Esse “japonês” do Coxa sabe tudo de bola

Luiz Augusto Xavier ? São poucos os nisseis envolvidos com o futebol. Como você entrou nessa?

Oscar Yamato ?

Comecei no esporte amador, foi dentro de uma diversão das equipes da algodoeira, na época o Matsubara, que tinha algodoeiras em Bandeirantes e fazendas em Cambará, e tinha amizade com um dos diretores que até era da família, o Ludovico Takaia. Ele me convidou para dar uma mão, mesmo quando era amador, isso em 1975, em que o Matsubara iniciou a disputa entre a fazenda e a algodoeira, depois disputaram o Torneio Frei Rafael em que montamos uma equipe…

Xavier ?

(…) Você começou no amador do Matsubara.

Yamato ?

Exatamente, comecei no amador do Matsubara e em 1975 foi o Torneio Frei Rafael em que fomos campeões e ainda em 1975 disputamos a Taça Paraná, em que fomos vice-campeões. E aí a família gostou e partimos para o profissionalismo em 1976. O Sueo Matsubara, que era um homem arrojado, gostava muito de futebol, comprou toda equipe do União Bandeirante e a comissão técnica e o Matsubara, em 1976, foi vice-campeão da segunda divisão de profissionais e em 1977 chegou a Primeira Divisão. Fizemos um trabalho de formação, que acabou contratando o Bolão, o Luís Carlos de Oliveira, que tinha um conhecimento amplo em termos de formação e era um professor da melhor qualidade.

Borba Filho ?

Quer dizer que, mais do que a rivalidade de vizinho, o fato de ter comprado o time inteiro do Bandeirante foi o que criou a rivalidade entre Matsubara e União?

Yamato ?

Exatamente, foi a equipe toda e a comissão técnica, com Brandão, Claudinho, Betão, Renato…

Borba ?

(…) Não era fácil pro Serafim engolir isso.

Yamato ?

Não era fácil, tanto é verdade que a rivalidade era muito grande, inclusive era o clássico regional e havia uma disputa muito grande dentro e fora do campo.

Cristian Toledo ?

Existia mesmo essa história de tocar fogo no canavial, fazer pressão?

Yamato ?

Isso é verdadeiro, o Serafim não deixava nada barato (risos). Ele cobrava muito dos jogadores, cobrava da comissão técnica e os jogos ali na casa dele não podia perder.

Xavier ?

(…) Ainda mais contra o vizinho.

Yamato ?

Contra o Matsubara era pior ainda, porque a rivalidade era grande. Apesar de serem amigos fora do futebol, tinham bom relacionamento…

Borba ?

Até pra quem não sabe, o escritório principal das empresas do Matsubara era em Bandeirantes.

Yamato ?

Era em Bandeirantes, somente o futebol ficava em Cambará. Completando sua pergunta, inclusive houve um episódio em que o Borba presenciou, quando guardaram o ônibus no meio do canavial e tocaram fogo…

Borba ?

(…) Ônibus do Coritiba…

Yamato ?

Isso. E tocaram fogo no meio do canavial.

Xavier ?

Como o Matsubara entrou naquela de revelar jogador, buscar jogador pra negociar mais tarde?

Yamato ?

Isso se deu com a contratação do Bolão, porque ele já tinha passado pelo Noroeste, Ponte Preta e lá já existia isso. O interior paulista formava e valorizava muitos jogadores. E o Matsubara, pensando no futuro de que muitos clubes teriam dificuldades, apostava na formação. A equipe era forte, inclusive alguns profissionais foram cedidos ao Cascavel, Londrina. Na campanha de 77 tínhamos Claudinho, Brandão, demais jogadores…

Borba ?

Eu me beneficiei disto…

Yamato ?

Você se beneficiou, levou o Doquinha que era um bom jogador, saíram vários jogadores, indo inclusive para seleção brasileira. E teve lucro, porque eles não trabalhavam para perder e faziam um trabalho de um clube-empresa. Eles já aplicavam essa história de clube-empresa. Fizemos um grande trabalho, o primeiro jogador que chegou na concentração do profissional foi o Paulo Comelli, que hoje é um grande treinador do interior de São Paulo e foi o jogador juvenil na época que veio morar na concentração do Matsubara. Aí formamos os alojamentos, construímos, fizemos o centro de treinamento, iniciei mas não sei se terminaram porque eu não voltei mais para Cambará, mas esse trabalho acabou beneficiando o Matsubara, que teve um grande lucro e vendeu jogadores como Carlos Alberto Dias, Luís Carlos, Djalma Bahia, Newmar, que tinha uma estrela muito grande, foi campeão mundial, o Toninho Carlos foi campeão paulista, campeão brasileiro, chegou à seleção brasileira, Djalma Braga, o Gritti, que foi campeão em Toulon. Até hoje ainda tem o Ratinho, que está na Alemanha.

Borba ?

Você tocou num aspecto que acho fundamental. Você falou que o Matsubara foi o pioneiro. Você agora teve uma situação que eu acho importante, que disse não saber se existe mais o centro de treinamento. A única coisa na minha passagem pelo Matsubara que acho que destoou, porque achei que tinham abandonado e creio que ficou abandonado. Por que aconteceu isso?

Yamato ?

É um episódio triste e eu não gosto de dizer isso porque o futebol era do grupo da família Matsubara e os irmãos mais velhos, o seu Takeo Matsubara, depois que faleceu o Sueo, aí os sobrinhos deram seqüência e o seu Takeo ficou triste. Com a minha saída, o próprio Takeo me chamou na fazenda e perguntou: “por que você está saindo?” Disse que estava saindo porque havia surgido uma oportunidade e tinha um objetivo de ir para um centro maior, inclusive me mudar de Cambará. Ele disse que se era por isso, então tudo bem, não teria como me segurar. “Se fosse por parte financeira, você não vai sair”. Disse que não, era isso, não tinha nada a ver com dinheiro…

Xavier ?

(…) de onde veio a proposta?

Yamato ?

De Maringá. Eu queria sair para um centro maior porque já estava muito tempo no Matsubara. O seu Takeo disse “olha Yamato, para mim vai ser muito difícil porque você sempre tocou tudo sozinho, você que administrou, é o nosso homem de confiança, não temos ninguém para colocar em seu lugar. Fico triste em estar perdendo um grande profissional, um grande amigo, uma pessoa de confiança e feliz porque você realmente é uma pessoa de futuro, que pensa lá na frente. Acho que você vai ter espaço e vai ser um vencedor”.

Borba ?

Que ano que foi isso?

Yamato ?

Em 1987.

Borba ?

E depois disso o Matsubara só caiu.

Yamato ?

