muita tranqüilidade e paciência. Eu não sei bem se isso é virtude ou defeito, mas pra mim está sendo virtude até agora, sou muito paciente mesmo. Quando eu fiz a primeira cirurgia os médicos falaram que dali a seis meses iam ver se eu teria condições, depois veio a segunda cirurgia e esperei mais seis meses para ver se voltava. Mas eu tinha tanta certeza que voltaria e se era o tempo necessário para eu voltar, eu paro esse tempo, mas eu volto depois.

XavierE a contagem regressiva para voltar, como foi?

Washington – Foi sofrido, porque eu tinha condições de jogar e o médico me liberou, mas eu não tinha burocraticamente condições de jogar, porque a papelada não estava pronta. Aí sim eu fiquei impaciente, desesperado para jogar, não podia e não dependia mais de mim. Na semana do jogo contra o Paraná Clube foi que chegou a papelada me dando condições de jogar. Ouvi muitos comentários dizendo que eu e o Atlético estávamos enrolando para eu voltar a jogar porque eu não tinha condições por causa do problema do coração e não por condições burocráticas e que nem eu nem o Atlético queríamos assumir isso. Mas aí chegou a papelada me dando condições e eu fiquei naquela angustia. Depois do jogo contra o Paraná que foi no domingo, fiquei até quinta-feira tentando me recuperar da dor muscular. Eu não conseguia andar de tanta ansiedade que eu tinha de jogar, aqueles momentos de angustia de estrear. No dia anterior ao jogo eu não conseguia dormir, ficava pensando que ia voltar a jogar, que isso era tudo o que eu queria e esperava. E momentos antes da partida tive aquele homenagem dos médicos, eu chorei. Depois do jogo eu realmente relaxei, parece que a “ficha caiu”.

XavierE na hora do gol?

Washington – Putz! Na verdade eu nem sei o que eu pensei, até hoje eu não sei o que pensei.

XavierVocê lembra como foi o gol?

Washington – Lembro, acho que Deus colocou a bola na minha frente. Acho que foi o Jadson que bateu a falta, ele pegou mal na bola, ela veio baixa, passou por quatro zagueiros, ficou perfeita para mim e eu consegui fazer o gol. Para mim foi a mão de Deus que colocou a bola na minha frente. Eu só pude comemorar com o gesto que eu sonhei há muito tempo: chegar no centro do palco da minha profissão, onde eu lutei tanto para estar, nada mais justo que ir ao centro, que agradecer a Deus, aos deuses do futebol por terem me abençoado, por terem me dado a condição para eu fazer o gol. Acho que foi um momento indescritível.

Cristian Agora eu vou voltar um pouquinho no tempo, como foi pra você aqueles dois dias que você ficou no hospital depois da primeira operação?

“Eu fiz a cirurgia e dava risada e o pessoal perguntava como eu podia estar feliz se tinha acabado de fazer uma cirurgia do coração e eu dizia que estava bem, estava vivo e ia voltar a jogar, porque ia estar triste? Acho que esse foi o grande segredo da minha recuperação.”

Washington – Foi difícil! Imagina você no hospital na Turquia, depois de uma cirurgia do coração, você corria risco de vida. Depois da cirurgia foi resolvido o problema, mas antes da cirurgia eu tinha 90% da minha artéria entupida, só passava 10 % do meu sangue ali. E normalmente não dá sintoma nenhum, eu acho que por ser jogador de futebol, por causa do esforço que eu fazia nos treinamentos o sintoma vinha. Se fosse um ser humano “normal”, que não fizesse esforço físico, eu acho que entupia os 100%, dava um infarto e já era. E como eu fazia esforço, era como se Ele quisesse me avisar que estava com problema. Então realmente Deus está comigo, me abençoou, me deu essa força porque realmente foi muito difícil depois daquela cirurgia ficar dois dias se recuperando. Mas eu tenho uma coisa desde criança que é a minha alegria de viver. Eu fiz a cirurgia e dava risada e o pessoal perguntava como eu podia estar feliz se tinha acabado de fazer uma cirurgia do coração e eu dizia que estava bem, estava vivo e ia voltar a jogar, porque ia estar triste? Acho que esse foi o grande segredo da minha recuperação.

