Desmatamento em escala irreversível na Amazônia

São Paulo – Cerca de 20% da cobertura original da Amazônia já foi destruída. O desmatamento de mais 30% causará mudanças irreversíveis no bioma, extinguindo a parte oriental da floresta, de acordo com um novo modelo desenvolvido no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Mas, ao passo que o desmatamento avança, o Brasil está prestes a ganhar uma lei sobre mudanças climáticas e a sociedade civil já preparou uma lista de sugestões para torná-la adequada o suficiente para tratar do tema.

O modelo do Inpe é resultado da tese de doutorado do pesquisador Gilvan Sampaio, apresentada recentemente na Conferência Internacional Amazônia em Perspectiva, em Manaus. De acordo com Sampaio, o estudo analisou a situação do bioma em um intervalo de 24 anos e mostrou que, se o desmatamento chegar a 50% da área original da Amazônia, a região leste da floresta se transformará em savana. “Descobrimos que um desmatamento acima de 50% estabeleceria um novo estado de equilíbrio na Amazônia, dando ao bioma uma configuração irreversível”, explica o pesquisador.

A principal novidade do novo modelo é articular cenários de clima e vegetação, ao contrário dos modelos convencionais, nos quais a vegetação não passa de um dado estático. “É comum que se pense que a floresta, depois de cortada, vá se regenerar. Mas o clima depende da vegetação tanto como ela depende do clima. Quando a vegetação é eliminada, a partir de um certo ponto, o clima também muda”, afirma.

No estudo, Sampaio utilizou cenários de mudanças climáticas e de mudanças no uso do solo considerando áreas de desflorestamento equivalentes a 20%, 40%, 50%, 60%, 80% e 100% da cobertura original da Amazônia, considerando as atuais tendências de desmatamento.

“Se partirmos de 100% de cobertura, quando passamos de 40% já chegamos a outro estado de equilíbrio, com savanização do leste. Se partirmos do deserto total e adicionarmos florestas, o sistema chega a um estado de equilíbrio quando atingimos 50% de florestas. Ou seja, esse número está consolidado como o ponto de não-retorno”, explica.

Legislação

Enquanto as previsões para o desmatamento projetam tal cenário, a sociedade civil se organiza para enrijecer as leis e tentar reverter o processo. Um documento elaborado pelas ONGs do Observatório do Clima (rede brasileira de articulação sobre mudanças climáticas), entregue na última semana ao ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, prevê, entre outras atribuições, o fim do desmatamento em sete anos.

A intenção é que o texto seja incluído no projeto de lei (PL) sobre mudanças climáticas, proposto pelo deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), coordenador do Grupo de Clima da Frente Parlamentar Ambientalista da Câmara dos Deputados. O diretor executivo do Greenpeace (que faz parte do Observatório do Clima), Marcelo Furtado, afirma que as ONGs esperam que a lei incorpore as propostas apresentadas, como a de desmatamento zero.

“Outro ponto urgente é a elaboração de estudos e planos de adaptação e vulnerabilidade para lidar com fenômenos como o de Santa Catarina, que tendem a ser mais freqüentes se o tema mudanças climáticas não for encarado com mais seriedade”, afirma.

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