Não sei se é coincidência ou não, prefiro evitar esse tipo de colocação. Muitos dizem e muitos vêm falar para mim que realmente o Matsubara era uma das equipes que davam muito apoio para a formação de base, haja vista que no campeonato brasileiro de seleções, por várias vezes o time base do Estado do Paraná era do Matsubara, inclusive a sede ficava em Cambará. A melhor campanha do Paraná fez foi em 1989, onde surgiu Djalma Bahia, Newmar, Toninho Carlos, inclusive os únicos que participavam de fora eram o Tico, Leomir, o Pastor e o Ademir. Essa seleção foi terceira colocada, inclusive as condições foi o grupo Matsubara quem deu, e o falecido Sueo Matsubara exigia o melhor para os jogadores e tinha retorno. Iam viajar, ficavam no melhor hotel…

Cristian ?

(…) O melhor ônibus…

Yamato ?

Ônibus zero. Ele comprou um ônibus leito para dar para a molecada e bancava. Inclusive quando a seleção teve que vir para Curitiba, o presidente da FPF era o Luiz Gonzaga da Mota Ribeiro, que disse que a Federação não tinha condições e iria botar os jogadores na concentração do Pinheirão e quando ele soube onde eles ficariam ele ligou para mim pra Cambará e perguntou o que estava fazendo. Disse que tinha um compromisso para amanhã. Ele disse para deixar esse compromisso, ir até Londrina, pegar o avião e ir resolver os problemas em Curitiba. “Parece que estão querendo colocar os jogadores na concentração do Pinheirão e não está legal”. Vim pra cá e realmente não estava legal aí ele falou com o Ribeiro, que disse: “olha Dr. Sueo, no momento não tenho condições, as condições que nós temos são de alojá-los aqui”. Vi que a situação não era das melhores, mas dava para ficar. Ele disse “como diretor representante da seleção não admito que essas coisas. Vai lá no Iguaçu Campestre – que era o maior cinco estrelas daqui – e alugue por 30 dias”. E os jogadores ficaram 30 dias no Iguaçu, nas melhores condições e só fomos desclassificados pela seleção do Rio, que era a grande seleção, onde jogavam o Moser, Leandro e vários jogadores de nome, e acabamos ficando em terceiro lugar. Em outra campanha, acho que foi em 84 ou 85, fomos campeões com a base do Matsubara.

Cristian ?

O Matsubara talvez tenha sido o primeiro time do País a ficar famoso por causa da Copa São Paulo, da Taça São Paulo como se chamava naquele momento. Como é que era essa Taça São Paulo, que hoje é uma competição mercantilizada, cheia de empresários?

Yamato ?

A Taça São Paulo tinha muita qualidade técnica porque eram os campeões do Estados que participavam. Não havia convite. Tinha que ser campeão do Estado ou vice.

Xavier ?

Era só time novo?

Yamato ?

Exatamente. O Matsubara foi oito vezes campeão estadual de juniores. A disputa geralmente era entre Matsubara e Londrina. Inclusive era no período em que havia um excesso de profissionais. Então os jogadores profissionais que tinham condições de disputar a Taça São Paulo iam, porque era uma vitrine muito grande. Vinham pessoas de fora observar jogadores que estavam participando do campeonato e revelavam muitos jogadores porque aparecia televisão, imprensa nacional e internacional, era uma competição muito valorizada e na época o grande idealizador da Taça São Paulo era o Fábio Lazari, um dos homens forte da Secretaria Municipal de Esportes e fazia essa competição com a melhor qualidade possível, uma pessoa que tinha o apoio da Prefeitura de São Paulo.

Xavier ?

Havia uma queixa dos clubes daqui e a imprensa daqui endossava, que o Matsubara dificultava a negociação dos jogadores para os clubes paranaenses, basicamente os da capital, e que facilitava, oferecia a venda para outros centros. Existia isso ou foi só coincidência?

Yamato ?

Não, não existia, o Matsubara nunca trabalhou dessa forma…

Xavier ?

(…) Mas você soube dessa queixa na época, por ter saído na imprensa.

Yamato ?

Saiu na imprensa sim, mas o Matsubara sempre tratou muito bem as pessoas, era de uma hospitalidade muito grande. Tanto não é verdade que emprestávamos jogadores ao Cascavel, para o Londrina, para as equipes em que se interessassem em nossos jogadores nós cedíamos. O Coritiba, o Atlético, o Pinheiros, que veio o Odair e vários jogadores. O Wellington e o Gilberto vieram para o Pinheiros, o Coritiba teve o Toninho Moura, Mário Sérgio, Djalma Braga…

Borba ?

Acho que não é o Matsubara que dava preferência para São Paulo. É que o pessoal daqui descobriu ou teve menos vontade do que o pessoal de fora, que via o Matsubara com muito mais presença do os daqui.

Yamato ?

Exatamente e outra coisa, uma explicação: antes as equipes da capital sempre contratavam jogadores de nome. Não investiam em garotos, não é verdade? A filosofia começou a mudar há uns quatro, cinco anos. A maioria das equipes da nossa capital só contratavam jogadores de nome, porque a exigência era muito grande, não tinham paciência para revelar, tanto é verdade que o Leomir teve pouco tempo dentro do Coritiba. O próprio Alex demorou muito para estar vivendo de futebol. Veio das categorias de base para depois ser valorizado. E assim era o Paraná, que tinha uma cobrança imediata, porque já era uma equipe formada, não tinham muita paciência. Depois de ter uma base é que colocamos alguns jogadores do juniores. Quem revelava um pouco mais e tinha ousadia era o Pinheiros. Tirando o Pinheiros, nem o Colorado, nem o Atlético e nem o Coritiba. Eles investiam em jogadores de nome aí as outras equipes vinham atrás. O Grêmio foi comprar o Nilmar, que era na época o melhor jogador brasileiro juvenil e foi revelação da Taça São Paulo, o Santos veio o comprar o Toninho Carlos, pagando um valor alto, porque ele foi a maior revelação da Taça São Paulo. A Portuguesa comprou o Djalma Bahia, que infelizmente faleceu, e era uma das grandes promessas pagando valores altos. Carlos Alberto Dias vendemos ao Japão, naquela época, por US$ 1,5 milhão. E ele era um moleque de 18 anos. Pro Londrina nós vendemos vários jogadores, pro Maringá cedemos vários jogadores, então não é verdadeiro essa história de que nós não vendíamos jogadores para as equipes da capital. O Ratinho, o Tico, o Jorge Luiz, vieram para cá, o Carlos Alberto, teve vários jogadores.

Cristian ?

Como é que surgiu essa idéia de ampliar seus horizontes?

Yamato ?

