Calote de Marta eleva dólar e detona a Bolsa

São Paulo

– O mau humor e a especulação voltaram ontem a dominar os negócios no mercado brasileiro: um mal-entendido sobre a decisão da Prefeitura de São Paulo de não amortizar uma parcela opcional de R$ 3 bilhões de sua dívida com o Tesouro pressionou o câmbio e os títulos da dívida, abrindo espaço para movimentos de realização de lucros e manobras especulativas.

Depois de cinco quedas seguidas, o dólar disparou fechando em alta de 3,69%, cotado a R$ 3,655, mesmo num dia em que o Banco Central (BC) voltou a vender a moeda no mercado à vista, o que não ocorria desde 29 de outubro. O C-Bond, que chegou a cair 3,5%, encerrou o dia em queda de 0,76%, negociado a 57,375% do valor de face. O risco país subiu 3,43%, para 1.811 pontos.

O economista-chefe do banco JP Morgan, Luís Fernando Lopes, disse que o mau humor começou no mercado de títulos da dívida. A leitura apressada de alguns investidores estrangeiros foi de que a Prefeitura de São Paulo, administrada pelo PT, teria dado um calote em sua dívida, e não que havia exercido um direito previsto no contrato. Segundo ele – que teve de escrever um relatório para os clientes para esclarecer a questão -, houve quem lembrasse a decisão do governador de Minas Gerais, Itamar Franco, de não honrar a dívida mineira em 1999. A queda do C-Bond contaminou o mercado de câmbio, e estimulou os investidores a comprar dólares.

Lopes disse que a tensão diminuiu um pouco depois das entrevistas do secretário municipal de Finanças, João Sayad, e do secretário do Tesouro, Eduardo Guardia, mas os esclarecimentos não foram suficientes para que os investidores retomassem as vendas de dólares.

“Depois de cinco dias de baixa, era esperado que houvesse uma correção do preço do dólar. Mas a questão é que ainda há muitas incertezas em relação ao governo do PT, que vai enfrentar problemas difíceis, como a alta da inflação e o elevado endividamento do setor público”, afirmou o analista Hélio Ozaki, da corretora Finambrás.

Segundo o chefe da mesa de câmbio do banco ING, Alexandre Vasarhelyi, ontem ocorreu o primeiro ruído na comunicação entre o PT e o mercado em várias semanas. Ele afirmou que os investidores brasileiros relevaram o fato porque sabiam que a decisão da Prefeitura não é um calote, mas que o mesmo não ocorreu com os estrangeiros, que ainda “não dão o benefício da dúvida ao partido”.

No meio da tarde, surgiu uma outra notícia que alimentou as compras de dólares, de acordo com o Lopes: o risco de que possa surgir um novo esqueleto: a possível correção das prestações do financiamento à casa própria antes do Plano Collor em 1990, tema em pauta no STJ. “A notícia ajudou a azedar o humor dos investidores, ainda que nada tenha sido decidido ainda.” Operadores destacaram que o movimento do câmbio e dos títulos da dívida teve um caráter especulativo e de correção técnica. Como o dólar havia caído muito nos últimos dias e o C-Bond subido fortemente, era natural que houvesse um ajuste de preços. A questão é saber se esse movimento é temporário ou se a tendência negativa vai predominar. Na semana que vem, há um vencimento de US$ 1,93 bilhão de títulos e contratos atrelados ao dólar, que podem pressionar o câmbio.

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