O preposto no Processo do Trabalho e a exigência de ser empregado

(Aplicabilidade do Novo Código Civil)

Introdução

O artigo 843, § 1.º, da CLT faculta ao empregador “fazer-se substituir pelo gerente, ou qualquer outro preposto que tenha conhecimento do fato, e cujas declarações obrigarão o preponente”.

A Orientação Jurisprudencial nº 99 da SDI I do C. TST

A Súmula n.º 333 do C. TST dispôs: “Não ensejam recursos de revistas ou de embargos decisões superadas por iterativa, notória e atual jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho”. Rendeu, ensejo, portanto, à inserção de temas em Orientações Jurisprudenciais, a fim de que o TST contasse com a fonte a que se referiu o verbete.

Dentre as Orientações Jurisprudenciais da SDI I do C. TST encontra-se a de n.º 99, inserida em 30.05.97, que diz: “Preposto. Exigência da condição de empregado. Exceto quanto à reclamação de empregado doméstico, o preposto deve ser necessariamente empregado do reclamado. Inteligência do art. 843, § 1.º da CLT”.

Corrente que apóia a OJ n.º 99 da SDI I

Defendem a obrigatoriedade de ser o preposto empregado Valentin Carrion(1), Wagner D. Giglio(2) e Tostes Malta(3), sendo que o principal argumento jurisprudencial é no sentido de se evitar a inconveniência do “preposto profissional”, porque, quase sempre, sua atuação inviabiliza o objetivo primordial do processo trabalhista, ou seja, a conciliação. Cita-se, como exemplo, entre outros, o contador, responsável pela escrituração dos livros da empresa.

4. Corrente que rejeita a OJ n.º 99 da SDI I

Com Sergio Pinto Martins, Eduardo Gabriel Saad(4) defende a desnecessidade de o preposto ser empregado, dizendo:

“Os tribunais deveriam orientar-se no sentido da aceitação de qualquer preposto – empregado ou não da reclamada – que tenha conhecimento do fato e cujo mandato o autoriza a fazer quaisquer declarações que obriguem o proponente”.

Também Ísis de Almeida compartilha deste mesmo entendimento, dizendo: “O reclamado é substituído pelo gerente ou qualquer outro preposto que tenha conhecimento do fato, e nosso entendimento sempre foi no sentido de que, na falta do gerente, o preposto seria qualquer pessoa vinculada à empresa, para ter conhecimento do fato da reclamação, e por ela credenciada, no feito”(5).

5. O entendimento das Turmas do TRT da 9.ª Região

Pesquisa jurisprudencial indica que, de modo geral, os julgados no E. TRT do Paraná não têm exigido que o preposto seja, obrigatoriamente, empregado, mas, apenas, que tenha conhecimento dos fatos(6).

6. As exceções possíveis

Ao se adotar o comando do C. TST, entendendo-se que o preposto deva ser empregado, não podem ser ignoradas as exceções à regra.

A própria OJ 99, em sua parte inicial, já se refere ao empregador doméstico, ao qual se alia, também, o caso do empregador pessoa física (de pequena empresa).

7. As conseqüências da presença do preposto não empregado

O caput do art. 844 da CLT diz: “O não comparecimento do reclamante à audiência importa o arquivamento da reclamação e o não comparecimento do reclamado importa revelia, além de confissão, quanto à matéria de fato”.

A exegese desse dispositivo legal conduziu o C. TST, através da Seção de Dissídios Individuais I, a enunciar o precedente n.º 74, no seguinte sentido: “Revelia – ânimo de defesa. Revelia. Ausência da reclamada. Comparecimento de advogado. A reclamada ausente à audiência em que deveria apresentar defesa é revel, ainda que presente seu advogado munido de procuração”.

Não há dúvida que existe parte da doutrina corroborando esse entendimento. Nesse sentido Amauri Mascaro Nascimento(7), Carlos Alberto Reis de Paula(8) e Mozart Victor Russomano(9).

Há, contudo, sustentação teórica contrária, através dos juristas Valentin Carrion, Eduardo Gabriel Saad, Coqueijo Costa, Wilson de Souza Campos Batalha, Sergio Pinto Martins e Manoel Antonio Teixeira Filho.

Valentin Carrion assevera: “Comparecendo o advogado da parte ou mesmo qualquer pessoa com a contestação assinada pelo réu (ius postulandi, v. art. 791 da CLT), inexiste revelia; decisões isoladas, mas acertadas, admitem a presença do advogado para elidir a revelia (não a confissão), por constituir tal ato evidente manifestação de ânimo de defesa, que se coaduna com um dos grandes direitos e garantias fundamentais da Constituição Federal de 1988, art. 5.º, LV” (sem grifo no original)(10).

Manoel Antonio Teixeira Filho, em sua atualizadíssima “A Prova no processo do Trabalho”, é enfático: “O máximo que se poderia admitir, na situação prevista na OJ n. 74, da SDI-I, é que o réu seria confesso, em virtude da ausência do preposto” (sem grifo no original)(11).

8. O incabimento do mandado de segurança

Em acórdão recente, a E. Seção Especializada do TRT da 9.ª Região, ao analisar mandado de segurança(12), onde o impetrante inconformava-se com o fato de a autoridade apontada como coatora ter indeferido a juntada de defesa e documentos atinentes, por não ter comparecido à audiência através de preposto empregado, entendeu que o pedido confundia-se com o de decreto de nulidade da decisão atacada e dos atos posteriores, e, portanto, que não encontrava amparo através de mandado de segurança.

9. A visão pelo novo Código Civil

Considerando que o novo Código Civil agora separa as figuras do preposto, em geral, que pode agir em nome do preponente, desde que assim autorizado (art. 1.169), e do preposto-gerente, no sentido de exemplo de preposto (art. 1.172), volta à tona a discussão.