Por mais que a gente faça, que tenha conhecimento, a gente conhecia muita gente no Estado, no Brasil e no exterior porque nós fizemos várias excursões. Fomos ao Japão diversas vezes, fomos para Arábia, então fazíamos muita excursão. Eu tinha um conhecimento muito grande, mas isso daí não satisfazia porque sempre busco abrir os horizontes. Não nego para vocês que o meu objetivo é de um dia chegar à seleção brasileira. Não posso trabalhar de outra forma, então tive que sair de Cambará. Cambará é uma cidade em que estive a minha vida toda, saí da agricultura depois fui trabalhar, fui pra cidade e daí fui trabalhar com futebol. Eu gostava e o Matsubara abriu as portas e desenvolvemos todo o trabalho. Quero deixar bem claro que não foi só minha idéia, a gente não produz nada sozinho. Foi com a chegada do Bolão, que é uma grande pessoa e tinha um conhecimento amplo, porque a família Matsubara só ia em dia de jogo, não assistiam nem coletivo. Dia de jogo eles iam porque era a diversão deles e eles gostavam e por esse motivo saí do Matsubara e acabei indo para Maringá…

Borba ?

(…)Cambará não tinha nem cobertura da imprensa praticamente.

Yamato ?

Só tinha uma rádio em Cambará. A cobertura da imprensa que tinha, a imprensa achava que tinha. A novidade vinha de São Paulo, do Rio, liam muito a Placar. O pessoal da Rádio Clube na época acompanhava muito, o pessoal do jornal O Estado do Paraná. O Pedro Viana ia muito para lá, a Sônia Nassar ia sempre para lá, inclusive, tirando a equipe do Atlético, o segundo time da Sônia era o Matsubara. O falecido Pedro Viana também gostava muito. E assim tínhamos coberturas nacional e estadual e todos os dias o pessoal da imprensa cobria.

Cristian ?

Tem uma capa da Placar de 84, logo após o título do Santos, que dizia “a indústria de Pelés” e tem um menino do Matsubara que ele é a cara do Pelé e ele está com a camisa dez. Dá para você lembrar um pouco dessa história?

Yamato ?

Esse menino nós pegamos em Bauru…

Cristian ?

(…) Por sinal.

Yamato ?

Não tinha como dizer que ele seria tão parecido, a maneira de falar, a cara, o jeito de andar, de bater na bola, tinha qualidade, mas foi mais uma matéria porque não teve bola pra tudo isso. Era um guri de Bauru, até apelidamos de Pelezinho, ele esteve dois anos dentro do Matsubara, depois, infelizmente, teve que parar de jogar porque teve um problema de saúde e acabou não dando seqüência na carreira futebolística. Mas era um guri bastante parecido com o Pelé.

Cristian ?

E era atração.

Yamato ?

Era atração, vários membros da imprensa deram coberturas, colocaram-no em várias revistas e fizeram uma matéria bonita, mas infelizmente ele acabou não sendo um grande jogador.

Xavier ?

E Maringá como é que foi para você?

Yamato ?

É diferente. Você sai de um local em que não tem cobrança e você chega na cidade e já é cobrado, onde tem imprensa que cobra tanto quanto qualquer imprensa da capital e uma torcida fanática. Então você tem que responder para torcida. A minha vida sempre foi cheia de desafios, não tem nada fácil na minha vida, desde a infância. Sempre tive muita dificuldade, muito trabalho, mas sempre consegui, graças a Deus, sair da situação e desenvolver um bom trabalho. Sempre acreditei naquilo que eu planejo e dentro da minha filosofia que eu prego, sempre acreditei nisso e por isso me dei bem. E foi diferente. Em Maringá peguei duas diretorias, a do Odílio Balbinoti, que tinha sido afastado e era o presidente de direito e peguei o outro grupo, o grupo União cujo presidente era o César Valebom e mais nove membros que entraram para dar apoio, na época tinha saído o Lori Sandri e toda comissão técnica do Maringá, que não estava fazendo uma boa campanha. A pressão foi tão grande que acabaram dispensando toda comissão técnica. Aí, quando me convidaram, fui para esse desafio. Vi que havia jogadores que falaram que era do Odílio e jogadores do grupo União. E precisávamos sair do rebaixamento. Aí você duas maneiras de sair dessa situação. Primeiro, tinha 58 jogadores na época e tinha que dispensar. Os dois grupos contrataram, mas apenas quantidade e não qualidade. Tinha que contratar um treinador. Antigamente existia muito disso, o chamado treinador de período curto e que tirava da situação difícil e nós chamávamos de “tiro curto”. E na época contratamos o Lopes Zafaroti que era meio maluco, com todo o respeito, gosto muito dele, é um grande profissional, mas ele tem aquele lado sargentão dele, uma vez que ele era militar, e falava: “a única solução é trazermos o Valter, fui eu quem sugeriu isso, e o Valter trouxe a comissão, preparador físico e saímos de uma situação em que estávamos para ser rebaixados e quase nos classificamos para a semifinal. No final da temporada de 88, tivemos que se desfazer porque a maioria terminava o contrato e o Grêmio não tinha dinheiro para comprar e aí partimos para renovação em que conheci bastante jogadores do interior de São Paulo, na época estava assumindo o presidente Geovani Marion, que era o dono da IMR, e ele falou para ir atrás de jogadores para ver se conseguia montar uma nova equipe. Fomos para o interior de São Paulo, contratamos uns cinco ou seis jogadores, já tinham contratado comissão técnica, contratou o Paquito que estava no Pinheiros, acabei levando o Paquito, e na época o Paulo Comeli era preparador físico e estava parado e levei-o para Maringá e fizemos um grande trabalho, uma grande equipe, inclusive o Paquito ficou muito assustado porque quando chegou só tinha homens de branco, a maioria dos diretores eram médicos e na apresentação só tinha médico e quatro jogadores. O Paquito disse: “eu vim treinar uma equipe de médicos?” (risos). Falei para ele ficar tranqüilo que nós conseguiríamos montar uma equipe. Aí conseguimos, contratamos, pé no chão, fizemos avaliação de juniores que estavam em Maringá, aproveitamos na época o Ronaldo, o Luís Carlos e demais jogadores, fui atrás de alguns jogadores, fui atrás do Adoílson, que estava no XV de Piracicaba, conhecia muito o Adoílson, contratamos ele e mais alguns jogadores, iniciamos bem, dando moral para a molecada que estava no Grêmio e fomos campeão do Torneio Início, no Pinheirão, em 88, aí iniciamos o campeonato, fomos bem no primeiro turno, depois o Paquito acabou saindo e veio o Mário Juliato, o Devanir teve que se afastar por conta de um problema na empresa dele e entrou o Valdomiro Meger que foi indicado pelo prefeito na época, o Ricardo Barros, e o Meger era um pessoa muito simples, apesar de ter um poder aquisitivo muito grande, mas simples, não sabia nada de futebol, e depois o próprio Grêmio se sentiu aliviado porque a pessoa de um poder aquisitivo bom, tinha crédito em Maringá, acabou fazendo várias promoções, arrecadou um bom dinheiro para o Grêmio, contratando bons jogadores e aí foi a minha salvação porque eu viajava de carro ou de ônibus e passei a viajar de avião só para fazer o serviço, ele tinha três aviões, e ele deixou a disposição e não deixava nem viajar de ônibus…

Xavier ?

