A recuperação judicial como saída

A atual crise econômica mundial, cujos reflexos já estão sendo sentidos no Brasil, e a perspectiva de que 2009 será um ano de muitas dificuldades, tem reacendido o estudo da Lei 11.101, de 9/2/2005, que substituiu a concordata pelo instituto da Recuperação Judicial. O instituto é destinado aos empresários e sociedades empresárias que estão com sérias dificuldades financeiras, e tem como objetivo promover medidas que recuperem a empresa, mantenham sua função social de gerar empregos e tributos, e estimulem a atividade econômica.

Pela nova lei, o pedido de recuperação judicial deve ser apresentado ao Juiz com os motivos da crise financeira e com os documentos que comprovem a situação econômica da empresa, dentre os quais, os documentos fiscais, listas de credores e de bens da empresa, relação de funcionários e seus salários, etc., cumprindo o art. 53 da Lei 11.101.

Preenchidos os requisitos da referida lei, o Juiz irá deferir o processamento da recuperação judicial e nomear um administrador judicial, que será pessoa da sua confiança (preferencialmente uma empresa especializada, advogado, economista, administrador de empresas ou contador). Os sócios da empresa em recuperação não perdem a administração da mesma, pois ao administrador judicial caberá apenas auxiliar o Juiz e os credores durante o processo de recuperação e não administrar o negócio em si.

Com o deferimento judicial do processamento da recuperação, todas as ações propostas contra a empresa ficarão suspensas por um prazo de 180 dias.

A partir da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação, a empresa deve apresentar ao Juiz, no prazo de 60 dias, um “Plano de Recuperação”, onde deverá constar em detalhes a sua viabilidade econômica, os meios que serão usados para recuperá-la e a forma e prazos em que serão pagos seus credores.

Diferentemente do que ocorria com a concordata, onde existia um prazo máximo de 24 meses para pagar os credores, no “Plano de Recuperação” não há limite para isso e nem uma única forma de pagamento. Este, por exemplo, pode ser através da concessão de prazos (não há limite de tempo), condições especiais de pagamento (como por exemplo, pagamento de 80% da dívida ou, ainda, sem juros), a cisão, incorporação ou fusão da sociedade, aumento de capital social, transferência ou arrendamento à sociedade constituída por empregados, venda de bens, entrega de bens a credores, redução salarial, prazos diferentes para pagamento de cada credor, etc.

O que importa é que, sendo viável a continuidade da empresa, o “Plano de Recuperação” deve propiciar uma forma de pagamento aos credores dentro das possibilidades e do fluxo de caixa da empresa em recuperação.

Com efeito, diante do “Plano de Recuperação” apresentado pela empresa, o Juiz mandará publicar edital de aviso, convocando os credores para manifestação sobre ele, em trinta dias (art. 53 e 55). Se o pedido for impugnado por algum credor, o mesmo Juiz convocará uma assembléia geral de credores para deliberar sobre o mesmo, sendo que o voto de cada um dos credores será proporcional ao valor de seus respectivos créditos e a dita assembléia será constituída de três classes distintas, a saber: (a) credores trabalhistas; (b) credores com direitos reais de garantias; (c) credores quirografários e com privilégios especiais e gerais.

Feito isso, considerar-se-á aprovado o Plano se nessa Assembléia a empresa em recuperação obtiver voto favorável dos credores presentes que representarem mais de 50% da totalidade dos créditos arrolados no quadro de credores em cada uma das três classes acima referidas e, cumulativamente, obtiver maioria simples dos credores presentes na mesma Assembléia (arts. 37 e 45).

O importante é que na assembléia de credores o plano também poderá sofrer modificações e, ainda que não obtenha o percentual de aprovação acima referido, poderá, nos termos da lei, ser aprovado pelo Juiz.

É de se destacar, no entanto, que não são todas as dívidas da empresa que estão sujeitas ao “Plano de Recuperação”. Algumas podem ser cobradas diretamente da empresa, como as que tenham origem em adiantamento de contrato de câmbio, contratos com alienação fiduciária ou arrendamento mercantil. O mesmo ocorre em relação aos avalistas ou fiadores, de quem os credores podem cobrar diretamente.

Entretanto, já existam teses jurídicas defendendo a impossibilidade disso se já houver a aprovação do plano de recuperação. Enfim, quando a empresa está passando por uma grave crise econômica, que pode até comprometer sua existência, a Recuperação Judicial é uma saída que se apresenta, pois conforme o próprio texto da lei (art. 47), o seu objetivo é “viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica”. E não raro, o alongamento dos prazos para o pagamento das dívidas, a venda parcial de bens com prazos razoáveis e mudanças na gestão da empresa, permitem que esta se recupere e volte a atuar com força total ao mercado.

José Eli Salamacha é mestre em Direito Econômico e Social pela PUCPR, professor em Curso de Pós-Graduação na disciplina de Recuperação Judicial e Falência, advogado no Paraná e sócio da WSW Advogados Associados.

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