Reginaldo Faria usa sua experiência pessoal para construir personagem

Reginaldo Faria já se acostumou tanto à insegurança antes do início de cada trabalho que passou a defini-la como uma característica do artista. Os “sintomas” vão de uma leve taquicardia a uma quase incontrolável “vontade de fugir”. Com Cabocla não foi diferente. Sobretudo porque, desde O Clone, de 2001, ele não “enfrentava” os estúdios – fez apenas uma participação em Celebridade. O intervalo, segundo ele, é o suficiente para que esqueça que sabe “fazer as coisas”. Mas Reginaldo não se importa. “Sem medo, a vida seria chata. Deus é absoluto, mas deve ser um entediado”, pondera, com o bom humor que se sobrepõe ao jeito reservado em poucos minutos de conversa.

Iniciado o trabalho, o sensato Joaquim acabou se revelando familiar. A relação com o filho, Luís Jerônimo, vivido por Daniel Oliveira, Reginaldo captou de primeira. “Pela educação que tive, tenho mais facilidade para entender um pai rígido que um ‘modernoso'”, justifica. A vida afetiva do personagem, que redescobre o amor na jovem Pequetita, interpretada por Mareliz Rodrigues, foi mais fácil ainda. Enquanto Joaquim ainda se censura pela paixão por uma moça que, exagerado, diz parecer sua neta, Reginaldo é casado com uma mulher 33 anos mais jovem, a cantora Rose Ventura. “É só trocar de cenário, de mulher e de época”, simplifica, aos risos.

Cinema

Aos 67 anos de idade, Reginaldo está ansioso por voltar à direção. O ator tem oito filmes no currículo, sendo o último Barra Pesada, de 1977. “É uma forma mais ampla de expressão. Papéis me são oferecidos e podem até exprimir algumas idéias minhas, mas não é a mesma coisa”, tenta explicar. Para quem conhece seu jeito de típico contador de histórias, a justificativa basta. É com uma delas, aliás, que o ator destaca a inquietação que o acompanha desde criança. “Com quatro anos, me perguntava o que seria a morte, o que seria ‘ser o nada’. Caía num berreiro e minha mãe não entendia nada”, conta Reginaldo, que já escreveu várias peças de teatro e é um exímio violonista, com cerca de 60 composições guardadas na gaveta. “Acho que não suportaria ser só eu”, conclui, com um sorriso tranqüilo.

À caça de emoções

Depois de iniciar a carreira no cinema, ainda na adolescência, Reginaldo Faria começou a se dividir entre a sétima arte e os trabalhos na telinha em 1965. Seu primeiro papel de destaque foi em Dancin’ Days, de 1978, na qual interpretou Hélio, o dono da boate que dava nome à trama. Mas a maioria das boas lembranças que Reginaldo guarda da tevê não está relacionada a grandes sucessos. “Há trabalhos que marcaram pelo sucesso, como Dancin’ Days e Água Viva. Mas o melhor é quando marcam pela profundidade”, diferencia. A única “coincidência” é o corrupto Marco Aurélio, de Vale Tudo, até hoje seu papel mais lembrado pelo público. Reginaldo destaca ainda o Barão Sobral, de Força de um Desejo, “pela intensidade”, e as minisséries A Máfia no Brasil e Boca do Lixo. “Sempre quis fazer uma coisa meio mafiosa. E, em Boca do Lixo, fazia um homossexual. Qualquer exagero me levaria a um ridículo atroz”, justifica o ator, que, à exceção de Corpo Santo, da Manchete, fez todos os seus trabalhos na Globo.

Chefão

Reginaldo Faria iniciou a carreira artística levado pelo irmão mais velho, o diretor Roberto Faria. Com ele, fez alguns de seus maiores trabalhos no cinema, como Assalto ao Trem Pagador, Os Machões e Pra Frente, Brasil. Já consagrado, acabou influenciando os filhos a adotarem a mesma opção. Pai do diretor Régis Faria, do ator Marcelo Faria e do caçula Carlos André – que se mudou para a casa do ator, no Rio de Janeiro, para investir no teatro -, Reginaldo só lamenta o fato de não poder estar sempre trabalhando com os três. “Nossa família adora o prazer de trabalhar junto. É uma coisa meio mafiosa mesmo”, confessa, com um sorriso maroto.

Voltar ao topo