Juízes denunciam desembargador

José Janene, José Borba, Roberto Bertholdo, Ricardo Sabóia Khury, Ginap, Tony Garcia, Michel Saliba, Sérgio Costa Filho, José Roberto Morel e Roberto Fade. Estes nomes estão citados na reportagem publicada no último domingo pelo jornal O Estado de S. Paulo, de autoria do jornalista Lourival Sant’Anna, relatando a denúncia de sete juízes federais que atuam em Curitiba e Paranaguá, em depoimentos sigilosos à Procuradoria da República contra um desembargador federal, Dirceu de Almeida Soares, da 4.ª Região, com sede em Porto Alegre e jurisdição nos três estados do Sul.

A matéria conta casos de ingerência do desembargador em ações que tramitam em instâncias iniciais da Justiça Federal do Paraná, intercedendo por advogados e seus clientes e pressionando juízes "a lhes conceder sentenças favoráveis". Os termos de declaração foram tomados pela Procuradoria da República em Curitiba, em setembro do ano passado. Os sete juízes, um de Paranaguá e os outros seis de Curitiba, apontaram interferências estranhas do desembargador em favor de advogados de réus em processos principalmente de crimes contra o sistema financeiro.

O processo sobre suspeita de venda de sentenças contra o desembargador Dirceu de Almeida Soares corre em sigilo de justiça no Superior Tribunal de Justiça. Dois anos atrás, em abril de 2003, o mesmo STJ afastou um de seus membros, o ministro Vicente Leal, sob a acusação de vender sentenças. Foi o então ministro Vicente Leal quem concedeu um habeas corpus em favor de Tony Garcia, mantendo paralisado o processo do Consórcio Garibaldi, que ainda tramita na 2.ª Vara Criminal Federal de Curitiba. O advogado Roberto Bertholdo, que agora é citado nas denúncias dos juízes, era o advogado de Tony Garcia naquela ação.

Segundo a reportagem do Estadão, o processo envolve pelo menos quatro advogados identificados, "entre eles Roberto Bertholdo, ex-conselheiro de Itaipu, que tem como clientes os deputados José Janene, líder do PP na Câmara, e José Borba, líder do PMDB, ambos do Paraná".

Os juízes federais que depuseram contra o desembargador Almeida Soares aos procuradores da República são: Ana Beatriz Palumbo, de Paranaguá (pedido de liberação de pneus importados, apreendidos pela Receita); Nivaldo Brunoni, da 3.ª Vara Criminal de Curitiba (pedido de liminar em favor da filha do próprio desembargador Soares); Ana Carine Busato Daros, da Vara Previdenciária (pedido para atender advogados da Ginap, importadora de pneus, em liminar para redução de impostos); Ricardo Rachid de Oliveira, da 2.ª Vara Cível (pedido de tutela antecipada em favor de um servidor exonerado); Vera Lúcia Feil Ponciano, da 8.ª Vara Cível (pedido em favor de Ricardo Sabóia Khury, filho do falecido deputado Anibal Khury, através do advogado Roberto Bertholdo); Sérgio Moro, da 2.ª Vara Criminal (pedido do desembargador para a concessão de liminar contra a quebra de sigilo bancário e fiscal de Ricardo Khury, representado pelo advogado Bertholdo); e, Marcelo Malucelli, da 2.ª Vara de Execuções Fiscais (pedido para beneficiar Tony Garcia, então candidato ao Senado, através dos advogados Bertholdo e Sérgio Costa Filho).

Os sete juízes federais disseram em seus termos de declaração à Procuradoria da República em Curitiba que não cederam "às supostas pressões do desembargador", segundo a reportagem do Estadão.

"Pedidos são normais"

O repórter Lourival Sant’Anna ouviu o desembargador federal Dirceu de Almeida Soares sobre as acusações feitas contra ele pelos sete juízes federais que atuam no Paraná. "Pedidos de preferência são normais entre juízes", disse Soares. "Nós, desembargadores, recebemos muitos pedidos e de vez em quando telefonamos, quando vemos que a coisa é difícil, tem que ser resolvida, pelo bem da própria Justiça." Ao se referir aos advogados citados nas denúncias, o desembargador confirmou os vínculos de amizade. "Todos são meus amigos. Quem me pede isso só pode ser meu amigo."

