Gravado

Áudio com ex-secretário complica Richa

Foto: Pedro Serápio/Arquivo/Gazeta do Povo

Um dos homens fortes da política paranaense nos últimos sete anos, Deonilson Roldo foi gravado em uma conversa, em fevereiro de 2014, na qual afirma que havia um “compromisso” para que a Odebrecht vencesse a licitação da PR-323, rodovia no Noroeste do estado. A gravação, a qual a Gazeta do Povo teve acesso, foi divulgada pela revista IstoÉ na quinta-feira (10).

Em nota, o Ministério Público Federal informa que “foi enviada ao órgão uma cópia do referido áudio. Foi solicitada a entrega do áudio original formalmente para que fosse realizada uma perícia, o que não ocorreu até o momento”.

No áudio, o ex-chefe de gabinete e ex-secretário de Comunicação do governo Beto Richa (PSDB) pede um “entendimento” a Pedro Rache, diretor-executivo da Contern, outra empreiteira interessada na obra. Em troca, oferece uma composição em possíveis negócios da Copel que envolviam o Grupo Bertin, dono da construtora em questão. “Espero que a gente possa construir um caminho positivo e interessante para os dois lados”, diz Deonilson ao interlocutor.

Primeira Parceria Público Privada (PPP) do Paraná, a duplicação da PR-323, no Noroeste do estado, é o motivo de Richa ter caído recentemente nas mãos do juiz federal Sergio Moro, após perder o foro privilegiado. Em delação premiada à Operação Lava Jato, o ex-presidente de Infraestrutura da Odebrecht, Benedicto Júnior, disse que a empresa destinou R$ 2,5 milhões via caixa 2 à campanha de reeleição do tucano, em 2014 – a intenção inicial era repassar R$ 4 milhões. Posteriormente, o valor seria abatido do projeto da obra. No entanto, afundada nas investigações do petrolão, a empreiteira desistiu do serviço.

Em nota, Richa diz que “desconhece qualquer encontro do seu então chefe de gabinete com representante da construtora mencionada. De qualquer forma garante que nunca autorizou qualquer pessoa a fazer tratativas para interferir em qualquer processo licitatório em seu governo”.

A reportagem entrou em contato com a Contern, Copel, governo do estado e Odebrecht, e aguarda retorno. A reportagem tentou ligar várias vezes para o telefone de Deonilson Roldo, mas não foi atendida.

A gravação

A conversa entre Deonilson e Pedro Rache ocorreu no gabinete do ex-secretário, no 3º andar do Palácio Iguaçu, às vésperas do Carnaval de 2014. Após discutirem amenidades por alguns minutos, o braço-direito de Richa pergunta ao empreiteiro sobre os planos dele para participar da concorrência da PR-323. E ouve como resposta que a Contern tinha “planos fortes” e trabalhou bastante para vencer a licitação.

Diante disso, Deonilson diz que o governo agia com cuidado para que não ocorresse “nenhum problema” na PPP, porque havia um “compromisso” em relação à obra. Então, sugere um “entendimento” ao empresário para que o compromisso pudesse ser “respeitado”. “Tem outros [negócios] para acontecerem aí, que a gente quer a coisa comece da forma correta.” Na sequência, cita uma negociação em andamento na Copel à época, que envolvia em torno de R$ 500 milhões para atuar na gestão de seis usinas do Complexo Industrial de Aratu, na Bahia.

As térmicas estavam nas mãos do Grupo Bertin, que enfrentava grandes dificuldades nesses empreendimentos e buscava parceiros comerciais. “Isso aí, pelo que a gente conhece, pode ser até a salvação lá nesse ramo porque o grupo está tendo dificuldades de pôr em pé projetos e está precisando de um parceiro. 49% que a Copel está negociando. Então a gente queria ver em paralelo esses negócios. Se pode compor [as duas coisas]”, propõe Deonilson.

O empreiteiro argumenta que o projeto de participação na rodovia paranaense envolvia parceiros italianos e não teria como garantir o entendimento de imediato. Por isso, pediu uma postergação nos prazos da licitação da PR-323. “E a participação como cobertura?”, pergunta Deonilson. “Eu não vejo problema. Primeiro eu tenho que acertar, que ver lá [na Itália]. Mesmo que tenha uma parte que seja aqui na Copel, como a gente está falando, qual seria uma contrapartida para a construtora? Sendo isso tudo positivo. Abro uma conversa ainda hoje para poder andar nesse processo”, argumenta Pedro Rache. “Já entendi, é um recado. Agora, eu preciso desse tempo. Sem esse tempo, eu não tenho como.”

Deonilson, então, pede meia hora ao empresário para confirmar o novo prazo. “Faz acontecer imediatamente. Porque eu preciso colocar para o outro lado também e ver qual a posição dessa parte do grupo que é a energia. Se você puder só passar um torpedinho ‘postergado’, ‘nova data’, alguma coisa nesse sentido. Aí eu já sei o que é. Eu já marco e falo assim ‘ok, estou viajando, acabou’”.

Dois dias depois da conversa, a abertura dos envelopes da licitação da PR-323 foi postergada em um mês. Somente o consórcio encabeçado pela Odebrecht participou da concorrência. Já as negociações entre Copel e Bertin pelas usinas de Aratu chegaram a ocorrer, mas não avançaram.

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