Encantador de bola

O seu rosto de menino, em plena luz, tem uma expressão honesta, simples, aberta (Eça de Queiroz). Nem a dor de um pontapé maldoso fragmenta o sorriso.

Dagoberto, do Atlético, está encantando o Brasil. Deixou de ser jogador, transformou-se em craque; fez do campo um palco, transformou-se em astro. De repente, bamboleando sorridente, com soberbo aprumo para jogar, virou pombo-correio da alegria (Guimarães Rosa).

É um artista plástico, que fantasticamente usa os pés, que, obedientes à sua inteligência, fazem um gol mais bonito do que o outro. Nada é ocasional, espaçado ou casuístico. O mais bonito sempre é em seguida daquele que já foi belo. Depois daquele gol na Arena, em que fez de todo o campo um pedaço, fazendo do drible o seu canto, parecia ter esgotado a beleza. Mas para esse menino, tudo é comum. E então veio o gol contra o México.

Dagoberto não é comum. Nada nele é artificial. Suas virtudes naturais compõem uma individualidade dos grandes craques. Não isola o talento da inteligência; são indissociáveis. Por isso tudo flui ao natural. E o que para o jogador comum pode ser uma jogada excepcional, para Dagoberto é diário. A rotina que provoca esse menino dentro de campo é diferente de nós mortais. Não cansa. É decorada pela beleza.

Joel Macedo Soares Pereira Neto, atleticano dos bons, amigo dos grandes, dá rumo a essas linhas: “É o novo Zico”, explode em exaltação ao craque atleticano.

Nesta época em que as comparações são inevitáveis, não podemos negar a Dagoberto uma identidade cheia de nobreza.

Bingo, querido Joel. Quando vem de trás exercendo fascínio sobre a bola, quando dribla o adversário em velocidade e quando procura uma alternativa fora da proposta comum para fazer o gol, Dagoberto parece ser Zico. Jogando assim, será Zico.

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Atílio Cômodo era “Tilico”, uma parte do Atlético.

Em 1972, foi formador de um dos maiores times da história do clube: Picasso;, Cláudio Deodato, Di, Alfredo Gottardi e Julio; Sergio Lopes, Valtinho e Sicupira; Buião, Ademir Rodrigues e Nilson Borges.

Nunca um time foi tão injustiçado como este Atlético de “Tilico”. Injustiçado como seus amigos, que de repente, o perderam.

Mas como sempre fez, “Tilico” reuniu outra vez seus amigos. Só que agora foi pela última vez.