Outubro Rosa

‘Viva um dia de cada vez’. As lições de quem venceu o câncer e agora ajuda outras mulheres

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Juliana "Bela Careca" superou o câncer e agora ajuda outras pessoas. Felipe Rosa / Tribuna do Paraná

 

“Preciso comprar pijama, mãe”. Foi dessa forma que Juliana Mandeli Loiola, 35, deu à sua mãe a notícia de que estava com câncer de mama. Concluindo que passaria os próximos 8 meses de tratamento escondida do mundo, dentro de casa, a advogada jamais imaginaria que – durante o período – fosse despontar como ícone da luta contra a doença nas redes sociais. Há poucas semanas de ter concluído a longa intervenção para combater a neoplasia que a acometeu no começo do ano passado, Juliana se considera privilegiada por ter descoberto a doença cedo e hoje, já curada, segue firme na missão que deu novo significado à sua vida: alertar e ajudar pacientes de câncer de mama a enfrentarem os desafios do dia a dia após o diagnóstico.

Parecia o sonho perfeito. Em pleno mar do Pacífico, o casal desfrutava as férias à bordo da pequena embarcação que seguia rumo ao arquipélago de Cabo San Lucas, na costa mexicana. Frustrados, os turistas que compartilhavam do passeio com os jovens brasileiros reclamavam diante da ausência das prometidas baleias que, teoricamente avistariam durante a excursão. Para Juliana, no entanto, o fato pouco importava. Grávida do primeiro filho, “felicidade” era o termo que melhor lhe cabia afinal, em poucos dias, um novo destino a aguardava: a Califórnia, nos Estados Unidos, onde – ao lado do marido – escolheria as primeiras roupinhas a comporem o enxoval do bebê.

  • Sobre a doença – Neoplasia mais comum entre mulheres em todo o mundo, o câncer de mama acomete milhares de pessoas anualmente. Segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca), estima mais de 57 mil novos registros da doença a cada ano no Brasil. Segundo o instituto, mulheres a partir dos 50 anos são mais propensas a desenvolver a doença, porém isso tem mudado. Na última década o número de mulheres com menos de 35 anos acometidas pela neoplasia aumentou significativamente, representando cerca de 5% do total de novos casos.

Um dia antes de voltar ao Brasil, no entanto, um sangramento inesperado deixou perplexa a advogada. “Cheguei em casa e fui ao médico imediatamente. Então descobri que tinha perdido o bebê”, recorda. Abalada, Juliana encontrou no trabalho a saída para escapar da tristeza. “Era um período de expansão no escritório em que eu trabalhava então dei tudo de mim nos novos projetos que estavam nascendo. Virei a verdadeira workaholic”, conta. Meses depois, no entanto, nova “supresa” nada agradável, viria a desestabilizar totalmente o emocional da curitibana. O diagnóstico foi preciso: câncer de mama. E o prognóstico, apavorante: o tumor era maligno e crescia rapidamente.

“Assim como todos os pacientes que recebem essa notícia, na hora, eu fiquei no chão. Foi difícil para todo mundo. Lembro de dizer para minha mãe que não sairia de casa enquanto não acabasse o tratamento e que precisava urgente comprar pijama porque essa seria a minha roupa de todos os dias”, lembra a advogada. Ledo engano. Após as primeiras sessões de quimioterapia, ela percebeu que – apesar dos efeitos colaterais – ânimo e positividade não lhe faltavam. “Eu não me sentia doente. Percebi que era possível sair, passear e viver a vida apesar do tratamento. A única coisa que me amedrontava era a hora que meu cabelo começasse a cair. Nesse momento senti falta de alguém me orientasse ou dissesse como seguir os próximos passos”, conta.

Com o passar das sessões, o inevitável efeito colateral foi “tirado de letra”. “Depois de sofrer tentando manter o cabelo e me frustrar ao ver os tufos que começavam a cair pela casa, decidi raspar de uma vez. Eu achava que choraria horrores mas a reação foi exatamente oposta. Me senti livre”, revela. Apoiada pela família e amigos, a advogada buscou a ONG Laço Rosa – que apoia pacientes de câncer de mama – também por meio do chamado “Banco de Perucas”. “A princípio minha ideia era adotar a peruca mas depois desisti e recorri aos lenços. Nessa etapa acabei descobrindo que a beleza permanece apesar das mazelas do câncer. Ele não é forte o suficiente para apagar o brilho de ninguém”, diz.

  • Diagnóstico – Fundamental no tratamento contra qualquer tipo de câncer, o diagnóstico precoce por meio de mamografia faz toda a diferença para a cura. Outra medida importante, o autoexame, pode revelar possíveis nódulos, sendo sempre recomendado a solicitação ao médico de exames como mamografia, ultrassom, ressonância magnética e biopsia.

Seja por conta do carisma da advogada, seja pela temperança que demonstrou ao longo da adaptação ao novo visual, dias depois, ela foi convidada a participar do vídeo institucional da ONG Humsol, também voltada ao apoio de pacientes de câncer de mama. Com a divulgação do material pelas redes sociais, a projeção nacional rendeu à Juliana grandes amigos, além do status de “ícone da luta contra o câncer de mama” entre mulheres jovens. “Muita gente me procurou em busca de suporte e acabaram virando grandes amigos”, diz.

Inspirada pelo apoio que encontrou nas redes sociais, a advogada produziu um álbum de fotos no qual fez questão de mostrar a “careca“ e, incentivada por uma amiga próxima, criou um perfil no Instagram destinado ao compartilhamento de experiências e informações entre pacientes. Por meio do pseudônimo @belacareca, a conta traz mensagens motivacionais e mostra que, mesmo no auge da luta contra a neoplasia, a beleza feminina não apenas persiste, mas também floresce. “O sofrimento, a luta e persistência, fazem da paciente de câncer de mama uma mulher única. Isso transparece nos olhos, no sorriso, nos gestos. A vida ganha novo sentido e a gratidão passa a ser a principal força de quem passa por isso”, ressalta.

Hoje, praticamente curada, Juliana comemora a última dose de medicamentos ingerida há apenas algumas semanas. Livre da rotina de quimioterapias e remédios fortes, a advogada incentiva: “mulheres, fiquem atentas à saúde. Muita gente pensa que o câncer de mama só atinge mulheres mais velhas ou com predisposição genética. A realidade é que a doença atinge mulheres de todas as idades, sendo apenas 5% dos casos decorrentes do fator genético”, alerta. Às que receberam o diagnóstico recentemente, Juliana aconselha: “Viva um dia de cada vez. Cada etapa, mesmo que difícil deve ser respeitada com calma e paciência. A gente tende a querer saber logo como e quando vai melhorar mas isso só provoca mais ansiedade e desespero. Procure atividades que você gosta de fazer. Se permita viver apesar do medo. Quando se der conta, o tratamento já acabou e a vida continua mais bela, colorida e repleta de razões para agradecer”, diz.