XavierA que você atribui esse investimento do Atlético em você?

“O Petraglia me tratou como um filho. Ele falou que ia investir nesse garoto, vou apostar nele. E aí o Petraglia chegou no Dr. Constantini e perguntou se dava para dar um jeito e o Dr. falou que ia dar uma recauchutada, que achava que dava.”

Washington – Primeiro eles me conheciam, porque o Caxias me ofereceu para o Atlético antes do Paraná e o Atlético na época estava construindo o estádio e não tinha verba suficiente para me contratar. Vim para o Paraná e eles começaram a me conhecer mais de perto e viram que eu tinha condições de jogar no Atlético. Mas o grande peso foi que o treinador do Atlético na época era o Vadão, com quem eu tinha trabalhado na Ponte Preta. Eu estava naquela indecisão se voltava a jogar ou não, naquela briga com o Fenerbahçe, estava visitando o Vadão aqui em Curitiba e ele falou para o Atlético que tinha um nome. O Vadão me indicou, eu conheci o Petraglia e o Dr. Constantini (que era o médico do coração). Eu não sei se foi pelo meu jeito ou se Deus iluminou a cabeça deles, mas eles gostaram de mim, me trataram como um filho, me pediram para fazer todos os exames e o Dr. Constantini foi tentar avaliar a minha atual condição. Ele disse que infelizmente não ia dar para eu voltar, que eu ia ter que fazer outra cirurgia para tentar recuperar essa condição de jogar. O Petraglia me tratou como um filho, não sei, mas ele falou que ia investir nesse garoto, vou apostar nele. E aí o Petraglia chegou no Dr. Constantini e perguntou se dava para dar um jeito e o Dr. falou que ia dar uma recauchutada, que achava que dava.

XavierVocê conseguiria explicar a diferença da cirurgia que você fez na Turquia para a que fez aqui?

Washington – Eles se preocuparam primeiro em salvar a minha vida. A diferença foi a seguinte: na primeira cirurgia eles me deram condições de ter uma vida normal, mas não de ser um atleta. E aqui em Curitiba o Dr. Constantini me deu condições de ter uma vida de atleta.

BórioPor causa da cirurgia você continua tomando medicamentos periodicamente? E tem problemas de doping quanto a isso?

Washington – Eu tenho que tomar medicamentos regularmente, sim, até para me ajudar a me dar condições normais de jogar. Quanto ao doping, os remédios estão liberados pela comissão de dopagem e eles estão todos relatados. Até porque esses remédios não me fazem correr mais, não me dão força, não me dão musculatura, nada, só me protegem.

Cristian Você falou que o Mario Celso Petraglia te tratou como um filho, mas você sabe, até pela sua primeira passagem, que ele é conhecido frio, calculista e como um grande negociador de jogadores. É esse o Petraglia que você conhece?

Washington – É até engraçado, às vezes algumas pessoas comentam isso aí. Mas pra mim é totalmente o contrário, eu não percebo nada disso. Eu agradeço muito ao Petraglia, ao Atlético porque eles me ajudaram muito, eles abriram as portas para eu me recuperar. Eles me ofereceram toda a estrutura do clube, a parte fisiologia, nutricional e médica. Fiquei três meses morando no CT, independente de saber se eu ia voltar a jogar ou não, só me recuperando. Eu tenho muito a agradecer ao Dr. Constantini, ao Petraglia e a toda equipe do Atlético.

Sell Você voltaria a jogar na Europa ou em outro lugar no exterior?

Washington – Voltaria a jogar na Europa se eu tiver a proposta. Principalmente depois do final do ano e, se for bom pra mim e para o Atlético, eu voltaria com certeza. Porque lá na Europa, além de ser financeiramente bom, você está vivendo em outro país com uma cultura muito boa, você está “aparecendo” em outro país. É muito bom jogar lá. Na Turquia eu já não sei. Isso tem que ver mais lá na frente e ser muito bem pensado.

