O papel das ouvidorias e conselhos de clientes para boas relações de consumo

Consumidores são ou devem ser parceiros na realidade em que as relações de consumo constituem o maior número de contratos que acontecem todos os dias em todos os pontos deste mundo integrado e globalizado. E nesse contexto é fundamental salientar que os interesses de bons fornecedores e consumidores bem-intencionados são notoriamente coincidentes, não só no aspecto da boa-fé objetiva como padrão de comportamento leal e ético, mas também na realização de seus objetivos sociais. A função social do contrato tem como espécie de pré-requisito que os contratantes não se coloquem como antagonistas, mas comportem-se como parceiros solidários para que a relação de consumo seja realizada com equilíbrio e harmonia. Por óbvio, o fornecedor quer prover o mercado e precisa de consumidores para poder realizar sua atividade e o consumidor precisa de produtos e serviços para satisfazer suas necessidades, sendo que esse processo será mais bem-sucedido se for realizado sob formas eficientes e éticas. Nesse sentido, então, é muito importante que esses protagonistas das relações de consumo busquem instrumentos para que cada parte consiga retirar validamente seus objetivos nos contratos. Instrumentos eficazes para este objetivo são as Ouvidorias e os Conselhos de Usuários (ou de Clientes), cada vez mais adotados e valorizados por empresas públicas e privadas com boa gestão. O ideal seria que todo fornecimento de produto ou serviço fosse perfeito ou que, na pior das hipóteses, bastasse um telefonema do consumidor para um número 0800 e o problema acabasse resolvido. Todavia, considerando que, na prática, isso nem sempre acontece, haver um canal de recurso para comunicação entre o consumidor insatisfeito e a empresa é ferramenta eficiente para resolver estas falhas. Com igual importância, esse canal permite o recebimento de opiniões críticas sobre procedimentos do fornecedor ou, ainda, sugestões de soluções que, além de ajudar a detectar problemas, contribuem com subsídios para a tarefa de programar o planejamento empresarial, de modo que a atuação da empresa seja melhor realizada. A pior conduta que uma empresa pode ter é ignorar as reclamações e opiniões de seus clientes, sendo que as Ouvidorias e Conselhos de Usuários/Clientes conseguem suprir a importante função de escutar as reclamações dos consumidores, intermediando dentro da organização empresaria, tanto a solução de um problema acontecido, quanto, com vistas ao futuro, ensejar contribuições para o aperfeiçoamento da qualidade dos novos procedimentos. A eficiência praticada com ética, além de proporcionar satisfação aos clientes, é receita profícua para acontecer o sucesso empresarial. Quem tem consumidores satisfeitos ganha fatias de mercado (market share) e obtém a fidelização dos clientes, o que ajuda a empresa a passar ao largo das instabilidades do mercado.

Segundo João Luiz Rego Barros, diretor secretário geral da Associação Brasileira de Ouvidores (ABO Nacional), independente de haver ou não recomendação legal (exemplo Resolução n.º 85 da Anatel), as empresas que mantém e incentivam Ouvidorias e Conselhos de Clientes, conseguem diminuição de conflitos e costumam ter menor índice de reclamações em órgãos judiciais ou administrativos (como Procon?s). Por isso, esse diálogo entre cliente e fornecedor, é considerado por ele como um presente para a empresa – verdadeira consultoria gratuita e muito bem intencionada – pois consumidor que reclama está se esforçando para continuar cliente e esse procedimento apegado a fidelização e melhora do atendimento, representa verdadeira bênção para os interesses empresariais do fornecedor. Indo além, inclusive, advoga que as empresas devem instalar canais internos de comunicação nos quais os próprios funcionários e parceiros da empresa possam falar pelos clientes todas as vezes que percebem ou ouvem manifestações de insatisfação por parte destes consumidores. Ou seja, as Ouvidorias e Conselhos de Clientes são instrumentos que fazem parte de uma boa gestão corporativa.

Temos a assinalar, porém, que essa espécie de órgão não pode restringir-se a ser apenas um item no organograma instituído com o sentido limitado de somente simular atendimento ao consumidor. Ou seja, ser mais um meio para tentar ?enrolar? os consumidores para sem resolver os problemas tentar que embora enganados não recorram aos meios judiciais como forma de obter o que lhes é de direito. Os Conselhos de Clientes, por encaminharem reclamações que costumam ser de ordem geral, é indispensável que sejam integrados por pessoas representativas da coletividade, incluindo representantes de Procon?s, líderes comunitários e membros de associações de defesa dos interesses dos consumidores. A par disso, é fundamental que atuem muito sintonizados com as Ouvidorias, além de contarem com apoio interno da diretoria da empresa para que possam ser implementadas as boas idéias que deles surjam. Já quanto a Ouvidoria, em especial, tem-se que ela também será inútil se não contar com forte apoio da direção da empresa e tiver considerável poder para tomar decisões e obter a implementação delas. Esse poder mesmo aceitando-se que seja limitado, não deve ser inexistente ou insignificante. Note-se que a Ouvidoria deve ter a autonomia de, em certos casos, tomar decisões em favor de uma solução que atenda ao interesse do consumidor, mesmo que contrarie as orientações ou procedimentos adotados por outros departamentos da empresa. Essa é a única fórmula viável para que ela possa cumprir adequadamente a sua função.

Se é completamente utópico sonhar-se haver empresa perfeita, vencerá aquela que melhor se relacionar no mercado, evitando conflitos e evoluindo seus procedimentos dia-a-dia. Assim, atualmente, resta evidente que nas empresas que atuam no fornecimento em larga escala (?de massa?), a instituição de Ouvidorias e Conselhos de Usuários/Clientes, revela-se imprescindível para uma boa gestão empresarial. E mais, são instrumentos de solidariedade entre fornecedor e consumidor como forma efetiva para a melhora da qualidade dos fornecimentos, além de inestimável contribuição para o equilíbrio e harmonia nas relações de consumo.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Diretor do Brasilcon para o Paraná.