Reforma previdenciária

O ex-ministro da Previdência e deputado federal Roberto Brandt (PFL-MG), falando em um seminário sobre a reforma da Previdência, uma das metas prioritárias do futuro governo, disse acreditar que Lula terá condições de fazê-la. O ex-ministro considera as condições políticas do governo Lula, que acredita terá amplo respaldo popular e suficiente cobertura política para realizar a reforma que Fernando Henrique tentou, mas não conseguiu. Não conseguiu, diga-se de passagem, em grande parte em razão da oposição do próprio PT e da argumentação de que as mudanças propostas retiravam direitos dos trabalhadores, tanto do serviço público quanto da iniciativa privada.

O deputado Brandt acha que, no governo petista, tanto sua base parlamentar quanto a oposição poderão trabalhar pela reforma, pois não há intenção de se fazer uma oposição férrea contra a nova administração. Oposição que o PT fez, sem tréguas, ao governo FHC. A análise parece correta, mas deixa de considerar que o desgaste de uma proposição de reforma previdenciária já começará quando, discutido ou já elaborado seu texto, comecem a ser revelados os prejuízos que terão estes ou aqueles segmentos da clientela.

A reforma tem como objetivo principal reduzir o déficit do sistema. Esse déficit sangra o Tesouro, inibe os aumentos do salário mínimo e mantém aposentadorias e pensões dos trabalhadores, principalmente dos da iniciativa privada, em níveis mínimos e insatisfatórios. Brandt, como o governo FHC ao qual pertenceu, é favorável à contribuição dos aposentados para reduzir o buraco na Previdência. Aí, já começam a aparecer os segmentos contrariados. Ele também sugere que os funcionários públicos tenham a conjugação de dois sistemas. O sistema atual e o da nova lei previdenciária para os anos que ainda faltarem para a aposentadoria. Aos já aposentados, quer a garantia dos direitos adquiridos, cláusula pétrea da Constituição.

O projeto do PT fala em um sistema único para funcionários públicos e trabalhadores da iniciativa privada. Estabelece um limite máximo de 10 salários mínimos, o que daria hoje R$ 2.000,00, contrariando grande parte do funcionalismo, pois sua cúpula ganha muito mais do que isso. Mais um largo e poderoso grupo a somar-se aos do contra. Na hora em que se falar novamente em contribuição dos aposentados e num teto que reduz as perspectivas de ganhos na inatividade de milhares de brasileiros, inclusive magistrados, membros do Ministério Público, funcionários do próprio Congresso Nacional e outros poderosos segmentos da sociedade, o time dos contra, por razões fáticas, poderá anular as vantagens políticas que o governo Lula terá, como vaticina o deputado Brandt.

Se a reforma da Previdência fosse o único objetivo do novo governo a expô-lo a desgastes, ainda seria possível considerar as boas condições políticas que o deputado e ex-ministro pefelista lhe atribui para produzir tão necessária mudança. Acontece que outros problemas importantes, como o desemprego, a fixação do novo salário mínimo e o cumprimento de amplas promessas do PT, que vêm de muito antes da última campanha presidencial, serão nós difíceis de desatar. E cada um deles somará à fila dos desconfiados e descontentes mais gente para neutralizar, se não anular, a vantagem política do novo governo. A verdade é que, em razão do amplo apoio popular, Lula será um presidente poderoso. Mas não onipotente.

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