Você podia escolher o avião (risos)

Yamato ?

Exatamente, ia para Goiânia, interior de Goiás, interior de São Paulo, e íamos assistir jogos e contratávamos.

Cristian ?

Passou a ser de um jeito meio mambembe à uma estrutura parecida com o do Matsubara.

Yamato ?

Exatamente, aí a primeira tomada de decisão foi quando eu falava que ia buscar o João Antônio. Todos duvidaram e falavam: “Você vai conseguir tirar o João Antônio do Grêmio?”. Disse: “vou, e vou trazê-lo por empréstimo e sem pagar nada”. Eles duvidaram e eu chamei para vir comigo. Foi designado para ir comigo o vice-presidente, que era o Carlos Taborda, fomos para Porto Alegre, conversamos e consegui trazer o João Antônio de graça, por empréstimo…

Xavier ?

(…) Ele tinha sido da seleção brasileira, campeão do mundo em 85.

Yamato ?

Exatamente, aí depois o Mário Juliato acabou indicando o Aírton, o volante que era do Inter, que era um grande jogador, veio o Helinho, da Ferroviária de Araraquara, só bons jogadores. Fizemos uma grande campanha, inclusive fomos campeões do segundo turno e classificamos entre os quatro, sendo eliminados pelo Atlético. Ganhamos o primeiro jogo em Maringá e depois, no segundo jogo, infelizmente, com a ajuda do Ivo Tadeu Scátola, não posso negar isso, porque realmente isso foi verdadeiro, com um escanteio que não entrou ele deu o gol e desclassificou o nosso time.

Xavier ?

A bola não entrou, é isso?

Yamato ?

Isso, não sei se você lembra, foi no Pinheirão…

Cristian ?

Tem alguma coisa a ver com o Wilson na história.

Yamato ?

Sim, aí foi o escanteio e a bola não entrou. Também não posso culpar só o Ivo porque o bandeirinha teria que assinalar.

Cristian ?

Foi só ali ou você sentiu tendência na arbitragem no jogo inteiro?

Yamato ?

É muito difícil o interior ganhar, não é fácil. Éramos uma grande equipe e infelizmente fomos prejudicados pela arbitragem, mas depois em 90 fomos campeões do primeiro turno e no segundo turno, na metade dele, acabei saindo de Maringá e vim para o Paraná.

Xavier ?

Você saiu pra vir para o Paraná ou saiu primeiro?

Yamato ?

Eu saí para vir para o Paraná. O Paraná já tinha me procurado antes, mas acabei não acertando. Em 90, quando já tinha o Minelli, que me conhecia desde os tempos do Matsubara, ele acabou me dando força. Tinha o Carlinhos Neves, que trabalhou comigo em Maringá, era a comissão técnica que queria, que tinham falado na época para o Ocimar, para o Aramis Tissot, Joaquim Cirino, que era o vice-presidente. Eles indicaram o meu nome, o Paraná foi conversar comigo em Maringá, acabamos não acertando a base financeira e no final do ano, no segundo contato, acertamos e vim para Curitiba no dia 16 de dezembro de 90, quando já tivemos a primeira reunião entre a comissão e a diretoria e já fizemos planejamento para 91, da dispensa, contratação, local para pré-temporada e, depois de ajustada essa situação, inclusive locamos o Papa João XXIII, que era a estância que hoje é o CT do Atlético, fizemos a pré-temporada lá e comecei a desenvolver um novo trabalho dentro do Paraná Clube.

Borba ?

Essa tua busca de progredir, de sair, de ser reconhecido, tudo isso acontece muitas vezes nos bastidores. Como é que você, na sua função, num clube grande como o Coritiba, sente o sucesso do Bonamigo, do preparador-físico, do auxiliar-técnico, jogadores, e ninguém fala no Yamato Yamato. Como é que fica essa situação?

Yamato –

Eu sou uma pessoa que faz futebol e não faz política. Toco futebol, não ligo para mídia. Não que eu não respeite, pelo contrário, é que é a minha maneira de ser, eu gosto de administrar e conduzir futebol. Não gosto de aparecer na mídia. Agora, tenho que dizer que as coisas se desenvolvem não só pelo Yamato Yamato. Se for planejamento nosso, a gente discute, é uma comissão. Por que eu te digo que faz sucesso? Porque a gente dá uma abertura e sempre tem respeito profissional que a comissão tem por mim também, dá uma abertura. Temos um diálogo bom, aberto, entre comissão técnica, diretoria, isso é o sucesso. Ninguém faz sucesso sozinho. Eu não gosto de aparecer e estou para prestar serviço ao Coritiba, quero que tudo vá bem, quero que os atletas e a comissão técnica estejam bem.

Borba ?

O treinador resolve os problemas de ordem tática na hora do jogo. O preparador-físico se encarrega do preparo físico. O trabalho que você faz encobre o preparador-físico, o auxiliar-técnico, o treinador, o diretor de futebol e os próprios jogadores e isso é um trabalho surdo que ninguém vê e que tem uma representatividade muito grande mas não tem a repercussão de falarem o seu nome.

Yamato ?

Mas é o meu jeito de ser, você já trabalhou comigo e sabe como sou. A partir do momento em que você aprende a trabalhar profissionalmente, tende a entender a situação. Tive uma felicidade muito de grande de trabalhar com grandes treinadores na minha vida, só trabalhei com grandes profissionais desde o início, haja vista que os meus grandes professores foram o Geraldo Roncatto, o Luís Carlos de Oliveira, o Juninho, que agora parou, mas era muito bom, o falecido Armando Renganeschii, professor de todos os treinadores, Carlos Benevenito Froner, também um grande treinador, Norberto Lopes, com Borba Filho, Mário Juliato, Otacílio Gonçalves, Lazaroni, Antônio Lopes, Vanderlei Luxemburgo, quer uma escola melhor do que essa? Então a gente acaba tendo respeito profissional e a minha maneira de ser facilita bastante, porque às vezes a gente faz uma colocação e o treinador e a comissão respeitam. Se estiver certo eles vão falar “você está certo” e se estiver errado vão dizer “olha não é assim…” Então tudo é válido e acaba sendo uma tarefa muito difícil pra se fazer que haja uma homogeneidade e adverte que requer um trabalho intensivo em cima disso, em que nós somos muitos solicitados, mas o reconhecimento da comissão, o respeito está dentro do seu conhecimento.

Borba ?

Mas se você puder escolher entre a falta de craque e a falta de dinheiro, o que você ficava?

Yamato ?

Eu prefiro a falta de craque, porque você começa a produzir, começa a lapidar e com certeza já começa a dar retorno ao clube dentro dos serviços prestados.

Xavier ?

Aproveitando a deixa do Borba, você já teve que “dar nó em pingo d?água” por falta de dinheiro?

Yamato ?

