Juízas sonham com a Copa do Mundo

Rio de Janeiro

  – O atual quadro de árbitros de futebol da Fifa tem sete mulheres brasileiras, um número expressivo, mas que ainda não sugere um futuro promissor para as novas musas. Até agora, por exemplo, só os homens tiveram o privilégio de apitar jogos de Copa do Mundo. “Podemos mudar isso. Somos mais respeitadas pelos atletas. Eles se controlam mais e quando nos ofendem, pedem logo desculpas”, contou Sueli Teresinha Tortura, da federação do Paraná.

Paciência e uma certa dose de tolerância não faltam a Tortura, principalmente por causa das gozações com o sobrenome. No mais, ela guarda ótimas recordações das dezenas de partidas que já dirigiu. Numa delas, entre o Paranaguá e a Portuguesa Londrinense, pela divisão de acesso do Paraná, Tortura teve o vestiário cercado e invadido após o jogo. Policiais militares chegaram com rapidez para acabar com o tumulto. Mas não intervieram. Os torcedores queriam apenas autógrafos e fotos ao lado da juíza.

“Houve empate, um resultado ruim para o time da casa. Por isso, fiquei impressionada com a alegria do público”, lembrou. Em São Paulo, Sílvia Regina de Oliveira também costuma ser reverenciada pelos torcedores.

Várias vezes, em dias de jogos, recebe flores no vestiário. Volta para casa com a cota da arbitragem e buquês. Sílvia sente-se segura em aplicar a regra. Não hesita em expulsar um atleta por indisciplina ou falta violenta. Em geral, não sofre represálias. “Com as mulheres apitando, quem é punido com cartão vermelho dá as costas e vai embora.” As benesses da profissão não iludem a juíza paulista. Sílvia admite ser muito difícil uma escolha feminina para a Copa da Alemanha, em 2006. Prevê etapas a serem cumpridas: mundiais sub-17 e sub-20 e Olimpíada. Um argumento, porém, pode reforçar a idéia de a Fifa convocar um “grupo misto” para as próximas competições internacionais de peso. “Num trio de arbitragem, quando há uma mulher, as atenções são totalmente desviadas e os homens quase passam despercebidos. É tudo o que eles querem”, explicou Sílvia.

Marlei Leite da Silva, Maria Edilene, Sirlei Cândida, Cleidy Mary e Ticiana de Lucena completam o primeiro escalão de juízas de futebol do País.

Assistente de árbitro, em Minas Gerais, Marlei tem no currículo partidas marcantes, mesmo aquelas nas quais figurou como suplente. A principal foi o amistoso Brasil 2 x 2 Romênia, em 1995, no Mineirão.

Cumprimentada por todos os jogadores da seleção de Zagallo, teve de contar detalhes da façanha a todos os fregueses de sua loja de eletrônicos, em Belo Horizonte.

Marlei é outra que não se queixa dos atletas. Não pode dizer o mesmo das jogadoras. Já passou por situações delicadas em campo quando apitou partidas entre equipes femininas. “Por ser do mesmo sexo, as moças acham que têm intimidade, que sou colega delas e aí tenho de mostrar autoridade.” Agiu assim num jogo das seleções sub-17 do Brasil com a Hungria, cinco anos atrás. Inconformada por ter sido advertida com cartão amarelo, uma atleta do time visitante adotou uma postura agressiva e tentou enfrentar Marlei. Com calma, a então juíza gesticulou para que ela se afastasse. “Me obedeceu na hora, senão seria expulsa.” De todas as experiências em 11 anos de atividade, Marlei destaca uma que mostra essa relação tensa e cordata ao mesmo tempo com o público.

Três semanas atrás, atuou como bandeirinha de América x Ipatinga, pelo campeonato mineiro. Assinalou impedimento num ataque da equipe da casa.

Resultado: gol anulado. Do alambrado, torcedores mais exaltados gritavam e ofendiam Marlei. Ela fingia não ouvir. Mas saiu triste do estádio. No dia seguinte, convidada a participar de um programa de debate na TV, veio a recompensa: por vários minutos, os telefones da emissora registraram um número alto de chamadas. Era parte da torcida do América pedindo desculpas pelas grosserias.

Voltar ao topo