GiseleVocê acha interessante o jogador ir jogar na Coréia, por exemplo, por dinheiro?

Washington – Eu acho que depende da situação do jogador. Tem jogador prefere pensar no seu futuro na seleção ou que tem muito tempo ainda para a seleção, mas que quer mostrar o seu valor, criar seu nome, sair na mídia.

XavierTem um tempo para ir? Ou uma idade?

Washington – Não tem tempo, isso depende de cada um, do pensamento de cada um. Às vezes tem uma proposta irrecusável e não é toda hora que aparece uma oportunidade. Mas se ele tem perspectiva de futuro na seleção e ele sabe que vai ter um grande momento futuramente eu acho que deve segurar um pouco. Só vai se tiver uma proposta muito boa e para um time que vai te dar condições de ser reconhecido aqui no Brasil e na seleção brasileira.

IrapitanE qual a diferença econômica e financeira de se jogar em um clube desconhecido num país de segundo escalão na Europa e de se jogar em um time de ponta aqui no Brasil?

Washington – Primeiro depende da situação do jogador no momento. Eu cito o Alex, por exemplo, que jogou no Coritiba e estava no Cruzeiro. Ele jogava em um time de ponta aqui no Brasil, foi campeão brasileiro, foi o melhor jogador do campeonato, era o melhor do país. Ele recebeu uma proposta considerável e tentadora, que pouquíssimos times iriam fazer essa proposta para ele como na Turquia e ele foi, não pensou duas vezes. Eu não sei qual foi o pensamento dele, de repente pensou que o seu ciclo na seleção acabou. E não acabou porque ele continuou indo para a seleção, foi convocado agora e cresceu muito financeiramente. Eu tenho certeza que ele não pensou em aparecer para o mundo, a proposta realmente foi muito boa para ele e ele deveria ter ido. Mas acho que um menino de vinte anos não deveria ir para Turquia pelo menos. Por exemplo, se o Robinho recebesse uma proposta de Turquia, acho que ele não tinha que ir, mesmo se fosse uma proposta milionária. Porque é um jogador que tem futuro, que sabe que vai ter uma vida longa na seleção e daqui a pouco vai para um time de ponta na Europa, vai ganhar mais e vai estar com o nome na história, é só questão de tempo.

IrapitanUm jogador desse nível do Robinho teria espaço aonde?

Washington – Eu acho que desse nível e dessa idade do Robinho se daria melhor na Espanha. Não posso dizer que ele não daria certo em outro campeonato, mas na Espanha eu vejo mais a cara dele, mais o estilo dele de jogar.

CristianVocê se formou em um clube que não tem fisioterapeuta e fez trabalhos de fisioterapia por conta própria. Quando você chegou ao Atlético você levou um susto com a estrutura, mesmo vindo da Europa?

Washington – Primeiro eu quero deixar claro que o Caxias hoje tem fisioterapeuta, na verdade, no ano seguinte a minha contusão já tinha. Não posso deixar o pessoal de Caxias bravo, pois, se Deus quiser, ainda serei o presidente do Caxias. Mas, respondendo sua pergunta, eu não me assustei porque eu já conhecia a estrutura do Atlético. Mas eu posso dizer, com o que eu conheço da estrutura do Fenerbahçe, do Paris Saint-German e do Sporting Lisboa, o Atlético não perde nada para eles, é o clube europeu no Brasil.

XavierVoltando para o Campeonato Brasileiro, o Atlético está vivendo um momento fantástico. E eu lembro, daquele Atlético de 2001, um momento determinante foi uma vitória em Campinas, sobre a Ponte, por 5 a 1, em que o Nem, que era capitão, reuniu todo mundo e falou que aquele time seria campeão brasileiro. E no time desse ano, quardadas todas as relações de cautela, os jogadores já estão sentindo que dá?