Já, não é de longe, no próprio Paraná Clube passei por isso. O Paraná sempre teve uma visão de um clube rico, isso em 90, 91, 92, 93, 94, 95, 96 já começando 97, com muita dificuldade, inclusive com salários atrasados. O Paraná em 97 passou por muitas dificuldades, enfrentamos greve, inclusive em Bandeirantes, que o Hamilton Stival, que era o vice-presidente de futebol, e na hora em que cheguei na concentração, o Hamilton me chamou e disse que estava tendo um problema e que os jogadores estavam querendo entrar em greve e a gente jogaria à noite. Falei para deixar comigo e fui conversar com os jogadores, então a gente tinha crédito para isso. O salário estava atrasado. Só que os jogadores estavam mal acostumados, porque recebiam em dia, coisa rara no futebol, e aquilo ali eles passaram por desespero. Não houve a questão da maldade dos atletas, era questão de orientação, de confiança, eles precisavam de uma pessoa de crédito que pudesse falar para eles. Nos reunimos e disse que levaria ao presidente Ernani Buchmann e “com certeza essa semana ele se reunirá com vocês e passar um posição. Nós somos profissionais, temos que produzir, temos um compromisso muito difícil e gostaria que isso acabasse por aqui”. Como os jogadores gostavam muito de mim, eles acataram, tivemos uma reunião, resolvemos a situação, mas foi um campeonato muito difícil, inclusive para conseguirmos algum retorno financeiro.

Xavier ?

Será que o Paraná chegou a esse ponto por conseqüência daquele deslumbramento em 95 com o Vanderlei Luxemburgo e aqueles jogadores que ganhavam acima da média do futebol paranaense ou não?

Yamato ?

Não, isso posso dizer tranqüilamente para vocês que não, porque quando você quer se projetar internacionalmente você tem que pensar grande…

Cristian ?

(…) Essa era a idéia do Paraná Clube?

Yamato ?

Admito que não temos que pensar pequeno em nossa vida. Pode até não conseguir, mas dentro das nossas condições se a oportunidade surgir você tem que tentar. Acontece que vocês estão falando muito de valores do Luxemburgo e não é nada disso, aquele valor absurdo. Acontece que o Paraná teve um patrocinador, o qual não quero divulgar, e criou-se uma equipe para que angariassem fundos. Isso foi inteligência do Ocimar na época, que era o “Paraná Campeão” e que tudo era destinado para o investimento do treinador e na divulgação do Paraná Clube, tanto nacional quanto internacionalmente. Isso que tinha um patrocinador na época. E também não era esse valor divulgado. Outra coisa: o Paraná não teve prejuízo com o Luxemburgo, pelo contrário, teve benefícios. Quando veio o Palmeiras atrás do Luxemburgo, eles tiveram que indenizar o Paraná, inclusive cedendo alguns jogadores.

Cristian ?

Fala-se muito nisso, de que o que foi feito em 95 afundou o clube até hoje.

Yamato ?

O Paraná não teve prejuízo. Eu não participava diretamente da parte financeira do Paraná, eu trabalhava com futebol. Mas no futebol, tem que ter uma visão muito grande em cima disso, porque nós administrávamos conjuntamente e toda a decisão de uma contratação também. Eram tratadas com a diretoria, gerência de futebol, que era comigo, diretor de futebol e presidente e vice. Digo isso porque tinha conselho normativo, toda decisão era tratada com todos.

Xavier ?

Por que chegou a esse ponto que você contou de quase ter chegado a uma greve de jogadores em 97?

Yamato ?

Acho que foi a arrecadação do Paraná que acabou caindo um pouco e as conquistas também. O Paraná teve grandes conquistas desde 91. Em 92 foi campeão brasileiro, 93, 94, 95, 96 e 97 foi campeão paranaense. Em 97 o Paraná não vendeu jogadores. Saíram poucos. Então foi por esse motivo, a receita do Paraná foi abaixo do esperado.

Cristian ?

Muito se fala que o Paraná foi fundando no final de 89 com projeção de alguns anos até se conquistar alguma coisa. Essa antecipação das conquistas acabou tendo o seu preço?

Yamato ?

Não, porque a exigência era grande. Quando cheguei no clube, o Paraná não era tão tranqüilo assim, porque a gente tinha a disputa do vermelho e do azul. Tudo o que fazia tinha problema de cor. Não podia usar o uniforme todo azul que vinham pessoas reclamar, não podia usar todo vermelho que reclamavam. Então o que tinha era um habilidade muito grande por meio do presidente na época, o Aramis Tissot, depois o Darci Pianna, o Ocimar, então foram diretores que estavam acostumados e sabiam conduzir. Não era qualquer conversa que deixava se envolver dentro do futebol para que se prejudicasse o desenvolvimento do trabalho e principalmente na Vila Capanema.

Cristian ?

O Paraná te deu condições de pensar um pouco e montar uma estrutura de futebol?

Yamato ?

Deu, por isso que consegui. O Aramis, não sei se vocês sabem (o Irapitan sabe, porque ele cobre o Paraná até hoje, um coxa-branca que virou paranista) (risos)… Tivemos muito apoio, o Aramis inclusive viajou muitas vezes comigo, na época que buscaram o João Antônio, o Balu, era mais ousado. Fomos buscar o Ronaldo Luiz do América e um meia que era um dos grandes jogadores da equipe, juntamente com o Ronaldo Luiz, não me lembro quem era, mas saímos para contratar grandes jogadores…

Cristian ?

(…) Era o Palhinha.

Yamato ?

Isso, depois trouxemos o Saulo, o Balu, entre outros jogadores, todos eles de nome. Quando fomos comprar o João Antônio, ninguém acreditava. Eu e o Aramis fomos para lá. O Grêmio quis dar uma esnobada e o Aramis naquela maneira de ser de que “pra cima de mim ninguém vai crescer”, acabou comprando o jogador (risos). O Aramis tinha uma decisão firme, não voltava atrás e a felicidade do Paraná de ter conquistado antecipado esse projeto, planejamento do Paraná em termos de divulgação e em termos de clube, acho que não atrapalhou em nada. O sucesso no Paraná foi porque teve uma grande diretoria, todos pensavam grande. Não tinham o problema da vaidade. Era uma equipe de diretoria, uma de comissão técnica, de trabalho e de jogadores. Isso fez com que o Paraná crescesse bastante e crescesse na mídia e nas conquistas. O Paraná parou no tempo em uma outra situação. Acho que tinha que ter aproveitado o momento, isso eu falava e cobrava muito da direção, era o CT, que nós demos a primeira idéia onde hoje está um Supermercado (Big)…

Xavier ?

Onde era o Britânia

Yamato ?

