Fraude à Execução

              Dentre os diversos meios de se garantir a execução, um dos mais interessantes e utilizados é o da fraude a execução, cujo reconhecimento implica no retorno do status quo ao do ato fraudulento para se garantir a satisfação do credor.

            Entretanto, para tanto, certos requisitos devem ser observados, pena de ofensa aos elementos caracterizados do Estado Democrático de Direito. Vejamos:

PROPOSIÇÃO: Para o reconhecimento da fraude à execução, necessária a constatação dos requisitos do art. 593, inc. II, do Código de Processo Civil, aliados a existência de registro de penhora sobre o bem alienado ou, na falta deste, prova da má-fé do terceiro adquirente.

JUSTIFICATIVA: Com base no art. 583, inc. II, do Código de Processo Civil e da Súmula 375 do Superior Tribunal de Justiça, esta Corte firmou entendimento, no julgamento do REsp nº 555.044/DF, da 4ª Turma, Relator Min. CESAR ASFOR ROCHA, in DJU 16/02/2004, no sentido de que é necessária a presença, concomitante,de três requisitos para o reconhecimento de fraude à execução a saber: i) que a ação já tenha sido aforada; ii) que o adquirente tenha conhecimento da existência da ação, ou por já constar no cartório imobiliário registro presunção juris et de jure contra o adquirente), ou porque o exequente, por outros meios, provou que dela o adquirente já tinha ciência; iii) que a alienação ou a oneração dos bens seja capaz de reduzir o devedor à insolvência.

(TJPR: Ap. Cív. 691.884-9; 698.642-9; 650.319-1; 638.807-2; 653678-7)

  

 

DECISÃO EM DESTAQUE

 

            Nestes termos, julgou o Tribunal de Justiça do Paraná, na Apelação Cível n.º 691.884-9, publicada em 12/01/2011:

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 691.884-9 – 22ª VARA CÍVEL DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA.

AGRAVANTE: J. C. A.

AGRAVADOS: ESPÓLIO DE M. C., ESPÓLIO DE E. C., M. C. S., R. A. e M. A.

INTERESSADA: M. H. L. A.

RELATOR: Des. MENDONÇA DE ANUNCIAÇÃO.

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO – LOCAÇÃO – EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – TRANSFERÊNCIA DE QUOTAS SOCIETÁRIAS A PARENTES DO EXECUTADO, NO CURSO DA EXECUÇÃO – FRAUDE À EXECUÇÃO DECLARADA NA ORIGEM – PRESENÇA DOS REQUISITOS PREVISTOS NO ART. 593, II, DO CPC, E NA SÚMULA 375 DO STJ – DECISÃO MANTIDA – RECURSO NÃO PROVIDO.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 691.884-9, da 22a Vara de Família do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, em que é agravante J. C. A., e agravados ESPÓLIO DE M. C., ESPÓLIO DE E. C., M. C. S., R. A. e M. A..

J. C. A. interpõe AGRAVO DE INSTRUMENTO contra a decisão proferida às fls. 203/206-TJ, nos autos de Execução de Título Extrajudicial nº 1008/2005, que, entendendo ter havido fraude à execução, declarou ineficaz a transferência das quotas da empresa Casa de Saúde e Maternidade.

Nossa Senhora Aparecida Ltda., pertencentes ao agravante, e determinou a expedição de mandado de penhora sobre elas.

Narra o agravante que é fiador da Sociedade Educacional Kennedy, no contrato de locação que embasa a Execução, cujo valor é de R$ 403.328,08.

Relata que se afastou da sociedade da Casa de Saúde e Maternidade Nossa Senhora Aparecida Ltda, transferindo suas cotas por não ter mais convergência de vontade com os demais integrantes dessa sociedade, levando os agravados a crer que estaria fraudando à execução, e ensejando o pedido de declaração de ineficácia dessa transferência.

Informa que tal pedido foi acolhido, com a determinação de penhora sobre as cotas e 30% dos rendimentos mensais obtidos pelo executado.

Salienta que a empresa da qual participava nunca deu lucro e que havia incompatibilidade de ideologia com os demais sócios, sendo que, diante disso, decidiu se retirar da sociedade, não tendo mais qualquer obrigação com ela.

Alude que, ao se retirar da sociedade, sua intenção era resguardar o seu patrimônio, que vem minguando por causa de uma sociedade que não lhe traz lucro algum, e a interpretação do Magistrado a quo fere seu direito constitucional de propriedade.