Washington – Primeiro eu quero falar desses 5 a 1, pois eu estava presente, só que do outro lado. Fui eu, inclusive que fiz o 1 da Ponte. O que mais me deixou com raiva, que eu lembro até hoje, foi o Gabiru, o Adriano que hoje está no Cruzeiro. Naquele jogo ele estava na reserva, daí ele entrou quando estava 4 a 1 e começou a fazer gracinha. Eu fiquei nervoso e falei: “eu vou te pegar”. O Nem, que era meu amigo, tentou me acalmar, mas eu estava louco para pegar o Gabiru, que continuava fazendo gracinha e me xingando, porque ele é atrevido, é baixinho, mas é atrevido. E ainda foi ele quem fez o quinto gol. E hoje ele é meu amigão, o que eu gosto daquele Gabiru não é brincadeira. Mas assim, a gente, os jogadores do Atlético, não sente que já ganhou, mas sente que pode ganhar. Eu não posso negar que, nesse momento, a gente já sonha com o título, mas a gente sabe, e o Levir nunca deixa de frisar, bem como eu e os jogadores mais experientes, o Fabiano, o Marinho e o Marcão, que não tem nada ganho, tem um campeonato inteiro ainda pela frente, daqui para frente é só decisão e temos que ir degrau por degrau. A gente sabe que tem condição de ser campeão, mas sabe que tem que ter os pés no chão. Só conseguiremos alcançar alguma coisa se tivermos humildade.

BórioO Atlético, com essa campanha vem ganhando a mídia nacional. Você acha que isso pode subir na cabeça de alguns jogadores, principalmente os mais jovens, como o Jádson e o Dagoberto?

Washington – O grande mérito do Levir, e até nosso, dos jogadores mais experientes, é o de conseguir conter essa euforia, botar na cabeça dos jogadores que não tem nada ganho ainda, mesmo a gente ganhando cada vez mais destaque na mídia. O que já deveria ter acontecido antes, mas como estamos fora do eixo Rio-São Paulo, só sendo líder mesmo.

XavierE mesmo assim ainda dizem que é nuvem passageira. Isso não magoa?

Washington – É mesmo, ainda tem isso, mas eu acho que é só para ganhar ibope. Mas acho até bom, deixe que eles falem isso da gente. Deixe que dêem o favoritismo para os outros. Se começarem a dar o favoritismo para a gente pode até acontecer de subir na cabeça de um o outro, mas assim, com eles dando o favoritismo para o outro, no final a gente vai lá e leva o título. A gente ouve muito essa história de já ganhou, mas para nós isso não existe. E garanto que o primeiro jogador que chegar com esse pensamento vai estar fora. Tenho certeza que o Levir tira ele e que os próprios jogadores vão lhe chamar a atenção. Clima de já ganhou para a gente não existe. Nós chegamos até aqui porque fomos humildes e porque fomos um time que lutou junto e se ajudou, não vai ser agora que vai ter clima de já ganhou.

XavierVocê já havia sido capitão antes?

Washington – Sim, fui capitão nos juniores do Caxias e na Ponte Preta também. Agora estou tendo a honra de ser o capitão do Atlético Paranaense, me sinto muito feliz com isso.

XavierComo que você é como capitão?

Washington – Eu não sou aquele típico líder, que fica gritando e cobrando o tempo inteiro. Nesse aspecto, inclusive, acho que o Fabiano é melhor do que eu. Ele é um jogador que fala mais, vibra mais. Mas pelo respeito que eu tenho do grupo, pela liderança que venho exercendo em outros aspectos e pelo currículo eu me tornei o capitão. Mas como o Fabiano é o que fala mais com o grupo, consegue criticar, apontar as falhas e motivar, a gente divide a responsabilidade e reveza a braçadeira.

IrapitanÉ diferente um capitão que vê o jogo lá da frente?

Washington – Quando você tem experiência, você consegue perceber melhor os detalhes, independente da posição. Tanto é que eu não sou o único: o Fernandão é capitão do Inter, o Christian é capitão do Grêmio, o Tuta do Coritiba, o Romário quando joga, o Edílson no Vitória, o Valdir e o Petkovit se revezam no Vasco. Claro que é diferente, mas a experiência compensa.

Gisele Você tem a intenção de quando parar de jogar ser treinador?