Exatamente e depois demos a idéia de fazer em Quatro Barras e parece que agora eles estão iniciando, mas o Paraná parou no tempo nisso e também na situação do estádio. Foi o grande erro do Paraná, tinham que ter definido o estádio. Quer seja a Vila Capanema ou a Vila Olímpica, a torcida já teria aceito, teriam que ter optado por um deles e ter investido para não ter parado no tempo. O Paraná teve uma base forte e foi conquistador e foi onde muita gente coloca “porque antecipou e por isso passa dificuldade”. Se tivesse formado grandes jogadores, hoje estariam vendendo e estariam tranqüilos.

Cristian ?

Como era a relação com a torcida do Paraná? Chegou algum momento daquela turma do amendoim ali na Vila Capanema ir pra cima de você, reclamar alguma coisa?

Yamato ?

Reclamavam todos os dias (risos). Não era tranqüilo no Paraná, havia muita cobrança. A torcida sempre cobrou, não é diferente das demais, todos cobram, mas isso é bom porque é por meio da cobrança que a gente procura sempre resolver e sair das dificuldades. Se ficarmos de braços cruzados evidentemente não vamos solucionar nada. Às vezes tem muito torcedor que cobra porque confia na gente. Os que não confiam, xingam. Mas tem uns que cobram porque o clube é uma paixão para eles então isso daí é normal e no Paraná não haveria de ser diferente.

Irapitan Costa ?

No Paraná você teve momentos difíceis e a gente sabe que foram muitos e em algumas situações a sua interferência direta fez com que a crise não ganhasse proporções maiores. A gente sabe de salários atrasados que de repente a situação era contornada na base do diálogo e da camaradagem. Como é que você cativava esses jogadores?

Yamato ?

Parecia ser tão fácil, mas não era. Na verdade, havia grupos divididos, mas quando chegava em dia de jogo a gente esquecia tudo isso, fazia com que eles pudessem esquecer as divergências durante a semana e a gente conduzia muito bem. Esse era o crédito que a gente tinha. Parte financeira a gente conduzia e tentava solucionar da melhor maneira possível. Eram os dirigentes que tinham que ter tranqüilidade de correr atrás e de conseguir verbas para salvar os jogadores. A gente conduzia isso e deixava os dirigentes bastante tranqüilos e não ficava levando os problemas. Nós tínhamos um crédito com eles. Não deixava que as picuinhas chegassem na nossa diretoria e tudo a gente resolvia internamente.

Irapitan

? O crédito que você diz, é que por mais que o salário fosse atrasar eles tinham a confiança que com você lá a coisa iria sair?

Yamato

? Eles confiavam bastante, sim. É verdade que muitas vezes nos reunimos e a gente empenhava a palavra, colocava a situação da diretoria e segurava o que estava acontecendo, para que a diretoria conseguisse a verba e pagasse o que estava devendo, saldando a dívida com a gente.

Xavier

? Há quem defenda que um churrasco vai fazer bem aos jogadores e que não vai interferir no resultado. Qual é a sua opinião sobre isso?

Yamato

? Depende do caso. Não vou dizer que sempre esses churrascos são benéficos. Não posso dizer que isso venha trazer benefícios. Geralmente a gente faz, sim, mas quando está com um ambiente bom. Acho que esse negócio de fazer churrasco para aproximar os jogadores, para melhorar o ambiente não existe. O ambiente já tem que estar harmonioso. Você tem que fazer um trabalho para aproximar os jogadores. Tem que se conversar entre a diretoria técnica, ver o que está acontecendo, qual é a avaliação física do atleta. E, num churrasco, muitas vezes você exagera, tanto na comida, como na bebida. E se o atleta não estiver bem fisicamente? Como fica o trabalho em cima do jogador? Quando a equipe está bem, descontraída e vem bem durante a semana, é ótimo fazer um churrasco.

Cristian

? Como foi aquela campanha que culminou com a conquista do título da segunda divisão, em 1992?

Yamato

? Era um time que o treinador tinha um mérito muito grande. Era uma equipe vencedora e que impunha respeito aos adversários. Era uma divisão que tinha muitas equipes fortes, como Grêmio e grandes equipes do futebol brasileiro, e o Otacílio sabia muito bem comandar o time. E era um time muito bem preparado. O Paraná teve na época uma felicidade muito grande, de conseguir manter no período de 91 a 97, uma comissão técnica muito boa dentro e fora do campo e que tinha uma união muito grande. E os jogadores eram vencedores. Chegaram no time para serem campeões. Haja visto, que naquele ano nós tivemos quatro quadrangulares, porque o interesse era para o Grêmio voltar, mas eles sempre perdiam, até que não teve mais jeito. Fomos decidir com o Vitória, estádio lotado em Salvador. Mas para aquele time não tinha preocupação com a torcida. Quer dizer, fica fácil quando você tem uma formação boa. Na época era o Luiz Henrique, Balu, Gralak, Servilho e Ednélson; João Antônio ou Roberto Alves, Marquinhos Ferreira, Adoílson, Serginho, Saulo, Maurílio – e ainda entrava o Carlinhos. Era uma equipe que não mudava, o Otacílio sabia conduzir o time sem inventar muito e passava confiança para os jogadores.

Xavier

? O Otacílio não era um cara de muita ação durante a semana, ele pensava no jogo em si?

Yamato

? Sei que você tem uma grande amizade com o Otacílio e que tem um respeito por ele. Acontece que o Otacílio não gosta de aparecer muito. Aparece porque ele está no comando de um time e daí não tem jeito. Mas é um treinador que cobra muito dos jogadores. Não precisa gritar para falar sobre alguma coisa. O Otacílio vai na conversa e os jogadores entendem. É um trabalho que muitos imaginam que é pequeno, mas de uma qualidade enorme. Então para quem aplica uma grande qualidade no trabalho, não precisa de muito trabalho.

Irapitan

? Porque ele está fora dos grandes centros e hoje até fora do mercado?

Yamato

? Porque muitos têm essa visão de que ele não trabalha muito. Acredito que seja isso. Porque como pessoa e como profissional, jamais alguém poderia dizer algo dele. O Otacílio fazia o trabalho tático e o Carlinhos Neves fazia o trabalho com bola, era uma bela dupla. E se você deixar o Otacílio trabalhar por um tempo vai perceber que ele monta um estilo, um padrão de jogo. Mas as pessoas acham que ele está desatualizado do futebol atual. Acredito que ele tem qualidade.

Cristian

? Sair do Matsubara, de Cambará e ir para o Maringá é uma situação diferente. E, sair do Maringá para o Paraná Clube é ainda maior. E sair do tricolor para o Coritiba? Como foi isso?

