Maus tratos aos animais são considerados crime

Não são apenas os seres humanos que devem ter seus direitos assegurados. Os animais, sejam eles domésticos ou selvagens, também devem ser respeitados, tratados com dignidade e carinho. Como as pessoas, eles têm direitos assegurados por lei e que não podem deixar de ser considerados.

O artigo 164 do Código Penal, por exemplo, diz que é crime a ?introdução ou abandono de animais em propriedade alheia, sem consentimento de quem de direito, desde que o fato resulte prejuízo??. O autor do abandono, quando denunciado, fica sujeito de quinze dias a seis meses de prisão ou multa.

A Constituição Federal, no capítulo VII do artigo 225, garante a proteção da fauna e flora ?às práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade??.

Já a legislação, no Decreto Lei número 24.645, de julho de 1934, condena o ?abuso e a crueldade contra qualquer animal??. São considerados maus-tratos: manter animais em locais anti-higiênicos; obrigá-los a trabalhos excessivos ou superiores a suas forças; golpear, ferir ou mutilar voluntariamente; deixá-los sem água ou alimento por mais de doze horas; abater para o consumo ou fazer trabalhar os animais em período de gestação avançada, entre outras práticas.

Infelizmente, para prejuízo dos animais e também dos seres humanos que convivem com eles, estas leis não são cumpridas da forma que deveriam e ainda são pouco conhecidas da maioria da população. Nas grandes e pequenas cidades, são inúmeras as atrocidades cometidas contra cães, gatos, cavalos e outros animais. ?Diariamente nos deparamos com casos de estupro de cadelas, espancamentos realizados por puro vandalismo, mutilações e muita maldade do homem contra os animais??, revela a presidente da organização não-governamental SOS Bicho, Rosana Vicente Gnipper.

Abandono

A violência mais visível cometida nos meios urbanos é o abandono. Só em Curitiba, segundo a SOS Bicho, existem cerca de 92 mil cães nas ruas. Destes, 50% são tidos como abandonados pelos donos e 50% têm donos mas vivem nas ruas, muitas vezes voltando para casa apenas para dormir. O número de gatos e outros animais abandonados não é conhecido, mas a organização acredita que também seja bastante alto.

?Muita gente adquire um animalzinho quando ele ainda é pequeno. Quando o bicho começa a crescer, deixa de brincar, começa a dar trabalho e gerar despesas, é abandonado. Isto faz com que o animal sofra muito??, comenta Rosana. A incidência de abandono é muito grande e contribui para que cada vez um número maior de animais viva nas ruas, inclusive ameaçando o bem-estar do próprio ser humano.

Um problema também bastante preocupante, principalmente neste período de férias, são animais abandonados dentro de suas próprias casas. Muitos donos viajam por longo período de tempo e deixam seus animais de estimação sozinhos, acorrentados, sem abrigo contra o sol e a chuva, sem água e sem comida. ?Os donos largam os bichinhos sem ninguém para tomar conta. Muitos chegam a morrer de desidratação e desnutrição”.

O mesmo acontece com cães de guarda pertencentes a empresas de locação pouco responsáveis. Muitos animais são colocados em terrenos baldios, casas e indústrias desabitadas sem as mínimas condições de sobrevivência. É comum que os responsáveis pela locação passem diversos dias sem visitar os animais, que também ficam sem se alimentar, acabam estressados e não são socorridos quando se ferem.

?As empresas de locação de cães de guarda são autorizadas a funcionar, mas não há nada que normatize este funcionamento. Isto faz com que os animais sejam grandes vítimas de pessoas que querem ganhar dinheiro sem se preocupar com seus direitos?, revela a representante da SOS Bicho.

Livro esclarece relação entre o dono e o animal

O desconhecimento da população em geral sobre os direitos dos animais fez com que a advogada Daniele Tetü Rodrigues, de Curitiba, escrevesse um livro sobre o assunto. Em outubro do ano passado, pela editora Juruá, ela lançou O Direito & os Animais -Uma Abordagem Ética, Filosófica e Normativa.

?As pessoas sabem que são cometidas brutalidades contra os animais, mas geralmente isto fica bastante longe da realidade delas??, afirma Daniele. ?Acredito que os animais não estão uma categoria abaixo dos homens. São seres que sentem dor e frio, que devem viver lado a lado com o ser humano e que não podem ser tratados como coisa.”

No primeiro capítulo de sua obra, Daniele tenta derrubar a idéia do homem como ser superior aos animais. No segundo, faz uma abordagem específica na área de Direito, mostrando o histórico das principais leis protecionistas à fauna brasileira. No terceiro e último capítulo, fala da propriedade privada dos homens sobre os animais.