Washington – Eu ainda não decidi. Pode ser que daqui a uns três anos eu comece a amadurecer meu pensamento nesse sentido. Eu sei é que vou ser presidente do Caxias. Apesar de eu achar que não seria mau treinador, acredito que eu tenho mais jeito de empresário do que de treinador.

CristianNo Brasil, sem contar Ronaldo e Adriano, tem uma boa safra de centroavantes?

Washington – Tem, temos bons centroavantes no Brasil, é lógico que eles têm aquela cobrança mais de fazer o gol. É como diz o ditado: goleiro e centroavante não é posição, é profissão. E é verdade, pois são os dois que não podem falhar. No Brasil temos grandes centroavantes sim: tirando o Ronaldo e o Adriano, temos ainda o Luís Fabiano e o Nilmar que também foram para a Europa. Dos que ficaram, tem o Christan, o Tuta, o Guilherme, o Alex Dias, o Alex Mineiro, o Fred, entre tantos outros. O Brasil é um grande celeiro de jogadores. Ao mesmo tempo em que se exporta muitos atletas, já surgem outros novos para substituir.

XavierO que passa na tua cabeça naquela situação em que teu time perde por 1 a 0, passam uma bola para você em condições de fazer o gol e não faz, sobra uma segunda bola e você não faz?

Washington ? Eu não costumo pensar que não vai dar certo. Eu estou sempre acreditando e acho que esse é o grande segredo. Na época do Mário Sérgio, que eu saía todo jogo, eu costumava dizer: às vezes eu não posso decidir no primeiro minuto, mas quem sabe no último, tem que sempre estar tentando. Menos na época do Mário Sérgio, que eu tinha que tentar decidir antes porque no último minuto eu já não estava mais jogando.

XavierVocê não gosta de sair não é? Mesmo agora com o Levir, esses dias ele quis te poupar e você ficou bravo…

Washington ? É verdade, principalmente quando você sente que o jogo está bom pra você, que você tem chances de fazer mais gols. Eu estou sempre tentando, posso perder uns três ou quatro gols mas uma hora eu vou fazer.

Bório ? Teve uma época que passou para a imprensa que estava havendo uma disputa interna entre você e o Dagoberto. Teve esse momento no Campeonato?

Washington ? Não, isso não teve não. Foi no jogo contra o Fluminense, que eu achei que poderíamos ter feito muito mais gols se tivessem me procurado mais naquele jogo e eu reclamei. Mas não teve briga nenhuma, depois do jogo, que saiu matéria nos jornais sobre isso. Nós nos reunimos só os jogadores para conversar e mostramos que ninguém tinha problema com ninguém e que, inclusive, esse é um dos grupos mais unidos que já participei.

Irapitan ? Qual foi o grande gol que você fez e qual a sua grande pixotada?

Washington ? Rapaz, eu fiz um gol, que foi o mais lindo da minha vida, mas que não está gravado, quase ninguém viu e não tem nenhum registro. Foi em um campeonato colegial em Brasília, eu dei cinco “chapeuzinhos” antes de fazer o gol. Eu juro por tudo que há de mais sagrado, meus amigos de infância lembram. Mas ninguém viu, vamos lembrar de outros: contra o Atlético Mineiro, lá em Belo Horizonte, foi bonito, contra o Botafogo foi bonito, quando eu estava jogando na Ponte eu fiz um gol bonito contra o Palmeiras. Fiz alguns golzinhos bonitos sim, não foram muitos mais eu fiz. Pixotada tiveram várias, mas eu não gosto de lembrar não. Teve uma no Fenerbahçe que eu recebi a bola embaixo da trave, sem goleiro sem nada, e chutei por cima.

Gisele A perda do título estadual para o Coritiba, que imprensa e torcida já estavam naquele clima de já ganhou serve de exemplo para no Brasileiro vocês entrarem mais com os pés no chão?

Washington – Eu acho que serve de lição porque nós perdemos o título e agora temos a oportunidade de conquistar outro. Mas garanto que, se tem alguém isento nessa derrota são os jogadores, os jogadores não são os responsáveis pela perda desse título. O Atlético fez uma bela campanha foi o melhor durante todo o campeonato,

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