O conceito e os diversos tipos de consumidor

Desde o discurso que em 1960 o presidente americano John Kennedy fez no Senado dos Estados Unidos, tem sido mundialmente unânime a concepção de que os consumidores são uma categoria social que precisa ser tratada de forma especial, ou seja, com proteções específicas para sua condição de vulnerabilidade.

Nesse contexto, sempre constituiu um dos cernes dessa problemática, a adequada identificação dos exatos contornos da relação de consumo e, principalmente, de quem efetivamente é consumidor (o fornecedor pode ser identificado de forma mais simples: havendo um consumidor, quem o provê de produto ou serviço será o fornecedor).

A análise dessa questão deve começar pela observação de que, ao distinguir insumo de consumo e deixar de reconhecer uma relação de consumo em cada compra e venda (qualquer que seja), o CDC afastou-se das sendas da teoria maximalista, mas nem por isso foi menos abrangente do que o necessário. Objetivamente: adotou a teoria minimalista que considera como consumidor apenas o destinatário final do produto ou serviço. Todavia, utilizando a técnica da explicitação e a fórmula da equiparação, na prática, conseguiu gerar uma adequada amplitude para esse conceito.

A primeira grande decisão estampada no CDC foi incluir como possíveis consumidores, não só as pessoas físicas, mas igualmente as pessoas jurídicas. Vale notar que no Brasil existem milhares de firmas individuais que só se distinguem das pessoas físicas de seus proprietários no que refere aos aspectos formais de constituição da empresa e para efeitos fiscais. No restante, esse tipo de pessoa jurídica se confunde com a pessoa física de seu proprietário, podendo ser destinatária final de produtos ou serviços (consumidora) com idêntica vulnerabilidade que a faz carecer das mesmas proteções dedicadas às pessoas físicas.

A observação atenta do Código de Defesa do Consumidor faz perceber que estão elencados 05 (cinco) tipos de consumidores, sendo 02 (dois) que podemos considerar como natos e 03 (três) que são equiparados.

1. Em primeiro lugar, os consumidores natos mencionados no caput do art. 2.º do CDC, os quais são dotados das características evidentes e explícitas de destinatários finais da produção, são eles:

a) Os ADQUIRENTES que com suas peculiaridades de contratantes possuem o que de mais genuíno se pode classificar como característica do consumidor, naturalmente quando a aquisição é para consumo final;

b) Os UTENTES que embora não tenham adquirido o produto ou serviço, são aqueles que, na prática, retiram dele a efetiva utilidade como destinatários finais da produção. A inserção no rol dos consumidores daquele que usa ou utiliza o produto ou os resultados do serviço, mesmo que não seja quem os adquiriu, veio eliminar discussões estéries relativas a condição de contratante (alegação de falta de legitimidade ativa para reclamar) que poderiam servir de escudo para maus fornecedores eximirem-se de responder por falhas na qualidade do produto ou serviço colocado no mercado. O exemplo típico é do presente de aniversário que quem recebe não adquiriu, mas é quem o usa ou utiliza.

2. Na seqüência, mas sem que isso implique em grau menor de importância, aqueles que são equiparados a consumidor para efeito de receber a mesma proteção, pois também alcançados quando a relação de consumo é mal sucedida:

a) A COLETIVIDADE de pessoas, ainda que indetermináveis, quando prejudicada por produto ou serviço sem qualidade, conforme o previsto no parágrafo único, do art. 2.º, do CDC, que permite integrar numa mesma ação os pleitos coletivos, racionalizando as ações judiciais (e até medidas extrajudiciais), quando o dano for fruto de relação de consumo idêntica que atingiu um número grande de pessoas. A agilização que se consegue com este expediente que elimina a necessidade de discutir a mesma questão repetidamente, em inúmeros processos ou procedimentos administrativos, é instrumento extremamente benéfico à obtenção de uma solução mais célere e conforme com a justiça;

b) Os BYSTANDERS ou vítimas do evento, ou seja, aqueles que, teoricamente, seriam terceiros, mas que foram atingidos pelos efeitos da relação de consumo que outros realizaram (protegidos segundo ao art. 17 do CDC). Como exemplo se pode citar, o do funcionário dos correios que efetivando entrega de um produto comprado em relação de consumo, sofre conseqüências físicas decorrentes de um vazamento na embalagem do produto que seja tóxico, sendo que tal também venha acontecer com o consumidor. Neste caso, não há lógica que pessoa atingida pela mesma relação de consumo, sendo ou não contratante, tenha que buscar proteção em códigos diferentes. Ou seja, o consumidor litigando consoante instrumentos legais mais adequados como o CDC e o entregador segundo legislação menos apropriada (para as relações de consumo) no caso o Código Civil;

c) As pessoas que estejam EXPOSTAS À PRÁTICA DE MERCADO (protegidas conforme o art. 29, do CDC), mais precisamente, aqueles que estão na condição de consumidores apenas potenciais (que no futuro podem ou não contratar), mas que já têm contato com as práticas de mercado encetadas pelo fornecedor ou com os efeitos delas. É o caso, por exemplo, quando no mercado de fornecimento para consumo acontece a formação de cartéis entre os fornecedores, no sentido de prejudicar os consumidores ou de publicidade enganosa ou abusiva e outras práticas de mercado desvirtuadas.

Em complemento, é importante ressaltar que ajudando a aclarar eventuais dúvidas, colabora com esse delineamento de quem é consumidor (e também fornecedor), o grande avanço que representou incluir no âmbito do CDC, os serviços públicos e os de natureza bancária ou financeira, quando se caracterizarem como relação de consumo.

Assim, seguindo os maiores juristas internacionais dessa área, há que se reconhecer que CDC realmente conseguiu adotar a fórmula ideal para que seja possível dar proteção aos consumidores e demais atingidos por relações de consumo (e de mercado) quando malsucedidas, pois sem essa estrutura estabelecida para identificar os destinatários finais da produção, todos os demais aspectos do código ficariam comprometidos.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Diretor do Brasilcon para o Paraná.

Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor – BRASILCON