"Nunca mais a mesma"

Vítima de estupro relata momentos de terror

Superar o trauma do estupro tem sido o sofrimento diário para Juliana (nome fictício) que tenta esquecer a violência e entender o descaso de órgãos dos governos estadual e municipal. Ela passou quase três horas de terror nas mãos do estuprador. Maicon Cesar Azevedo, 27 anos, preso no dia do crime, atormentou a mulher, de 33 anos, contando detalhes do estupro que teria cometido contra uma menina de 12 anos há menos de um mês. A criança era vizinha de Juliana.

Para a mulher violentada, o estupro era rotina na vida de Maicon. Ele usou preservativo e teve o cuidado de se livrar da camisinha depois. Mas antes, exigiu que Juliana lhe preparasse macarrão, bebeu na casa da vítima e a obrigou a fazer um desfile de lingerie para que escolher as peças que ela vestiria na hora do abuso sexual.

“Ele estava consciente, não estava drogado. Sabia o que estava fazendo, está acostumado com isso. Parou porque foi esfaqueado, mas a ambulância que foi chamada para me atender, primeiro socorreu ele, eu que sou a vítima fiquei 20 minutos esperando até mandarem outra”, relembra.

Sem assistência

Ele também teria estuprado outra vizinha, que morava na casa da menina antes de a família abandonar o bairro em dezembro de 2012, sem registrar a ocorrência em uma delegacia. “Pela maneira de agir, falar ao telefone quando estava na casa, usar uma faca estilo peixeira, pedir dinheiro foi ele que cometeu o estupro da antiga vizinha também. Tudo aconteceu como foi comigo”, conta Juliana.

Juliana se revolta pela falta de assistência. Ela não quer só justiça, mas também cuidados e atenção. “Não tenho dinheiro nem para pegar o ônibus e ir à delegacia. Tenho que contar com a ajuda dos vizinhos até para comer. Onde estão os direitos humanos? São só para bandidos?”, reclama. A mulher teve que tomar um coquetel de 14 comprimidos e quatro injeções para evitar doenças e está tomando outras duas medicações que causam sérios efeitos colaterais.

Terror

A vizinha que quase viu a filha ser vítima de Maicon na mesma noite também pede assistência para a adolescente, que não quer mais voltar para casa, e para o filho que esfaqueou Maicon, impedindo que a irmã se tornasse vítima. A adolescente que ficou escondida sob um edredom enquanto o irmão lutava com o agressor.

Preso é suspeito de pelo menos dois crimes

Reprodução
Maicon fugiu da CPAI.

O suspeito de estuprar duas mulheres e tentar violentar uma menina de 12 anos no Atuba foi ouvido ontem no 2.º Distrito Policial e será encaminhado para o sistema prisional ainda esta semana. Segundo a polícia, ele estava bastante agitado e precisou ser contido dentro da carceragem.

Maicon Cesar Azevedo, 27 anos, já foi condenado por latrocínio (roubo seguido de morte) e estava foragido da Colônia Penal Agroindustrial (CPAI) desde agosto do ano passado. Ele foi recapturado na segunda-feira, depois de ser esfaqueado pelo irmão de uma menina, de 12 anos, que tentava estuprar. Os investigadores ouviram as três vítimas também na tarde de ontem. Eles contam com a ajuda de outras delegacias, onde também havia denúncias registradas contra Maicon. “Em seu depoimento ele não fala coisa com coisa. Sempre está muito agitado e foi difícil conseguir contê-lo para colher o depoimento”, relatou o delegado Antônio Macedo de Campos Júnior.

Investigação

A Polícia Civil investiga a participação de Maicon em outros estupros e espera que vítimas possam fazer o reconhecimento dele, como fez a menina de 12 anos que foi abusada há menos de um mês. Ele age na região do Atuba e as mulheres que já o reconheceram acreditam que ele teve cobertura de um casal. O homem seria irmão de Maicon, m,as a polícia ainda não identificou nenhum dos dois comparsas.

Receio de denunciar

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Medo paralisa vítimas.

Um dos grandes problemas enfrentados pelas equipes de investigação é a ausência de denúncia por parte da vítima. “Tivemos o caso de um estuprador preso ano passado. Ele havia abusado de 23 mulheres, mas a maioria delas só apareceu para denunciá-lo depois que ele foi preso”, contou a delegada Maritza Haisi, da Delegacia da Mulher. Segundo ela, existem três fatores que impedem as denúncias: vergonha, medo de não acreditarem na versão da vítima e rejeição em reviver o trauma do estupro, contando o que aconteceu.

Em 2010, somente em Curitiba 75 mulheres foram estupradas, o número cresceu para 88 casos em 2011 e sofreu leve queda para 76 casos consumados em 2012. O Código Penal prevê pena mínima de 6 anos e máxima de 30 para estupradores, variando de acordo com a gravidade do caso.

Atendimento especializado

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Maritza: faltam denúncias.

Em Curitiba, dois hospitais têm um protocolo específico para atendimento de vítimas de estupro: Hospital das Clínicas e Hospital Evangélico. “Ambos são conveniados com delegacias da mulher. Além dos cuidados médicos, os profissionais sabem agir rapidamente. Comunicam a polícia e também o Instituto Médico-Legal, que envia um perito para coleta imediata de provas”, pontuou Maritza.

Segundo ela, é necessário um tratamento especial nestes casos. Além do trauma psicológico, a mulher precisa passar por um processo de profilaxia, ingerindo medicamentos que evitam a gravidez e combatem a possível infecção com doenças sexualmente transmissíveis, como a aids por exemplo.

Urgência

“Todos estes cuidados devem ser tomados em 72 horas após o estupro. Por isso, é importante que as vítimas procurem um desses dois hospitais, ou mesmo a delegacia da mulher mais próxima e a Polícia Militar”, orientou a delegada.