Começa júri do caso Evandro

Começou ontem o julgamento de um dos casos de assassinato de maior repercussão no Estado nos últimos anos. No banco dos réus do Tribunal do Júri de Curitiba estão os pais-de-santo Osvaldo Marcineiro e Vicente de Paula Ferreira e o ajudante de terreiro Davi dos Santos Soares. Os três são acusados de participar do assassinato do garoto Evandro Ramos Caetano, em abril de 1992, durante um suposto ritual de magia negra, em Guaratuba, litoral do Paraná.

O interrogatório do réu Osvaldo Marcineiro foi o primeiro e o mais longo, com duração de três horas. Ele chegou algemado, já que teve sua liberdade condicional cassada desde julho do ano passado, quando foi preso acusado de estelionato. Entretanto, ele respondeu as perguntas com as mãos livres a pedido do advogado de defesa, Álvaro Borges Júnior. Em seguida, o réu Davi dos Santos Soares foi interrogado, defendido pelo mesmo advogado. O último interrogatório foi o de Vicente, defendido por Haroldo Cesar Nater. Os três negaram a participação na morte do garoto, muito embora, quando presos há 12 anos atrás, tenham confessado em detalhes o ritual que resultou na morte do menino.

Ritual

Osvaldo, considerado peça-chave no caso, contou que só assinou a confissão porque foi cruelmente torturado. Um dos torturadores apontado por ele é também uma das testemunhas de acusação, coronel Neves, que na época era capitão e chefiava o serviço reservado (P2) da corporação. A participação dele no julgamento não está confirmada devido a problemas de saúde.

Osvaldo também afirmou que Celina e Beatriz Abagge, acusadas de serem as mandantes do crime, acompanhavam seu trabalho como pai-de-santo, e que chegou fazer um despacho para melhorar a situação financeira da família Abagge. Entretanto, ele negou o sacrifício de uma criança durante o ritual. “Já participei de rituais onde sacrificam galinhas, mas no trabalho que fiz para os Abagge utilizei apenas grãos para fazer o descarrego. O sangue humano nunca pode ser derramado”, alegou Marcineiro.

Um dos relatos mais intrigantes do réu foi justamente a descrição dos rituais que envolvem o sacrifício de aves. Ele contou que as asas, os pés e o bico são decepados e que as vísceras e o sangue são usados no trabalho. Exatamente como a acusação alega que Evandro foi mutilado e morto.

Os pais do menino, Ademir Batista Caetano e Maria Ramos Caetano, junto com demais familiares, acompanharam o primeiro dia de julgamento. Nervosos, não quiseram dar entrevistas.

Corpo esquartejado em ritual de magia

De acordo com a acusação que consta no processo, Osvaldo foi morar em Guaratuba em janeiro de 1992, onde montou uma tenda de búzios no Mercado Municipal. Lá ele teria conhecido Celina e Beatriz Abagge, respectivamente esposa e filha do então prefeito Aldo Abagge. No mês seguinte ele passou atendê-las em casa, quando ganhou intimidade com a família.

Em abril de 1992, mãe e filha teriam encomendado uma trabalho “espiritual” para melhorar a situação financeira dos Abagge, já que a serralheria do prefeito enfrentava dificuldades. As mulheres teriam pago 7 milhões de cruzeiros (moeda da época) para Osvaldo e Vicente de Paula, que também é pai de santo. Para que o ritual de oferenda tivesse o resultado esperado era necessário que uma criança fosse sacrificada dentro da serralheira. O outro acusado, o auxiliar de contabilidade Airton Bardelli dos Santos, teria construído uma “casinha” para abrigar a oferenda, que seriam as partes do corpo de Evandro.

Ainda de acordo com a acusação, por volta das 9h do dia 6 de abril de 1992, Celina, Beatriz, Osvaldo e Vicente saíram em busca de uma criança, quando encontraram Evandro próximo a uma escola. Eles seqüestraram o menino, o amarraram e mantiveram amordaçado até a noite do dia seguinte. Evandro, na época com seis anos, foi então morto por asfixia mecânica e teve os pescoço cortado e as orelhas, mãos e dedos dos pés amputados. Com uma faca e uma pequena serra os acusados teriam aberto o toráx do garoto e retiraram seus órgãos e vísceras. Os resto do corpo foi enterrado em um matagal.

Sentença deve sair só na sexta-feira

A previsão é de que o julgamento dos três réus só ganhe desfecho na sexta-feira, já que deverão ser ouvidas 15 testemunhas, sendo cinco de acusação. As sessões terão início às 9h e deverão ser suspensas às 20h. Ontem, os acusados foram interrogados, separadamente, pelo Juiz Rogério Etezel e pelos promotores de Justiça Lúcia Inez Giacomitti Andrich (titular da 2.ª Vara) e Paulo Sérgio Markowicz de Lima (promotor designado, que atua no caso desde 1999). As testemunhas começarão a ser ouvidas hoje e os debates entre defensores e acusadores devem iniciar na quinta-feira.

Os promotores pedem a condenação dos réus sob a alegação de que existem provas da autoria, inclusive por confissões, e ausência de álibi. Entre as evidências materiais estão os laudos positivos dos exames odontológico e de DNA, que comprovam que o corpo encontrado é mesmo do garoto assassinado. Porém, os advogados de defesa, Álvaro Borges Júnior e Haroldo Cesar Nater, sustentam a tese de negativa de autoria e contestam os laudos. Eles afirmam que o material não foi colhido de forma oficial e que novos exames de DNA foram solicitados ao Ministério Público, mas até agora não foram feitos.

Acusados

Ainda serão julgados outros acusados de participação no crime: Celina e Beatriz Abagge, respectivamente filha e mulher do então prefeito de Guaratuba, Aldo Abagge; o comerciante Sérgio Cristofolini e o auxiliar de contabilidade Airton Bardelli dos Santos. Celina e Beatriz, apontadas como mandantes do crime, já haviam foram julgadas em abril de 1998 e absolvidas, mas o Ministério Público requereu e obteve a anulação do julgamento, que havia durado 34 dias. Elas, portando, serão submetidas a novo júri.

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