O público despede-se do palhaço Carequinha

  Clarice Castro / AE

George Savalla, o palhaço Carequinha, 
teve morte súbita, aos 90 anos,
enquanto dormia.

Rio – O último "palhaço típico, aquele que nasceu com o dom", morreu na madrugada de hoje (5). George Savalla, o Carequinha, acreditava que era o único palhaço sobrevivente desta linhagem. Ele teve morte súbita, aos 90 anos, enquanto dormia, provavelmente em decorrência de problemas cardíacos. O corpo será enterrado nesta quarta-feira à tarde, em São Gonçalo, no Grande Rio, cidade em que morava desde os 7 anos, e onde hoje foi decretado ponto facultativo e luto de três dias. Carequinha foi vestido com o mesmo terno com o qual se apresentava no circo – do jeito que desejava.

O artista tinha problemas de saúde havia alguns anos. Em 2005, uma pneumonia dupla o deixou na UTI por 28 dias. Na noite de terça-feira, sentiu dores no peito, mas decidiu ir ao médico somente esta manhã, contou seu cardiologista Leandro Pereira de Souza. "Ele trabalhava mesmo se sentindo mal. Quando foi procurar ajuda, a doença já estava avançada", disse o médico. "Carequinha ficou entre a vida e a morte, lutou e, aos 90 anos, venceu a morte. Era muito forte."

O corpo foi encontrado hoje às 6 h, na cama, pela família. O velório, no Centro Cultural Joaquim Lavoura, em São Gonçalo, foi providenciado pela prefeitura, que pagaria também o enterro no Cemitério São Miguel. Wellington Gomes, de 59 anos, um de seus cinco filhos (ele tinha quatro netos e três bisnetos) contou que Carequinha pegara no sono, na noite de terça-feira, vendo TV, como de costume. "Ainda voltei ao quarto à meia-noite, para desligar o aparelho." Eupídea, casada com Savalla havia seis décadas, sofre do mal de Alzheimer.

O velório foi acompanhado por fãs de todas as gerações – afinal, Carequinha tinha 85 anos de carreira. Na fila, havia meninos de 8 e senhoras de 60 anos. "Fiquei triste, levei um susto. Fui a seus shows, tirei fotos com ele", contou Natasha Lourenço, de 13 anos. "Todo mundo ria com ele, até meu pai."

Carequinha se apresentou pela última vez no dia 27, na Semana Nacional do Circo. Já estava bem debilitado, como lembrou a nora Cristiane Gomes, mulher de seu filho Tairone. "Estava fraco, mas se preocupava com os shows. Sempre dizia: ?Tenho que ir."

O palhaço mais querido

George Savalla Gomes nasceu em 1915, em Rio Bonito, no Grande Rio. Nasceu, de fato, no circo – sua mãe, a equilibrista Elisa Savalla, andava na corda bamba quando sentiu as primeiras dores do parto. Logo depois, sob a lona do Circo Peruano, deu à luz. Cinco anos mais tarde, ele já encarnava a figura que o tornou famoso. "Meu padrasto colocou uma careca na minha cabeça e disse: ?Você vai ser palhaço.? Não parei mais. Não sou o melhor palhaço do Brasil, mas sou o mais querido", contou ele à reportagem, em dezembro de 2001.

Carequinha estrelou o primeiro programa da primeira emissora de TV brasileira, o "Circo Bombril", em 1951, na Tupi. O "respeitável público" era composto por crianças que moravam na vizinhança. Suas brincadeiras são copiadas até por Xuxa e Angélica. Foi nessa época que inventou o primeiro bordão: "Tá certo ou não tá, garotada?" Muitos surgiriam depois: "O bom menino não faz xixi na cama/o bom menino não faz malcriação", "ai ai ai carrapato não tem pai". Ele foi pioneiro também no uso do nariz vermelho que se popularizou como símbolo do palhaço. Carequinha ouviu de um menino um conselho para usar chiclete no lugar da bola de plástico: "Chiclete cola tudo", disse o garoto. Comprou oito sabor hortelã e deu para as crianças mascarem. "Depois, é só lavar, moldar e pintar. Dura cinco meses", explicou à reportagem.

Na ocasião, Carequinha disse que a figura principal do circo havia mudado. "O palhaço tem hoje papel secundário, virou distração entre os números circenses." Mesmo assim, não desistia Preparava o neto Iago para sucedê-lo. O menino se apresentou no ano passado como palhaço Gabiroba em festa que celebrava os 90 anos de seu avô.

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