Orçamento público: o controle necessário – 1. PPA

Durante mais de três anos Edésio Passos escreveu todos os domingos neste Caderno Direito e Justiça do jornal O Estado do Paraná. Neste domingo, muitos irão procurar a sua coluna e não encontrarão, porque Edésio, como todos sabem, será candidato ao senado pelo PT e não usará este espaço até o final de sua campanha. Por isso me pediu que escrevesse neste domingo e nos 13 que se seguirão até o dia 6 de outubro.

Desde pequeno tentei cumprir à risca as tarefas postas por meu pai, mas ocupar o seu lugar, mesmo por alguns domingos, seria impossível. Sempre simples e objetivo, Edésio diz o que sente e relata o que vê. Assim não ousarei escrever o que não sinto e não relatarei o que não vejo. Dessa forma manterei ao meu estilo a essência das colunas do Edésio: a verdade.

Apesar de também ser advogado trabalhista, há mais de um ano e meio exerço mandato de vereador em Curitiba, o que me fez aprofundar o estudo do o direito administrativo, direito financeiro e direito municipal. Dessa maneira, a questão orçamentária será tratada nesta primeira reflexão, por ser tema fundamental para a vida pública e propício para o momento, já que a LDO foi aprovada na Câmara Municipal no último dia 29.

O orçamento, segundo o professor Diogo Figueiredo, teve a sua gênese na Carta Magna Inglesa, firmada em 1215, que previa a necessidade de autorização do Conselho do Reino para criação de novos impostos. O demonstrativo real de como os impostos seriam empregados somente se tornou exigência sob os ventos da revolução liberal, em 1688. No ano seguinte, dentro de uma sacola de couro vermelho estampada com as armas da monarquia britânica, em um documento de apenas quatro páginas se materializava o primeiro orçamento público. Hoje, para realizar a mesma tarefa, em vez de uma peça simples de quatro páginas, o Estado moderno necessita de inúmeros documentos e de um complexo processo.

A Constituição Brasileira estabelece o sistema orçamentário calcado em três leis: Plano Plurianual (PPA), Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e Lei Orçamentária Anual (LOA). Essas três leis objetivam possibilitar um melhor planejamento das contas publicas. A teoria lembra muito a brincadeira infantil, de origem ucraniana, das bonecas que cabem uma dentro da outra. Contudo, na prática, esse sistema tem sido quase uma abstração.

O PPA, que engloba os três últimos anos de uma gestão e o primeiro da próxima, define as metas, objetivos e prioridades da administração pública para todo o período. Todavia até hoje não foi regulamentado. O artigo 3.º da Lei de Responsabilidade Fiscal, que faria tal regulamentação, foi vetado integralmente pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso. Assim, o PPA não passa de uma peça de marketing político. Exemplificando, no PPA 2002-2005 da Cidade de Curitiba, ao invés de metas bem definidas, com números e valores, o termo que mais aparece é “global”. Isso dificulta qualquer projeção de futuro para a administração pública e suas contas; impossibilita seu acompanhamento e afasta o controle da eficácia dos programas propostos.

O PPA é a base do sistema e, portanto, deveria ser a primeira lei elaborada. Contudo, por descaso e desinteresse em relação ao planejamento orçamentário, as Leis Orgânicas em geral, como acontece em Curitiba, mantém a aprovação da LDO antes da aprovação do PPA. Isso acabou por tornar permanente a regra estabelecida pelo ADCT/CF, que teve por objetivo simplesmente a adequação do novo sistema. Na hipótese do PPA não comportar as metas e diretrizes da LDO já aprovada, esta não poderia entrar em vigor. Já estando definidos e aprovados os programas do primeiro ano, o restante fica comprometido.

A experiência na Câmara de Vereadores de Curitiba me faz concluir que o PPA, não obstante ser a base desse processo orçamentário complexo, é visto pelos administradores públicos brasileiros simplesmente como o cumprimento de um rito formal. Todo o grande aparato construído ao longo desses 300 anos não facilitou o controle das contas públicas pelos cidadãos. Ao contrário, quatro páginas dentro da singela sacola de couro vermelho de 1689 parecem ter sido muito mais eficazes nesse propósito.

A esperança da solução deste dilema parece estar nas novas regras que trazem o espírito de controle popular através da gestão orçamentária participativa, que se encontra na Lei de Responsabilidade Fiscal e no Estatuto da Cidade. Este assunto será analisado no próximo domingo.

André Passos

é advogado e vereador de Curitiba/PT.andrepassos@andrepassos.com.br  –
apassos@cmc.pr.gov.br

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