O livro, que tem 162 páginas, está à venda por R$ 25,00. Pode ser encontrado nas livrarias Curitiba e Saraiva ou na própria editora.

Vítimas da ganância do homem

Assim como os animais domésticos, os silvestres, também chamados de selvagens, são grandes vítimas da ganância dos homens e da ação deles sobre a natureza. O comércio ilegal é hoje a principal ameaça a muitas espécies consideradas em extinção, como o papagaio-da-cara-roxa, o sagüi, tartarugas marinhas, iguanas, macacos, entre outras.

No município de Tijucas do Sul, o Centro de Triagem de Animais Selvagens (Cetas) recebe, através de uma parceria com o Ibama, a PUCPR e a Polícia Florestal, animais que as pessoas criam ilegalmente em casa, doados ou apreendidos nas mãos de comerciantes ilegais. Muitas vezes, eles chegam em péssimas condições de saúde.

?Quando os animais chegam, passam por exame e vão para tratamento. Depois de recuperados, ou são soltos ou vão para zoológicos e criadores??, informa a veterinária residente do local, Camile Lugarini. ?A soltura ou não do animal depende de sua procedência, de seu estado de saúde e de áreas que possam comportá-lo??.

Camile conta que geralmente os animais selvagens são retirados da natureza ainda filhotes. De acordo com uma estatística da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS), de cada dez animais retirados de seu habitat apenas um consegue sobreviver. ?Geralmente, os animais selvagens retirados da natureza são vendidos irregularmente em beiras de estradas. As pessoas os adquirem e, quando eles começam a crescer, os soltam em locais errados. Isso gera grandes problemas ambientais e compromete a saúde do animal??, afirma a veterinária. ?Orientamos as pessoas a não adquirirem animais selvagens e denunciarem pessoas que os criem de maneira inadequada??.

Os animais que conseguem sobreviver e permanecem com as pessoas que os adquiriram, geralmente também não vivem em boas condições. Por desinformação, muitos dos compradores os alimentam de forma inadequada, os mantêm enclausurados, sem companhia de outros da mesma espécie e não conhecem as reais características dos animais.

Os animais apreendidos pelos comerciantes ilegais são levados para outros estado da federação e até para outros países, onde adquirem valor financeiro bastante alto.

Segundo o Departamento de Polícia Federal, a cada ano 12 milhões de animais, a maioria integrante da lista de espécies em extinção, são apanhados na fauna brasileira. Deste total, 3,6 milhões são levados ao exterior. O tráfico internacional de animais movimenta US$ 10 bilhões por ano em todo o mundo. Só o Brasil é responsável por US$ 1,5 bilhão, o equivalente a 15%.

Algumas espécies estão em extinção

No Paraná, as atenções estão voltadas ao papagaio-de-cara-roxa (Amazona brasilienses), espécie de animal selvagem considerada em extinção desde a década de oitenta. A ave, de penagem colorida, é endêmica da região litorânea.

Segundo a coordenadora do projeto de conservação do papagaio-de-cara-roxa da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS), Elenise Angelotti Sipinski, atualmente existem 4.500 papagaios, sendo 3.500 no litoral do Paraná e o restante no litoral sul de São Paulo e litoral norte de Santa Catarina.

?Os pescadores paranaenses contam que, há cerca de quarenta anos, o céu ficava verde de tantos papagaios-de-cara-roxa que sobrevoavam a região. Atualmente, é muito raro ver o animal??, conta Elenise.

A principal ameaça à espécie são as mudanças ambientais. A degradação da Floresta Atlântica faz com que haja escassez de alimentos ao papagaio e que diminua o número de árvores disponíveis para a construção de ninhos e a busca de abrigos. Outro problema é o comércio ilegal. A beleza do papagaio-de-cara-roxa faz com que ele seja um grande atrativo aos comerciantes de beira de estrada e que atuam em mercados públicos. ?É muito difícil saber quem são esses comerciantes ilegais. Eles retiram os papagaios ainda filhotes dos ninhos e os vendem a turistas, que muitas vezes compram sem saber das conseqüências ambientais que isso gera??, comenta.

Além de ser levado a outras regiões do País, o papagaio-de-cara-roxa também é enviado pelos traficantes de animais aos Estados Unidos e a países da Europa. ?É muito difícil o papagaio conseguir sobreviver fora de seu habitat natural. A compra do animal incentiva o comércio ilegal e ninguém deve efetuá-la??, finaliza Elenise.

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