Pré-transplante de células hematopoiéticas para doenças neuro e imunológicas

Medicamentos que modificam o sistema imunológico são usados há quase 50 anos para o tratamento de doenças como artrite reumatóide, esclerose múltipla, lúpus, espondilite, dermatomiosite, e outras doenças raras, pouco conhecidas, diagnosticadas quando especialistas julgam que existe um componente inflamatório no mecanismo de produção da doença. O tratamento é feito com anti inflamatórios, cortisona, imunossupressores ou imunomoduladores, via oral ou por injeções, de maneira contínua ou nas chamadas pulsoterapias. Neste caso, uma dose alta de medicação é utilizada a cada mês ou a cada dois meses. Porém, uma parte dos casos mais graves não respondem. O transplante autólogo – da pessoa para ela mesma – de células-tronco hematopoiéticas (processo de substituição das células sanguíneas que ocorrem na medula óssea e o sistema linfóide) foi inicialmente utilizado em lúpus resistente aos outros tratamentos. A ciclofosfamida, uma medicação imunossupressora, já utilizada em doenças imunológicas, é a droga utilizada na fase inicial do transplante, antes da coleta das células-tronco. Entretanto, foram notados casos em que os pacientes apresentavam diminuição da atividade da doença nessa fase inicial, após a ciclofosfamida e antes da realização da quimioterapia maciça, que é realizada para eliminar a medula óssea, depois refeita com o implante de células-tronco.

O transplante é um tratamento imunossupressor radical, com alta morbidade e potencial mortalidade. Morbidade é permanecer no hospital com alto grau de sofrimento. Porém, mais de 50% dos sobreviventes atingem remissões prolongadas, em várias dessas doenças que não respondiam a nenhuma outra forma de tratamento. Devido aos resultados otimistas do uso da ciclofosfamida na fase de mobilização pré-transplante, o mesmo tratamento vem sendo utilizado no tratamento de doenças neuro-imunológicas, em Curitiba, no Johns Hopkins Hospital em Baltimore e a Stony Brook University no Estado de New York. Queda nos leucócitos e plaquetas, infecção, menopausa precoce, perda dos cabelos, flebite e cistite hemorrágica podem ocorrer. Não ocorreram óbitos ou complicações graves em pacientes com doenças neurológicas submetidos a esse tratamento. Nossa experiência curitibana inicial foi publicada em revistas internacionais (Acta Neurológica Scandinavica, março de 2005 e Multiple Sclerosis, dezembro de 2006).

A segurança do pré-transplante é grande. Com os devidos cuidados na seleção de pacientes, em bom ambiente de cuidado técnico-hospitalar ou ambulatorial, a mortalidade foi zero e a morbidade, o sofrimento durante o tratamento, foi baixa.

Os pacientes selecionados são hospitalizados ou seguidos ambulatorialmente por uma média de 15 dias, incluindo o preparo, o tratamento e a recuperação. Ao fim do tratamento o paciente está livre de efeitos colaterais, exceto pela queda de cabelos. Essa é uma das formas das chamadas imunossupressões de alta dose atualmente sendo utilizadas para doenças imunológicas. A medicina não sabe qual a contribuição da circulação de células-tronco hematopoiéticas ou da imunossupressão no efeito positivo para a evolução da doença em muitos desses pacientes.