Cartas e naipes no jogo do biocombustível

Estados Unidos e Brasil reataram o namoro global se presenteando com o explosivo etanol. Amanhã, biodiesel da macaúba de D. Gazzoni. A ?segurança nacional dos EUA?, vacina o gás natural de Maracaibo. Bush-1 aterrisou na Unica paulista. Escolha não aleatória. São Paulo encabeça a safra 05/06 de 386,5 milhões de toneladas (ton) de cana (24,8 no PR), em 306 usinas no País (27 no PR vs 114 destilarias de etanol de milho nos EUA), 15,9 bilhões de litros de etanol (1,0 no PR) e 25,8 milhões de ton de açúcar (1,5 no PR). Contraponto: aqui 100 usinas biodieselisadoras prontas e semi-prontas (www.biodieselbr.com) vs 105 nos EUA, todas produzindo (www.nbb.org). Lula vai aos USA e Bush-2, (Jeb, ex-governador da Flórida), vem ver o estreante ministro Reinhold Stephanes, paranaense de adoção. Flórida é um canavial de lá (180 mil hectares (ha) e 13 milhões de ton).

Chegaremos ao ponto ?G? empregado por Lula é metonimicamente ?Globalização? de plena bilateralidade. H. Duque lembrou J.F. Dulles: ?nações não têm amigos, têm interesses?. Na tela, uns míseros píxeis sobre biodiesel. Mas nenhum pio sobre a Petrobras/HBio. O jogo biocombustível é pesado e há jogadores hábeis. Por aqui: o presidente alemão H. Kohler e suas 1,67 milhãos de ton/2005 de biodiesel. O italiano R. Prodi, também. EUA: etanol de amido (57,5%) do milho (32 milhões de ha; 8 ton/ha); Brasil: de cana (no mínimo 30% mais barato). A cana dá caldo, bagaço (210 kWh/ton), etanol e ?yeast cake?. A hierarquia (e custos) de complexidade quimico-biotecnológica crescente é sacarose-amido-ligno-(hemi)-celulose [1,2]. Quem gera mais CO2 anti-Kyoto, bagaço queimado ou fermentação? Dados impressionam (veja tabela). O interesse norte-americano pelo etanol brasileiro não é de hoje. O mesmo para o biodiesel: Biodiesel Magazine {1(3); pg. 28) transcreveu ?Before 2010 Brazil will be world shopping place for biodiesel?, literalmente a partir de nossa palestra na Biodiesel National Conference e Expo de 2004 em Palm Springs, Califórnia (CA), para 550 sojicultores da ASA e NBB. Enquanto redigia este artigo a partir de 15/3/2007, a gasolina valia R$ 2,35 em Curitiba e R$ 1,71 em San Diego (CA). A razão entre salário-mínimo dos operários EUA/Brasil é 5,4 x. Lá ele dirige um Corolla de 2.ª mão; aqui sequer um Fusca. Cito (sempre em ordem alfabética) mais três cartas e naipes do Paraná: garantia de valor agregado para o grão do pequeno agricultor (palestra no 1.º Seminário Paranaense de Biodiesel que organizamos em Londrina, em 2003); maturidade de um senador ligado às coisas e causas agrícolas; políticas públicas como Luz Fraterna e ICMS nulo ou favorecido. Orlando Pessuti, Osmar Dias e Roberto Requião. Um conjuminamento paranaense se desenha? O alfabeto neo-energético paranaense é vasto. Só para citar duas letras, alfa: os pioneiros G. Ottmann (Coamo) e R.Fontana (AustenBio) na Cocamar de 1982-1983 faziam circular com biodiesel próprio de borra de óleo de algodão caminhões Scania e M.Benz com B-100 (biodiesel puro) por milhares de quilômetros até o aborto imposto pelo SNI. Ômega, a vinda da ítalo-brasileira Brasbiofuel para cá.

José Domingos Fontana (jfontana@ufpr.br) é professor emérito da UFPR, prêmio paranaense em C&T (1996) e pesquisador do CNPq (1996-2006).

Considerações e sugestões sobre a questão

Neste poker ?Texas Holdem? biocombustível, meus considerandos e uma sugestão bona fide: a) Lula pediu a suspensão da tarifa de importação de US$ 0,54/galão imposta ao etanol brasileiro; Bush (republicano) contrapôs que está sem esta força política ante o Congresso (maioria democrata) embora queira o etanol brasileiro para redução de 20% nos derivados combustíveis de petróleo nos próximos 10 anos. Mas ali (segundo a IstoÉ n.º 1950) o senador Richard Lugar (republicano) luta contra a poluição e portanto a favor do etanol brasileiro e da redução de sobretaxas.

b) o ?Air Force Lula?, que tal qual um Boeing/Nasa poderá estar voando com o bioquerosene do cearense Expedito Parente, tem várias poltronas, um com a reserva Paraná – celeiro da nação (20,5 milhões de ton na safra nacional atual de grãos de 124 milhões).

c) Uma redução em 25% da sobretaxa seria saldo positivo para um Furscan – Fundo de Recomposição Salarial dos Cortadores de Cana (aqueles que em roupagem pesada brandam o podão 9.700 x na faina diária de 10 ton de cana/dia – segundo E.S. Lima de Brasil de Fato). A tecnologia de cadastrar e remunerar os mais pobres o Brasil já domina com o Bolsa Família.

Tal fundo faria uma redistribuição de renda. Se totalmente abolida a inamistosa tarifa uma alternativa tipo PPP vale. Meu disputado exemplar de O Estado vai ao correio na direção do ás de ouro, que na infância já foi 2 de paus, olhando a quase monocultura de canaviais pernambucanos. Brasil e EUA equidividem 72% do etanol mundial. Igual empate dar-se-á no biodiesel, também pensado no Brasil como intocável instrumento de inclusão social. Não cabe a palavra ?compaixão? aqui ventilada para terceiros.

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