Se o artigo 1.177, parágrafo único, do NCCB, ao tratar da responsabilidade dos prepostos, fixou que os gerentes, ou não, se responsabilizam pessoalmente, perante os preponentes, pelos atos culposos, e, perante, terceiros, solidariamente com o preponente, pelos atos dolosos, a pergunta que se faz é se o Código Civil agora não impõe ao Direito do Trabalho admitir que o preposto pode ser permanente (gerente, com vínculo empregatício) e, também, pode ser temporário (colaborador, sem vínculo), obrigando-se, em ambas as hipóteses, por suas declarações.

10. Conclusões

10.1. O § 1.º do art. 843 da CLT não exige, expressamente, que o preposto, representante do empregador em audiência trabalhista, detenha a condição de empregado;

10.2. No intuito de uniformizar jurisprudência, para efeito da Súmula n.º 333 do C. TST, a OJ 99 da SDI I do C. TST dispõe contrariamente, dizendo que, afora a hipótese de reclamação relativa a empregado doméstico, o preposto deve ser empregado.

10.3. Dentre os doutrinadores que apoiam a necessidade de o preposto ser empregado estão Valentin Carrion, Wagner D. Giglio e Tostes Malta, lembrando a inconveniência do “preposto profissional”;

10.4. Além de Sergio Pinto Martins, defendem a desnecessidade de o preposto ser empregado, Eduardo Gabriel Saad e Ísis de Almeida. Aduzem que a exigência legal restringe-se ao conhecimento dos fatos;

10.5. Perante o E. TRT da 9.ª Região prevalece posição contrária à OJ 99 da SDI I do C. TST;

10.6. Ainda que se adote o entendimento predominante no C. TST, não podem ser ignoradas as exceções: empregador doméstico e empregador pessoa física (pequena empresa);

10.7. Com fundamento na OJ 74 da SDI I do C. TST e entendendo-se que o preposto deva ser empregado, o empregador que assim não se faça representar pode sujeitar-se à revelia.

10.8. Segundo a Seção Especializada do E. TRT da 9.ª Região, não cabe mandado de segurança contra o indeferimento de juntada de defesa e documentos atinentes, sob o fundamento de que o preposto não é empregado.

10.9. Se o artigo 1.177, parágrafo único, do novo Código Civil, ao tratar da responsabilidade dos prepostos, fixou que os gerentes, ou não, se responsabilizam pessoalmente, perante os preponentes, pelos atos culposos, e, perante, terceiros, solidariamente com o preponente, pelos atos dolosos, é possível ter por superada a OJ 99 da SD I do C. TST, entendendo-se que o Código Civil, agora, impõe ao Direito do Trabalho admitir que o preposto pode ser permanente (gerente, com vínculo empregatício), mas, também, pode ser temporário (colaborador, sem vínculo), obrigando-se, em ambas as hipóteses, por suas declarações.

Notas

(1) CARRION, Valentin. Comentários à consolidação das leis do trabalho. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 663.

(2) GIGLIO, Wagner D. Direito Processual do Trabalho. 8. ed. São Paulo: LTr. p. 214.

(3) MALTA, Tostes. Prática do Processo Trabalhista. São Paulo: Edições Trabalhistas, 1971. p. 106.

(4) SAAD, Eduardo Gabriel. Direito Processual do Trabalho. São Paulo: LTr, 1994. p.315.

(5) ALMEIDA, Ísis de. Manual de direito processual do trabalho. 1º. vol. 8. ed. São Paulo: LTr, 1997. p. 142.

(6) BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 9.ª Região. RO 3.796/94. 1.ª Tuma. Relator: Juiz Armando de Souza Couto. Ac. 13.759/95. DJPR 09.06.95; RO 7.066/95. 2ª Turma. Relator: Juiz Luiz Eduardo Gunther. Ac. 7.455/96. DJPR 12.04.96; RO 7.892/94. 3.ª Turma. Relator: .Juiz João Oreste Dalazen. Ac. 13.990/95. DJPR 09.06.95; RO 843/03. 4.ª Turma. Relator: Juiz Sergio Murilo Rodrigues Lemos. Ac. 16.364/03. DJPR 18.07.03; e RO 13.272/99. 5.ª Turma. Relator: Juiz Arnor Lima Neto. Ac. 12.856/00. DJPR 09.06.00.

(7) NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito processual do trabalho. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 405

(8) PAULA, Carlos Alberto Reis de. Revelia. In: Compêndio de direito processual do trabalho. Coordenado por Alice Monteiro de Barros. Obra em homenagem a Celso Agrícola Barbi. 2. ed. São Paulo: LTr, 2001. p. 318.

(9) RUSSOMANO, Mozart Victor. Comentários à CLT. Rio de Janeiro: Forense, 1990. v. II. p. 919.

(10) CARRION, Valentin. Comentários à consolidação das leis do trabalho. 26. ed. at. e amp. por Eduardo Carrion. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 656.

(11) TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. A prova no processo do trabalho. 8. ed. São Paulo: LTr, 2003. p. 157-158.

(12) BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 9.ª Região. MS 00118-2003-909-09-00-0. Indústria e Comércio e Recuperação de Plásticos Monte Claro Ltda. e Exmo. Juiz do Trabalho em exercício na 12.ª Vara do Trabalho de Curitiba. Redator designado: Juiz Dirceu Pinto Junior. Ac. 17.950/03. DJPR 15.08.03.

Luiz Eduardo Gunther

é juiz do TRT da 9.ª Região. Cristina Maria Navarro Zornig é assessora no TRT da 9.ª Região.

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