Da adulação & dos aduladores

O título original da presente crônica era outro: ?Do puxa-saquismo e dos puxa-sacos?. Aí, o meu ?daimon? privativo, descendente talvez daquele que assessorou Sócrates (quando Xantipa permitia, é claro…), advertiu-me solenemente para que eu evitasse o plebeísmo grosseiro, não palatável para leitores mais pudicos ? ou pudibundos. Atendi-o incontinenti, como é público e notório.

Desde o começo dos tempos, a adulação e os aduladores têm sido vítimas de críticas contundentes. Mais do que justas, aliás. Na própria Bíblia, entre outros, há um provérbio paradigmático sobre o tema: ?É melhor ser repreendido pelos sábios do que ser enganado pela adulação dos tolos?. Bacon, o grande filósofo inglês, excelso mestre do ?Novum organum?, foi bem mais contundente: ?A baixeza humana mais vergonhosa é a adulação?. Tácito, séculos antes, não deixou por menos: ?Os aduladores são a pior espécie de inimigos?. Tinha razão o grande orador romano.

Bias, um dos sete sábios da Grécia Clássica, ao ser perguntado sobre quais os animais mais perigosos, respondeu com singeleza: ?Se falas de animais ferozes, são os tiranos; se falas de animais domésticos, os aduladores?. Mas é de La Rochefoucauld, o maior aforista de todos os tempos ? e só podia ser dele ? a mais perfeita concepção valorativa, axiológica, da adulação. Escrevia o francês: ?A adulação é moeda falsa. Só circula porque a vaidade humana não tem limites?.

Alguém, cujo nome não me ocorre agora, definiu a adulação como água de colônia, ótima para agradar o olfato, mas péssima para ser bebida. O grande luso-brasileiro que foi o padre Antônio Vieira, talvez o maior orador sacro do mundo, enfatizava: ?É mais afrontosa a mesura do adulador do que a bofetada de um inimigo?. Isso diz tudo. O ?Imperador da Língua Portuguesa?, como escreveu Fernando Pessoa, tinha todas as condições morais (e intelectuais) para fazer a afirmação que fez.

Para concluir, eu próprio ouso perpetrar u?a máxima de minha lavra: adular o adulador é um ultraje ao pudor. Eu disse máxima? Equivoquei-me. Deveria ter dito: mínima… 

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