Yamato

? Saí do Paraná em 99. Antes fiz um trabalho junto com o Zequinha, para recuperar os jogadores que haviam saído das divisões de base do time, como, por exemplo o Hílton, que tinha saído do time e depois voltou. Me desliguei do clube em novembro de 99. E iria dar um tempo com o futebol, porque estava realmente muito cansado. Comecei a fazer um trabalho de observação, que era uma solicitação de um pessoal do Japão. Nem bem iniciei, o Sérgio Prosdócimo, que até então tinha feito o convite para o Valmir (Gomes) ir para o Coritiba dar uma mão na administração, me chamou. O Valmir disse que não podia, mas que conhecia alguém bem capacitado e me indicou para o Prosdócimo. O Sérgio fez o convite, pedi para pensar, e depois ele novamente insistiu, marcou um almoço, e no fim acabei aceitando o convite dele em junho de 2000. Nos trinta primeiros dias de trabalho fiquei analisando os procedimentos, os prós e contras e fiz um relatório para a diretoria do clube. Montei um organograma funcional de trabalho, porque ninguém sabia o que fazer no Coritiba, tinha muita gente. O Coritiba tinha uma mentalidade de contratar jogadores e não investir na formação de base. Tanto é verdade que quando cheguei no Coritiba era difícil. Pode perguntar para o Kruger e o pessoal das categorias de base, que hoje é gratificante para eles ter o apoio. Acabei integrando o departamento profissional com o amador e teve muita gente que discordou de mim, que inclusive saiu do clube acreditando que não iria dar certo. Com a saída do Sérgio Prosdócimo, o Francisco Araújo, presidente, me manteve no cargo e quando entrou o Giovani Gionédis, eu estava saindo do clube porque havia sido dispensado, mas a direção que estava entrando não sabia da minha situação. O Giovani e o Moro me chamaram para conversar e ficaram sabendo do que tinha acontecido e me convenceram a ficar no clube. Tive o apoio dos dois, o projeto continuou e hoje está aí o resultado, colhendo os frutos de grandes revelações. Estou contente com o resultado e com o apoio que tive. Sem o apoio da diretoria não tinha como realizar nenhum trabalho.

Flávio Laginski

? Como é trabalhar em um clube com uma torcida maior e mais exigente?

Yamato

? Qualquer torcida é exigente. Não posso reclamar da torcida do Paraná, porque sempre me respeitaram e quando me encontram, sempre conversam comigo. A torcida do Coritiba hoje já está sendo mais compreensível, porque acredita no planejamento do clube. Eles dão apoio, cobram, vaiam, eles têm que cobrar, mas nada muito agressivo. Não fico triste se o time for mal e tiver uma cobrança. É normal. A cobrança sempre vai existir. Agora isso nos faz querer crescer mais. É estimulante. E toda a diretoria se esforça pelo time. E quando se tem a gratidão da torcida, não há o que pague isso.

Irapitan

? Você contou que chegou a ser dispensado no Coritiba, foi deixado de lado no Paraná. Esses percalços dentro da sua carreira se devem à sua personalidade de não gostar de aparecer muito?

Yamato

? Eu não apareço, mas isso não me deixa chateado, porque isso me dá mais coragem para que possa enfrentar as situações difíceis. Como na minha vida sempre tive percalços, não será uma coisa a mais ou outra a menos que vai fazer diferença. Ou seja, convivendo comigo, você vê que até algumas vezes fui até apedrejado. Eu tenho uma personalidade, tenho coragem, e não vou me entregar. Agora, não aparecer na mídia, realmente não tem importância. Não gosto de ficar aparecendo, quero fazer o meu trabalho, de conduzir as coisas com o maior profissionalismo possível. Não misturo amizade com trabalho. Jamais vou fazer isso. Não é porque você é o meu melhor amigo, que às vezes está dentro do Coritiba, que vou confundir as coisas e fazer o meu trabalho de outra maneira. Tenho a minha maneira de pensar, de conduzir o meu trabalho. E, às vezes a minha maneira de conduzir as coisas atinge algumas pessoas. Mas não posso ficar preocupado com essa situação. A partir do momento em que me preocupar com as cobranças, vou estar deixando de ser o Yamato, vou ser uma pessoa diferente, que se deixa levar por outros.

Irapitan

? Você conviveu com todo o período de conquistas do Paraná até 97, e de repente, foi deixado de lado. E houve a contratação de outro profissional, para uma outra área, e que foi muito bem remunerado. O que aconteceu naquela ocasião? O Antônio Carlos Moreno (ex-levantador da seleção de vôlei) veio para o Paraná ganhando mais do que você ganhava para executar aquela função. Era um profissional de outro esporte. E até onde nós sabemos, recebeu cheque em branco para contratar quem quisesse, da maneira que quisesse, e você simplesmente saiu. A diretoria te explicou o que estava acontecendo, nessa alteração do departamento de futebol?

Yamato

? Muitos não sabem disso, mas antes do Dilso Rossi assumir a presidência do Paraná Clube, no final de 97, ele ligou pra mim e marcou um almoço. Durante o almoço nós conversamos, e ele me pediu pra dizer como era a posição do grupo, como estava a situação do clube. E logo em seguida perguntei se ele queria salvar o Paraná em termos financeiros ou para conquistar títulos. Ele já sabia da situação que não estava nada boa, então falou que tinha chegado para salvar o Paraná. Se ele fosse depender das cobranças de título, ele teria que gastar muito, porque havia sido descoberto que muito dos jogadores de talento haviam feito um acerto para pegar o passe deles no final daquele ano. Muitos jogadores fizeram o acordo de ficar no clube até o final de 97 e depois pegariam o passe. O presidente que assumisse iria encontrar dificuldades e na verdade realmente teve. Iria pegar uma equipe praticamente desmontada, uma equipe nova, sem muita experiência. Então como poderiam ter dado o passe para os jogadores de qualidade, como o Régis, o Edinho Baiano, que teriam com certeza mais dois ou três anos de produtividade no time? Não dá para desperdiçar essas oportunidades. Deixei essa situação bem clara para o Dilso. Falei que ele teria muita dificuldade, mas se fosse para conquistar títulos estava tudo bem, que ele precisaria de um projeto, uma reformulação, um planejamento para desenvolver um trabalho e poder buscar novos talentos e também criar a prata da casa. Ele concordou e queria uma garantia de que eu permaneceria no Paraná. Disse que não era nem por questão financeira. Falei que estava no clube porque realmente gostava de trabalhar lá e então garanti que ficaria na equipe. Daí o Dilso se candidatou à presidência, ganhou e realmente passamos pelas dificuldades que já estávamos esperando. Quase fomos rebaixados no primeiro ano. Mas passamos por momentos difíceis e os jogadores que vieram não deram certo. Em 99 iniciamos um novo trabalho e nesse período não sei se houve uma cobrança muito grande, mas o Dilso não quis me contar. Ele chegou no final de 98 e me falou da enorme pressão e que o Paraná estava na minha pasta. Não entendi a colocação e ele me explicou que era o sistema que estava sendo adotado no clube, aplicado por mim. Podiam me contestar naquele momento, mas até então eu havia ganhado quase tudo. Se até aquele momento era um conquistador e tinha a aprovação da diretoria e do conselho normativo. E nada é realizado sem um consentimento da diretoria e do conselho. E por isso que digo que o Paraná já foi grande, porque tinha esse pensamento. Mas não vou ficar questionando ou ficar magoado sobre aquele momento. Sempre fui amigo do Dilso, ele gosta muito de mim, e vice-versa, mas acontece que ele foi muito sincero. Ele chegou pra mim e explicou o que estava acontecendo, mas eu não concordei, disse que não era verdade, mas disse que não atrapalharia o Paraná caso eles quisessem mudar de planejamento. E deixei bem claro que o clube não estava dentro da minha pasta. Ele estava dentro do meu planejamento e da minha filosofia de trabalho, e disso não abriria mão. Se estavam pensando um pouco diferente no Paraná, poderia haver alguns questionamentos sobre o planejamento usado, alguma coisa que faltava ser explicada ou corrigida. Mas se o pensamento fosse completamente diferente, eu deixaria o time. E foi isso que aconteceu. Não queria ficar no clube se fosse para trabalhar em outro setor. Mas o Dilso insistiu pra que eu ficasse e me colocou no desenvolvimento de futebol. Nessa época eles contrataram o Moreno. E essa contratação foi feita quando o Dilso estava de viagem na China. O Ênio Ribeiro tinha assumido. E o Moreno chegou apresentando novos projetos e, ao meu ver, que não tinham nada a acrescentar ao futebol. Na prática, o projeto não iria render resultados. Mas por uma questão de ética, não estava mais no meu departamento, não falei nada que degradasse o planejamento que estava sendo feito. Deram carta branca para o Moreno, o Dilso estava viajando, vários jogadores foram contratados, mas os resultados não apareceram. E, mais tarde, o Moreno saiu, voltou o Aramis e deu uma mão pra mim. Apesar das grande dificuldades que iríamos passar, concordei em realizar o trabalho. E o Aramis é uma pessoa especial, tenho um carinho grande por ele, como pessoa, como profissional. Conseguimos passar pelas dificuldades, na época o técnico era o Márcio Araújo, não fomos rebaixados, e acabei deixando o clube em novembro. Não vou dizer que houve mágoa, mas foi uma colocação que nem eu mesmo sei explicar o porquê da minha saída. Talvez se vocês perguntassem a algum dirigente eles possam dizer. Acho que não tem nada a ver, todo funcionário, se ele não estiver mais satisfeito com o lugar, tem o direito de trocar de trabalho. E por uma questão de ética não questiono nada, depois nunca mais apareci no Paraná Clube, não que não goste mais do clube, mas porque sou um profissional. Hoje defendo o Coritiba. E não tenho encontrado os amigos que tinha, mas futebol não se mistura com amizade.

