O ídolo reconheceu seus próprios limites

A aposentadoria do Ronaldo “Fenômeno” causou não só surpresa, como reflexões em torno dos limites que o ser humano precisa observar em sua vida pessoal e profissional.

Surpresa porque não estamos acostumados a lidar com perdas e a despedida de um ídolo é, sem dúvida, uma grande privação. É incômodo pensar que fenômenos, ídolos ou veneráveis tenham que nos dizer basta, afinal somos levados pela ilusão da eternidade dos que admiramos.

Considero este um bom momento para rever conceitos, afinal, não se pode depositar adoração em alguém sem candidatar-se a frustrações profundas. Todo ser humano está sujeito aos limites impostos pelo próprio corpo. Claro que os esportistas são, muitas vezes, levados a essa constatação muito mais cedo.

No entanto, em todos os campos de ação sempre haverá o momento em que o nosso corpo clamará por menor esforço. Isso independe da idade, mas naturalmente é com ela que se evidencia.

Então não vemos nossos avós e pais enfrentarem os embaraços da natureza? Muitos se perturbam porque os “super-heróis” da infância já não são mais tão fortes e protetores. A realidade é que fizeram o melhor que podiam no tempo que tiveram e agora necessitam do amparo que um dia inspiraram.

Infelizmente, muitos filhos e netos ainda não aceitam essa condição e cobram duramente pela desilusão de não terem mais seus heróis, como se a culpa de seus equívocos fosse deles.

Parece-me evidente que a reflexão quanto à passagem do tempo e seu efeito no ser humano seja fundamental, até porque cada um de nós, a seu tempo, também se deparará com limitações naturais.

Aprender a lidar com esses limites é de grande valia à medida que nos ensina a importância de valorizarmos o presente, como o tempo que possuímos para edificar a nossa vida e as nossas relações.

Não é fácil para ninguém enfrentar as próprias restrições, mas sendo inadiáveis é preciso enfrentá-las a partir da aceitação e da busca da superação. Situação tão bem exemplificada pelo próprio Ronaldo. No entanto, nem sempre superar corresponde a manter-se no mesmo ritmo, não raro equivale a buscar ações diferentes, mas nem por isso de menor significado.

Penso que seja essa busca que nos torna jovens mentalmente, que nos impulsiona a encontrar novas formas de realizações que nos satisfaçam como pessoas. E entendo ainda que seja a partir dessa aceitação que nos tornamos seres humanos mais compreensíveis e amáveis com o nosso próximo.

Não sou uma pessoa idólatra, muito menos ligada ao futebol, entretanto no momento em que vejo lágrimas correrem na face desse homem que tantos sorrisos já fez brotar, sinto-me motivada a dizer a todos os “ronaldos” do mundo que mais vale um tempo bem vivido do que uma vida toda improdutiva e inútil.

Sempre existem novos sonhos deliberados em campos de ações alternativos e igualmente promissores para todos os que valorizam a própria vida e a de seus semelhantes.

A adaptação aos movimentos ininterruptos da vida é que faz de cada um o herói de carne e osso que todos podemos e devemos ser.