Historicidade dos direitos fundamentais

Os direitos fundamentais, conforme acepção de Konrad Hesse, almejam criar e manter os pressupostos elementares de uma vida na liberdade e na dignidade humana.

Neste sentido, em que pesem as variadas denominações atribuídas aos direitos fundamentais e as divergências acerca de seu fundamento, há que se reconhecer como foco precípuo do tema a efetivação desta categoria de direitos.

Verifica-se que os direitos fundamentais possuem pelo menos quatro características que os definem, quais sejam: inalienabilidade, ou seja, são direitos intransferíveis, inegociáveis e indisponíveis; imprescritibilidade, o que implica em afirmar que seu exercício nunca deixa de ser exigível; irrenunciabilidade, podendo, contudo, o titular deixar de exercê-lo por determinado tempo, mas nunca renunciar ao direito e, por fim, historicidade, visto que os direitos fundamentais são históricos, nascidos no início da era moderna, juntamente com a concepção individualista da sociedade e tornam-se valiosos indicadores do progresso histórico.

Com efeito, os direitos fundamentais constituem uma classe variável, aliás, como a história dos últimos séculos demonstra. Nesta esteira, leciona Paulo Bonavides, que a história dos direitos fundamentais das três gerações sucessivas e cumulativas, a saber, direitos individuais, direitos sociais e direitos difusos, é a história da liberdade moderna, da separação e limitação dos poderes e da criação de mecanismos que auxiliam o homem a concretizar valores.

Aponta-se que o lema revolucionário do século XVIII exprimiu em três princípios todo o conteúdo dos direitos fundamentais, prevendo, inclusive, a seqüência histórica de sua gradativa institucionalização: liberdade, igualdade e fraternidade.

Primeiramente, reconheceram-se os direitos individuais ou direitos da liberdade, que se consubstanciam em direitos de resistência ou oposição perante o Estado, que, justamente, limitam a ação estatal, condicionando-a a legalidade, enquanto que ao indivíduo é assegurada a liberdade, não podendo nenhuma conduta ser imposta a este senão mediante lei.

No início do século XX, por obra de acontecimentos históricos como a Revolução Russa e da repercussão da ideologia antiliberal que permeava a sociedade, houve demanda pelo reconhecimento de direitos sociais, econômicos e coletivos, exigindo-se, assim, do Estado não apenas uma conduta passiva, mas também uma conduta ativa, consolidando determinadas exigências de prestações materiais em razão destes direitos da segunda geração. Desta forma, tem-se que nasceram, os direitos da segunda geração, abraçados ao princípio da igualdade, consolidando o segundo lema da Revolução Francesa.

Já os direitos fundamentais da terceira geração assentam-se na fraternidade e não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado, tendo por destinatários o gênero humano. Identificam-se como direitos da terceira geração o direito ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente, à comunicação e o direito de propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade.

Atualmente, fala-se em direitos da quarta e quinta gerações, que se consubstanciam nos direitos à democracia, à informação e ao pluralismo. Visa-se, desta forma, a concretização da sociedade aberta, globalizando direitos fundamentais, universalizando-os no campo institucional.

Entretanto, há que se exaltar que a descoberta e a formulação de novos direitos é um processo infinito, que não acarreta a exclusão dos direitos anteriormente reconhecidos e consolidados, que sobrevivem e continuam irradiando eficácia normativa a todos os direitos da sociedade e do ordenamento jurídico.

Conclui-se, acolhendo os ensinamentos de Norberto Bobbio, que os direitos fundamentais são direitos históricos, nascidos gradualmente em certas circunstâncias, caracterizadas pela luta em defesa de novas liberdades, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas.

Heloísa da Silva Krol é monitora de Direito Constitucional I na Faculdade de Direito Curitiba.

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