Cristian

? Em algum momento nesses últimos três anos, você pensou em sair do Coritiba?

Yamato

? Não pensei. Não tem porque ficar pensando em sair do Coritiba, a não ser que queira realmente sair.

Cristian

? E você nunca quis sair do futebol?

Yamato

? Da minha parte não. Se alguém, alguma vez fez uma colocação em relação a isso, é mentira. O que as pessoas estão confundindo é uma questão de ética no trabalho. Isso eu sempre respeitei e preservei. Sempre converso com os dirigentes e presidentes para saber se querem o meu trabalho e se está tudo certo. Tem gente que fica de braço cruzado, e não toma uma iniciativa. E, realmente o (Carlos) Zanetti deve ter confundido um pouco na época. Fui contratado pelo Sérgio Prosdócimo e dei continuidade ao meu trabalho com o Francisco Araújo. O Zanetti entrou como superintendente e tomava todas as decisões do clube. Quando chegou na entrada do Giovani Gionédis, não falei nada, deixei eles decidirem. Sou um profissional, a nova diretoria é que toma as decisões e tem a liberdade de contratar quem quiser. Então, na época, por uma questão de ética, cumpri o contrato que vencia no dia 31 de dezembro e enviei um ofício ao setor administrativo, ao presidente Francisco Araújo, dizendo que o contrato estaria vencido em dezembro e que eles teriam total liberdade de tomar qualquer decisão. E todas as decisões, no caso da nova presidência, estavam sendo tomadas antes de dezembro. E, nessa fase de transição você tem que deixar a cargo da diretoria. Daí o Zanetti me chamou, disse que tinha viajado com o Giovani até o Rio de Janeiro e que o presidente havia falado que ele permaneceria no clube e que eu estava dispensado. Bom, concordei normalmente, mas não tinha entendido no momento. Agradeci a oportunidade e estava me preparando para sair, quando encontrei com o Moro e com o Giovani no corredor e ele me explicou a situação. Era para o Zanetti sair e não eu. Fiquei surpreso, mas continuei no clube. Foi assim que aconteceu e ainda bem que deu certo o nosso planejamento. Não tive interesse em sair do time. Tive convite para deixar o clube. Assim como quando estava no Paraná e também recebi propostas dos times de São Paulo, agora, no meio do ano, tive convites de dois grandes clubes paulistas. Mas quando me comprometo com a diretoria não penso no lado financeiro. A parte financeira ajuda muito, mas não é tudo na vida. O que manda é a dignidade das pessoas. Então me comprometi com essa direção e vou permanecer no clube até quando eles me quiserem.

Xavier

? Como você vê hoje a administração do futebol brasileiro e, em especial, a seleção brasileira?

Yamato

? Tenho grandes amigos dentro da seleção brasileira. Tive contato com o Antônio Lopes, com o Américo Faria e acho que alguns erros não se limitam somente aos profissionais. Parte da entidade deveria dar mais créditos aos outros centros, fora do eixo Rio-São Paulo, dando mais oportunidades a outros profissionais. Jogadores de vários lugares deveriam ter uma chance. É difícil responder isso se você não tem uma convivência direta na entidade. Criticar quem? Por quê? Então a própria CBF deveria abrir espaço para os outros Estados.

Xavier

? Para você um dia chegar na CBF, teria que estar no Rio ou em São Paulo?

Yamato

? Nós estamos falando de competência, de oportunidades. Não estou criticando nenhuma entidade, porque acho que eles estão realizando um bom trabalho, mas ainda falta espaço para os profissionais. Um exemplo é o Luís Carlos Neves. Ele teve seu espaço porque foi buscar. Ele tinha competência aqui, mas se não fosse buscar trabalho em São Paulo e no Rio talvez não teria tido chance. Alguns profissionais vão direto para o Rio para estar perto da seleção brasileira. Acho até certo, todo profissional tem que almejar a seleção. Mas sem dúvida no eixo Rio-São Paulo, as dificuldades são menores. E queiram ou não, lá eles trabalham mais forte, a mídia é mais forte

Cristian

? Como é a relação do clube com o empresário? Tem muita gente que diz que o mau do futebol brasileiro são o empresário e o procurador.

Yamato

– Essa colocação às vezes é generalizada. Em todo campo de trabalho, tem bons e maus profissionais e entre os empresários não é diferente. Tem aquele que possui uma boa formação e vai conversar como um homem de negócios e

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