Em Curitiba, cobrador de ônibus também é maratonista, músico e locutor

A rede de transporte coletivo de Curitiba conta com o trabalho de cinco mil cobradores nos ônibus, estações-tubo e terminais da cidade. Em cada catraca, uma história de vida diferente. Há cobradores atletas, artistas, estudantes universitários. Alguns são músicos, outros correm maratonas e vários deles têm profissões paralelas – auxiliares de enfermagem, garçons e até narradores esportivos.

O Dia do Cobrador de Ônibus é comemorado em 19 de agosto, e foi criado pela lei municipal 10.458 de 23 de maio de 2002. O mesmo dia foi escolhido no ano seguinte, na lei municipal 10.813 de 16 de outubro de 2003, para homenagear todos os trabalhadores em transporte de passageiros de Curitiba.

Para exercer a função de cobrador de ônibus, estação-tubo ou terminal, com salário inicial de R$ 545,00, os profissionais devem passar por dois cursos de treinamento, um no Sindicato de Motoristas e Cobradores (Sindimoc), outro no Serviço Nacional de Aprendizagem em Transporte (Senat), além de cursos anuais de capacitação promovidos pelas empresas.

Eles cumprem uma carga diária de seis horas de trabalho e passam quase o tempo todo sentados. Assim fica fácil ganhar peso, e o cobrador Cláudio Muniz conhece bem essa história. Quando começou a trabalhar na linha Petrópolis, há 15 anos, ele viu o ponteiro da balança disparar 15 quilos em poucos meses. A saúde começou a dar sinais de alerta e Muniz ouviu do médico os conselhos tradicionais: cuidar da alimentação e praticar exercícios.

Ele começou a caminhar, depois passou para corridas leves e não parou mais. Com o patrocínio da empresa Cristo Rei, que opera a linha onde ele trabalha, virou maratonista e já disputou quatro corridas de São Silvestre. Muniz já perdeu as contas de quantas provas de rua disputou, e participa de quase todas que fazem parte do calendário da Secretaria Municipal de Esporte e Lazer.

O cobrador-maratonista treina diariamente, mesmo no inverno. Ele enfrenta as massas de ar polar na preparação para a Corrida da Independência, marcada para 11 de setembro, e para a Maratona Ecológica Internacional de Curitiba, que acontece todo ano em novembro. Chegar em primeiro lugar não é tão importante. "A maior vitória é da saúde. Quem se cuida é mais feliz", afirma.

A receita de felicidade do cobrador Milton de Lúcia é a música. Cobrador de ônibus há 24 anos, ele ficou famoso no transporte coletivo por animar o trajeto da linha Camargo cantando música sertaneja de raiz. Ele faz dupla com o motorista da linha, Lindolfo de Jesus, que canta a primeira voz. Fora do ônibus, Milton também toca acordeão e Lindolfo toca violão. A dupla faz apresentações beneficentes que animam asilos e festas beneficentes. O último show para um grande público aconteceu no começo do ano, num casamento comunitário organizado pela empresa de ônibus onde trabalham.

"Não quero me gabar, mas a gente podia ser profissional. Tem gente que pega o nosso ônibus só pra ouvir a gente cantar", garante o cobrador. O motorista Lindolfo explica: "a qualidade do nosso repertório chama a atenção das pessoas, porque só tem canções boas". O cobrador Milton busca na genética a explicação para seu gosto pela música. "Meu avô e meu pai eram grandes acordeonistas, e eu sei que o talento é hereditário", diz ele.

O cobrador Jefferson Xavier, que trabalha numa estação-tubo do Terminal Guadalupe, também usa a voz na sua atividade preferida: narrar partidas de futebol. Ele é locutor esportivo na Ativa FM, uma rádio comunitária da Cidade Industrial, onde narra os jogos da série suburbana. Quem sintonizar a FM 104,9 neste sábado (20), vai conferir o trabalho do cobrador-locutor na decisão do campeonato entre os times Combate Barreirinha e Capão Raso. "O trabalho em rádio comunitária é muito alegre e envolvente, mas eu não penso em trocar minha profissão no transporte coletivo. É um trabalho sério que merece respeito", afirma.

Já Éderson Silvério não queria ser cobrador; sonhava ser enfermeiro. Começou a trabalhar no transporte coletivo há pouco mais de um ano, depois do fechamento da clínica médica onde trabalhou durante cinco anos como auxiliar de enfermagem. No começo a família não gostou da idéia, tinha medo de assalto, mas Éderson acabou descobrindo uma profissão "digna e gratificante", como ele mesmo descreve.

"Meu sonho ainda é ser enfermeiro, um dia ainda vou fazer faculdade, mas estou muito realizado com meu trabalho no ônibus", garante. Ele continua exercendo a atividade de auxiliar de enfermagem nos turnos livres, atendendo idosos e pacientes em recuperação de cirurgias. Mas a rotina diária é na linha Itatiaia, que circula pela CIC. "Já passei por várias linhas, conheci a cidade inteira, e descobri que o segredo para prestar um bom serviço é tratar o passageiro com respeito e consideração. Afinal, ele é o nosso cliente", afirma. E no Dia do Cobrador, Éderson não faz questão de presente. "Se o passageiro trouxer moedas para facilitar o troco, já vou ficar muito satisfeito", afirma ele.

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