Estatuto da Criança e do Adolescente pela metade

Crianças e adolescentes que trabalham, sofrem abuso sexual, não conseguem vagas em creches e escolas, não têm atendimento digno em um posto de saúde, tampouco quando estão internados em uma carceragem. Estas são apenas algumas das violações dos direitos da criança e do adolescente, comuns na sociedade. Paralelo a esses problemas, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completa 17 anos hoje e, mesmo prestes a completar a ?maioridade?, continua sendo descumprido, apesar de seu primeiro artigo já estipular: ?Esta lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente?.  

Embora os especialistas apontem que se deve comemorar o simples fato de existirem leis que deliberam sobre essa faixa etária, ainda há muito o que se fazer para combater as violações. A Constituição Federal também determina que a família, a sociedade e o Estado (poder público) têm o dever de assegurar os direitos fundamentais da criança e do adolescente. O ECA prevê que essa faixa etária deve ter proteção integral, além de direitos e deveres. Porém, essa proteção é que está deficiente nos dias de hoje, segundo os conselheiros tutelares, que são o primeiro contato da família da criança e do adolescente que tiveram seus direitos violados.

Para Jussara Gouveia, presidente da Associação dos Conselhos Tutelares de Curitiba e representante do Fórum Colegiado Nacional dos Conselhos Tutelares, o ECA ainda não conseguiu mecanismos para tirar crianças das ruas, extinguir o trabalho infantil ou garantir o acesso à educação. ?A maior demanda nos conselhos tutelares é na área de educação, como a falta de vagas em creches, e o principal violador dos direitos é o Estado?, afirma. Dados dos conselhos tutelares apontam que desde janeiro deste ano já foram atendidos quase 5 mil casos de violações dos direitos de crianças e adolescentes em Curitiba – 58% relativos à educação infantil. ?O maior problema é a falta de políticas públicas?, critica Jussara.

A conselheira tutelar da Matriz, em Curitiba, Maria Rosa Mello, diz que a maior dificuldade em se aplicar a lei é a falta ou a precariedade de alguns programas destinados a crianças e adolescentes. Para ela, na medida em que a sociedade e o Estado violam os direitos e, muitas vezes, ignoram a presença de uma criança pedindo na janela de seu carro, por exemplo, aumenta a necessidade de uma ação conjunta para melhorar a situação. ?A maior violação é cometida por todos nós?, diz.

A secretária de Estado da Criança e da Juventude, Thelma Alves de Oliveira, vê o ECA como algo ?idealizado?. ?Mas temos muito o que caminhar ainda, e o ECA é uma boa carta de orientação?, pondera.

Sociedade está denunciando mais

Embora as deliberações do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) fiquem só no papel, o simples fato de haver diversos mecanismos que visam garantir os direitos e deveres das pessoas com até 18 anos de idade, além da sociedade estar denunciando mais, são grandes motivos de comemoração na quase ?maioridade? do ECA, segundo os especialistas.

A advogada Marta Tonin, conselheira do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e da Ordem dos Advogados do Brasil no Paraná (OAB-PR), diz que nunca se formaram tantos conselhos e organizações que visam garantir os direitos, deveres e políticas públicas para a área. Ela defende maior atenção à família, que muitas vezes é a principal agravante dos problemas da criança e do adolescente.

O presidente da Associação de Moradores do Centro Industrial Mauá (Vila Zumbi), José Osmair Posseban, confirma: a família desestruturada é uma das grandes responsáveis pelas violações. ?Claro que temos muitas violações dos direitos na vila, como falta de creches, crianças que trabalham catando papel com os pais e, junto a tudo isso, a falta de ações governamentais. Mas o que falta mesmo é geração de renda para que essas famílias tenham mais chances?, afirma.

Para a secretária de Estado da Criança e da Juventude, Thelma Alves de Oliveira, a leitura da sociedade dos problemas das crianças e dos adolescentes melhorou muito nesses 17 anos. ?Hoje se denuncia mais, os problemas não estão velados como era antes. Mas o que me preocupa é o olhar amedrontado das pessoas diante da juventude, que parece que virou uma ameaça?, comenta.

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