Ano mais ou menos

Adilson Luiz Gonçalves

Todo final de ano é comum planejarmos o ano seguinte. Por mais pragmáticos que sejamos, há sempre um quê de abstração, como se o ano novo fosse uma nuvem, na qual tentássemos imaginar ou adivinhar formas. Mas a astronomia e a complexa mecânica celeste decretam que a Terra está somente completando mais uma órbita em torno do Sol, como já vem fazendo há milhões e milhões de anos. Magnetismo, inércia e vácuo!

Para nós, passageiros dessa "nave", um ano é muito tempo. Para o universo, no entanto, não passa de um grão de areia, como cada um de nós também o é! Mas isso não implica em dizer ou pensar que o universo é um grande deserto. Essa areia flui na incomensurável ampulheta, que conta os dias desde o início dos tempos. Talvez por isso toda passagem de ano, qualquer que seja o calendário utilizado, é um rito de transição significativo, um momento de reflexão e esperança.

O que esperar de 2005, então? "Muito dinheiro no bolso; saúde pra dar e vender?"

Bem, isso todo mundo quer, mas nem todos realizam, considerando "as leis" que regem a "astronomia" humana, quase sempre elaboradas por adeptos da "teoria do caos" em benefício próprio. Que tal, então, em vez de ir com muita sede ao pote, ou meter a mão na cumbuca, iniciar pelas beiradas? Além disso, seria interessante, em lugar de pensar em benefícios pessoais, mentalizar o bem comum, pela remoção das barreiras que cerceiam o progresso material e espiritual da imensa maioria dos seres humanos.

Para isso, não é preciso esperar por um ano novo apoteótico. Basta que ele seja conseqüência de um bem equilibrado "mais ou menos". Parece pouco para sonhar? Depende. Imaginem um 2005 com:

Mais trabalho, menos miséria; mais merecimento, menos vantagens ilícitas; mais políticos corruptos e desonestos na cadeia, menos violência nos campos e cidades; mais cultura para o povo, menos alienação e modismos; mais paternidade responsável, menos crianças maltratadas ou abandonadas; mais conciliação e coexistência pacífica, menos guerras "oportunas" ou "cultivadas"; mais fé consciente, menos fanatismo selvagem; mais gente se amando, menos gente "ficando"; mais risos abertos, menos lágrimas de desespero; mais amor ao próximo, menos culto ao dinheiro; mais sinceridade, menos aparências; mais remédios para curar, menos drogas para viciar; mais justiça, menos clientelismo; mais cidadania, menos elitismo.

Que tal? Não é pouco!

Se 2005 for um ano "mais ou menos", com certeza será o melhor ano de nossas vidas, e prenúncio de outros, ainda mais promissores, que, completando as quatro operações básicas, multiplicarão esperanças e dividirão seus frutos entre todos. O desgaste do tempo transforma a rocha em areia, mas aprendemos a transformar essa mesma areia em nova rocha, agregando-a e misturando-a ao cimento de nossos sonhos e ideais. De certa forma, o universo foi construído dessa forma. E que grandes e duradouras obras podemos fazer com eles.

Que este novo ano, que chega cheio de expectativas, não seja apenas mais um nem menos um. Que ele seja a junção de mais de seis bilhões de grãos de areia, cimentados pela fraternidade universal e pelo amor de Deus.

Feliz 2005, terráqueos!

Adilson Luiz Gonçalves é engenheiro, professor universitário, articulista e poeta. E-mail: algbr@ig.com.br