A pedra e a vidraça

A pressão financeira que o Brasil está sofrendo não é novidade. Já aconteceu, em maior ou menor medida, aqui e em outras partes do mundo, tendo como causa primeira as possibilidades de uma vitória das esquerdas nas eleições.

Jean-Paul Fitoussi, respeitado economista da França, presidente do Observatório Francês de Conjunturas Econômicas, esteve no Brasil e testemunhou que seu país sofreu ataque semelhante em 1981, com a chegada do socialista François Mitterrand à presidência. A vitória de Mitterrand representou muitas esperanças para a esquerda francesa, com grandes reformas econômicas, nacionalizações de empresas, maior justiça social, como prometia e figuravam do ideário de seu partido. As mesmas esperanças que a esquerda brasileira busca plantar no seio do eleitorado. E não por demagogia, mas por sincera crença de que é capaz de realizar tais transformações.

O socialismo, entretanto, nas suas diversas formas, em geral desagrada ao centro, à direita, aos empresários, conservadores e ao mercado, inclusive e em especial o financeiro. É que se opõe ao capitalismo e à economia de mercado e contraria muitos interesses, legítimos e ilegítimos, internos e internacionais.

Miterrand, uma vez no poder, foi obrigado a fazer adaptações em suas promessas, como testemunha Jean-Paul Fitoussi. “Depois que chegou ao poder, o presidente constatou que uma mudança radical não era possível”, revela o estudioso francês. E falando sobre o Brasil e a perspectiva de vitória de um candidato como Lula, acrescenta: “Não creio que vamos assistir a uma mudança radical na política econômica”.

Há, de fato, uma diferença muito grande entre ser pedra e ser vidraça. Quando se é oposição, critica-se, exigem-se reformas e atribui-se à vontade política o condão de tudo mudar. Quando se está no governo, aparecem, vistas de perto, as condicionantes, a principal das quais é a falta de dinheiro e a ausência de consenso da sociedade. No Brasil, Jean-Paul Fitoussi avistou-se com o presidente Fernando Henrique Cardoso, a quem reiterou sua opinião de que as desconfianças do mercado em relação ao Brasil não se originam em fatos econômicos. Relacionam-se com as eleições.

Interessante observar que a França refluiu de sua guinada à esquerda com Mitterrand e hoje encontra-se nas mãos da centro-direita. E até sofreu uma ameaça da extrema direita e uma lamentável derrota de sua esquerda moderada, que estava nos poder através do primeiro-ministro Jospin. O mesmo pode-se dizer de Portugal, que viveu sua Revolução dos Cravos. E da Polônia, com o Solidariedade.

Os governos da esquerda mais estremada que hoje existem e resistem no mundo, se mantêm graças a ferozes ditaduras. E se eternizam através da eliminação de qualquer tipo de oposição. Por coincidência, todos esses governos ditatoriais de esquerda estremada são conhecidos fracassos econômicos, o que faz levantar uma outra indagação. Seria um sistema de governo que busca a justiça social e a eficiência econômica? Ou traz um defeito sistêmico de ineficiência, a despeito de eloqüentes boas intenções?

Como no atual pleito, todos os candidatos à Presidência do Brasil podem ser considerados de esquerda, uns mais e outros menos, parece-nos válida a experiência. Há muito as esquerdas tentam alcançar o poder sem sucesso. Quem sabe desta vez o alcancem. Vejamos como se comportarão diante da realidade do poder.

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