Almeida Soares considerou normal o seu pedido aos juízes para que informassem aos advogados da sua interferência nos processos. "É para defender o próprio juiz. Para não ir lá e começar a dar de dedo no juiz e dizer que tem que fazer isso, tem que fazer aquilo. Se o juiz falar: ?O dr. Dirceu telefonou para mim’, a pessoa só vai pedir o que pediu para mim, não vai aumentar."

O desembargador federal atribuiu as queixas dos juízes a uma "armação? contra ele. Admitiu que há uma disputa política feroz no Tribunal de Porto Alegre e apontou como seu principal rival o desembargador Vladimir Passos de Freitas, até recentemente presidente do TRF da 4.ª Região. Segundo a reportagem do Estadão, "Freitas tinha expectativa de se tornar ministro do STJ, no ano passado. Não foi apoiado pelos deputados paranaenses, liderados por José Janene, do PP, e José Borba, do PMDB, ambos clientes de Roberto Bertholdo, um dos advogados citados pelos juízes?.

Almeida Soares queixou-se da forma como foi conduzido o processo contra ele. "Não tive direito a ampla defesa. Não pude acompanhar os depoimentos dos juízes." Mas informou ao repórter do jornal paulista que dos 27 desembargadores da 4.ª Região, 23 já votaram pelo arquivamento da denúncia. E que "dois dos sete juízes já teriam se oferecido para se retratar". Soares terminou lembrando que "se tivesse cometido algum ilícito, já estaria prescrito", pois para casos administrativos, o prazo é de dois anos.

Bertholdo não é mais foragido

A reportagem de domingo último de O Estado de S. Paulo contou que o advogado Roberto Bertholdo deixou de ser foragido da Justiça graças a um habeas corpus obtido no começo do mês. Ele teve prisão preventiva decretada em virtude do espancamento de seu sócio no escritório de advocacia em Curitiba, Sérgio da Costa Filho. Ambos atuaram em diversos processos movidos contra Tony Garcia, até um desentendimento entre ambos e que resultou numa cena da mais baixa crônica policial.

Costa Filho acusou Bertholdo de tortura e apropriação de 900 mil reais. Segundo relato de Lourival Sant’Anna, "o episódio ocorreu depois da prisão, em novembro, de um cliente do escritório, o empresário Antônio Celso Garcia, um ex-deputado estadual acusado de gestão temerária do Consórcio Garibaldi, falido em 98. Tony Garcia, como é conhecido, foi candidato a senador pelo PP, tendo Bertholdo como primeiro suplente. O telefone de Garcia foi grampeado pela polícia. A gravação de conversas supostamente comprometedoras entre Garcia e Bertholdo teria levado Costa a querer desfazer a sociedade. Bertholdo e Costa acusam um ao outro de ter instalado aparelhos de escuta e câmeras ocultas do escritório. A disputa resultou no espancamento de Costa. Em depoimento à polícia, ele acusou o sócio de tê-lo algemado, aplicado choques, ameaçado de enforcar e espancado, durante 14 horas, com a ajuda do segurança, do motorista e de dois homens que se diziam policiais civis. Costa gravou um vídeo de si mesmo, dois dias depois da surra, e mantém-se escondido, com medo".

"Bertholdo, que tem escritório em Brasília, onde atende políticos como os líderes do PP na Câmara, José Janene, e do PMDB, José Borba, teve prisão decretada em março por Sérgio Moro, um dos juízes que denunciam o tráfico de influência do desembargador, num caso em que o advogado atuava. "Ele é um fascista que se considera o chicote de Deus", diz Bertholdo sobre Moro. O advogado, que admite ter batido no sócio, porque lhe roubou dinheiro e grampeou o escritório, diz que ninguém foi prendê-lo em Brasília. Em junho, obteve habeas corpus. Pouco antes da ordem de prisão, Bertholdo deixou o Conselho da Itaipu, para o qual fora indicado pelo PMDB."

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