Pleiteia a imediata suspensão da decisão agravada ao argumento de que “não há como manter uma pessoa em sociedade contra a vontade dessa em nossa legislação, ainda mais quando um prejuízo maior possa lhe acarretar, face á administração sem a convergência de ideologias e que ainda acarrete prejuízos” (fls. 09).

O pedido liminar foi negado (fls. 238/240).

Os agravados apresentaram contraminuta, pugnando, em síntese, pelo não provimento do recurso (fls. 251/254).

V O T O.

Volta-se o recurso contra decisão proferida nos autos de Execução de Título Extrajudicial (contrato de locação), que declarou ineficaz a transferência de quotas societárias feitas pelo recorrente à Sra. A. C. A. L. e ao Sr. A. J. C. A., sob o entendimento de que fora realizada em fraude à execução.

Depreende-se do disposto no artigo 593, inciso II, do Código de Processo Civil, que para a caracterização da fraude à execução é necessário que a alienação ocorra após a existência de demanda pendente contra o devedor, e que seja capaz de reduzi-lo a insolvência.

Ainda, pela súmula nº 375 do Superior Tribunal de Justiça, “o reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente.” Na hipótese dos autos, embora já ajuizada demanda executiva (02/09/2005 – fls. 18 e 108-TJ), quando da transferência das quotas societárias (26/03/2010 – fls. 198-TJ) não havia sido efetuado o registro da penhora nos registros comerciais, sendo por isso indispensável a demonstração da má-fé do adquirente.

Nessa linha, observa-se que a aludida cessão fora realizada pelo recorrente em favor de seus parentes (consoante documentos de fls.198/201), o que faz presumir a existência de conluio entre alienante e adquirentes, com o objetivo de fraudar o processo executório.

Aliás, em momento algum o agravante negou esse parentesco próximo, o que lhe seria fácil, bastando exibir certidões de nascimento oude casamento dos beneficiários. E não o fez, certamente, porque esses documentos evidenciariam quem sabe, que os cessionários das quotas são seus filhos.

Além do mais, consoante o entendimento esposado pelo magistrado de primeiro grau a respeito do estado de insolvência do recorrente, “Verifica-se dos autos, ainda, que os executados não possuem bens livres e desembaraçados para garantir a execução, sendo que o último bem imóvel ofertado pelo executado e recusado pela parte credora, possui duas penhoras, as quais totalizam importância superior a R$ 1.500.000,00 (um milhão e meio de reais), consoante se vê na matrícula encartada às fls. 201” (fls. 203).

Em suma, estando devidamente preenchidos os requisitos necessários para a declaração da fraude à execução, era imprescindível que fosse determinada a ineficácia da transferência das quotas societárias sub judice.

Este o atual posicionamento deste Tribunal de Justiça:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE COBRANÇA EM FASE DE EXECUÇÃO. FRAUDE À EXECUÇÃO. REQUISITOS DO ARTIGO 593, II DO CPC E DA SÚMULA 375 DO STJ PREENCHIDOS. ADQUIRENTE QUE É PARENTE PRÓXIMO DO EXECUTADO. PRESUNÇÃO DE MÁ FÉ. 1.

Três são os requisitos para o reconhecimento da fraude à execução, nos termos do artigo 593, II, do Código de Processo Civil e da Súmula 375 do Superior Tribunal de Justiça: i) que a ação já tenha sido aforada; ii) que o adquirente tenha conhecimento da existência da ação; iii) que a alienação ou a oneração dos bens seja capaz de reduzir o devedor à insolvência. 2. Sendo o adquirente do imóvel primo do Executado, é de se presumir o conluio das partes.

3. O § 2º do artigo 1º da Lei nº 7.433/85 determina que deve ser apresentada, no ato da lavratura da escritura pública, a certidão dos distribuidores cíveis, o que demonstra que o adquirente tinha plena ciência da execução que tramitava. RECURSO PROVIDO (Agravo de Instrumento nº 698.642-9, Rel. Desª. Vilma Régia Ramos de Rezende, acórdão nº 17.508, Dje 12/11/2010).

Destarte, não comporta provimento o recurso.

Em face do exposto, ACORDAM os Desembargadores da Décima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, em NEGAR PROVIMENTO ao recurso, nos termos do presente voto.

Participaram do Julgamento os Desembargadores FERNANDO WOLFF BODZIAK, Presidente, e VILMA RÉGIA RAMOS DE REZENDE.

Curitiba, 15 de dezembro de 2010

Des. MENDONÇA DE ANUNCIAÇÃO Relator

 

Voltar ao topo