Histórico de uma tragédia anunciada

A denúncia feita pelo Paraná Online revelando que mais de 100 cadáveres estão amontoados no necrotério do Instituto Médico-Legal de Curitiba em condições apavorantes, continua rendendo indignação e revolta, porém até agora nenhum atitude foi tomada para solucionar o problema.

No fim de semana mais um profissional de alto cargo, conhecedor das mazelas do IML da capital e estudioso da estrutura dos institutos de outras capitais brasileiras, concedeu um entrevista exclusiva, pedindo sigilo a respeito de sua identificação, descortinando os motivos que levaram um órgão tão importante da Secretaria de Segurança Pública a chegar nesta situação.

De acordo com o profissional, o erro já começou no planejamento do prédio que abriga o IML, na Avenida Visconde de Guarapuava, centro de Curitiba. “Os necrotérios jamais deveriam ter sido construídos nos andares de baixo, devido ao forte cheiro dos corpos que sobe para os demais pavimentos”, explicou.

Quando ao pessoal, os funcionários não recebem o devido respeito, mesmo trabalhando em regime de insalubridade, atendendo diariamente pessoas nos piores momentos de suas vidas; envolvendo-se diariamente em episódios de desgraça, violência, desespero e dor. Toda a equipe convive com a sujeira, o mau cheiro e as precárias condições de instalações velhas”, relata revoltado.

“Não gostamos de ver mortos, como muitos pensam. Somos pessoas cientes da importância desse serviço”, diz o informante, lembrando que a equipe,, mesmo sem o devido material técnico se esforça para fazer um bom trabalho.

Atualmente, os funcionários que trabalham na identificação dos corpos, ao tentar localizar algum em meio a pilhas deles, enfaixam braços e vestem sacos plásticos até os joelhos, para evitar contato direto com o líquido liberado pelos cadáveres em decomposição. Eles estão sujeitos a contrair doenças por causa da exposição às milhares bactérias.

Denúncias

Das inúmeras denúncias foram feitas contra o órgão, jamais alguma foi comprovada. Uma delas foi de que médicos legistas vendiam cadáveres para faculdades, outra que funcionários recebiam dinheiro de funerárias para indicar seus serviços aos familiares.

Segundo o estudioso, os governos anteriores nunca se importaram com a situação do IML a nível nacional. “Os mortos não dão votos”, diz. Este é o principal motivo do descaso.

O prédio do IML de Curitiba já apresentava problemas, mas na gestão do ex-governador Roberto Requião eles se agravaram, conforme conta o informante. Provavelmente, com a intenção de conter especulações por parte da mídia, a fim de impedir notícias sobre o alto índice de criminalidade do Estado, o atual senador Requião realizou, através do Governo do Estado, um processo de intervenção no órgão. Se havia outra intenção que não essa, até o momento é desconhecida.

Se o motivo da intervenção foi o de investigar possíveis corrupções dentro do IML, não caberia aos policiais militares que foram direcionados para atuação nas dependências, e sim dos órgãos judiciais competentes.

“A polícia poderia defender os atendentes das agressões sofridas por familiares, ao reconhecer os corpos. Muitos chegam ao IML alcoolizados, com comportamento de uso de drogas”, frisa o profissional.

Despreparo levou ao caos

Redação

Arquivo
Dra. Lubomira foi presa e passou por humilhaç&ot,ilde;es.

Entre 2007 e 2008 foram substituídas as equipes de trabalho do IML por profissionais que desconheciam o funcionamento do instituto. “Eles assumiram os cargos de forma intempestiva, enquanto quem estava lá anteriormente lutava por melhorias”, revela o estudioso em entrevista ao Paraná Online.

Os interventores permaneceram no local por dois anos e não conseguiram comprovar nada de irregular. As acusações não foram investigadas de forma eficiente, pois foram feitas por pessoas que desconheciam os procedimentos internos.

Soldados da Polícia Militar sem experiência realizavam os atendimentos, e, ao desconhecerem os devidos procedimentos de encaminhamento dos documentos e corpos sem identificação foram armazenando-os.

Esta ação resultou nos 120 corpos que permanecem desde esta época em geladeiras. O procedimento correto seria a solicitação à Justiça para o sepultamento dos cadáveres ou doação para universidades, em até um mês após a morte.

Neste caso, o IML arquiva uma declaração de óbito como comprovante. Os soldados armazenaram esses corpos na câmara de putrefeitos para que o mau cheiro fosse contido, não sabendo de sua correta utilização.

Injustiça

Durante a intervenção vários médicos foram perseguidos, muitos deles que trabalham no IML e são professores em faculdades de Medicina e Direito. Através de um convênio, autorizado legalmente, esses médicos levam órgãos de cadáveres para estudo dos alunos, bem como turmas visitam o museu do IML durante aulas.

“A medicina explica que este material não pode ser aproveitado para doação, pois cientificamente é comprovado que somente as córneas podem ser retiradas de um cadáver para serem transplantadas. Coração e pulmão, por exemplo, só podem ser reaproveitados em caso de morte cerebral, pois precisam de irrigação sanguínea para nutrir os tecidos”.

De forma injusta, a conceituada professora e médica legista Lubomira Verônica foi presa em julho de 2008 ao carregar fatias de coração humano conservado em formol para estudos em uma faculdade. Segundo o informante, a prisão aconteceu para “mostrar” efetividade das investigações. Lubomira foi libertada após 24 horas.

Missão “quase” impossível

Redação

Como legado, o atual diretor do IML, o médico Porcídio D”Otaviano de Castro Vilani, recebeu muitos problemas. Uma comissão de médicos legistas está apoiando-o para que juntos apresentem um projeto de reestruturação do IML à Secretaria de Segurança Pública. No entanto, medidas emergenciais devem ser tomadas como o saneamento de todas as instalações.

No fim da tarde de sexta, o penúltimo camburão que funciona no IML, ao buscar o corpo de Willian Henrique Santos Melo, 20 anos, estragou. O jovem morreu em um acidente de motocicleta, na Rua João Cheder.

O camburão foi guinchado por policiais militares do BPTran, e o corpo permaneceu no local até ser recolhido outro veículo, emprestado pelo IML de Londrina. Este é o único que funciona atualmente para atender a capital, e na noite de sexta apresentou problemas no motor. Segundo um funcionário do IML, o camburão só está “pegando no tranco”.

Para resolver o problema, outro será criado no Litoral do Paraná. Para que o IML conte com pelo menos um camburão funcionando, o que está sendo usado no Litoral do estado na Operação Verão será trazido para Curitiba.