Caduquice prematura

O ministro da Previdência Social, Ricardo Berzoini, enquanto Lula se encontrava na África, onde depois de muitos sucessos cometeu lamentável gafe, deu sinais de caduquice prematura. Suspendeu as aposentadorias e pensões do INSS para os maiores de 90 anos, os mais velhos clientes do precário sistema de previdência pública, a maioria dos quais não ganha mais que um salário mínimo, ou seja, míseros R$ 240,00. O motivo da medida não precisa nem ser explicado, mas sua oportunidade ninguém explica.

Muita gente recebe por procuração ou apenas usando os cartões de saques, aposentadorias e pensões de beneficiários que já faleceram. É golpe e precisa ser punido, pois dá ao sistema um prejuízo bastante volumoso, ainda não calculado. A suspensão dos pagamentos, com a exigência de um imediato recadastramento com a apresentação de uma extensa fileira de documentos (viva a burocracia!), poderia acabar essa sangria no sistema, retirando dele os que recebem sem direito, pois não são os verdadeiros beneficiários. Estes já morreram.

O recebimento fraudado é crime. Mas, na legislação brasileira, a prova cabe a quem alega e se alguém, uma autoridade ou mesmo um INSS, deseja dizer que fulano de tal, aposentado ou pensionista, já morreu, portanto ninguém em seu nome pode receber, que o prove. O espetáculo lamentável mostrado pelos jornais e emissoras de televisão, de idosos com mais de 90 anos, alguns até com mais de 100, carregados por parentes, em cadeiras de rodas ou mesmo sendo transportados no colo, para depois mofarem em imensas filas para provarem que ainda estão vivos, é uma inversão de prova, além de um ato desumano e insano.

Pior, quando o velhinho chegava, afinal, ao guichê do INSS, depois de horas de dolorosa espera, e faltava algum documento da extensa lista exigida, ou algum deles não estava de acordo com as normas estabelecidas pela burocracia. Teria de ser carregado pelos amigos e parentes para casa, providenciar novos documentos e enfrentar a absurda fila mais uma vez. A esse sacrifício e humilhação foram submetidos centenas de velhinhos, em razão da caduquice de alguma autoridade ou burocrata que se escondia sob a desculpa de que estava tentando salvaguardar os interesses do INSS e do dinheiro público que mal administra.

Em qualquer país civilizado, quando um beneficiário de sistemas de previdência estiver impossibilitado de locomoção ou ela seja difícil, em razão da idade, um funcionário do sistema, algum assistente social, é designado para procurá-lo em seu domicílio e ajudá-lo a provar que continua com o direito ao benefício. Que continua vivo. Do jeito que as coisas começaram a ser feitas, nada estranharia que muitos morressem na fila, diminuindo o déficit do sistema previdenciário que tanto apavora o governo.

Felizmente, o ministro Ricardo Berzoini, com a grita que o ato insano do INSS levantou, acabou voltando atrás, antes sem pedir desculpas, o que seria o mínimo de se esperar. Apenas reconhecendo o erro. Depois, curvando-se à pancadaria que veio da oposição e dos próprios clientes do INSS, desculpou-se, o que poderá lhe valer algumas indulgências, mas nunca perdão. De um ministro seria exigível bom senso e um mínimo de inteligência. Se não, provado está que não é habilitado para o importante cargo que ocupa.

Agora virá o recadastramento com mais prazo e, quem sabe, com alguma ajuda aos velhinhos, livrando-os das filas. E se maracutaias forem descobertas, aqui e ali, que o INSS tenha a competência de acionar a Justiça para punir os fraudadores. Nunca os nonagenários necessitados.

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