Reportagem do GPP revela realidade dos moradores da Vila Torres

Enquanto o futuro de muitos garotos começa a ser planejado aos 17 anos, o destino de um adolescente da Vila Torres, da mesma idade, já foi previsto pela própria mãe e determinado pelo tráfico de drogas. Ela comprou o caixão para o filho, pois sabe que não irá demorar para que ele seja assassinado.

Um dia depois de um garoto de 13 anos ter sido assassinado por conta da rivalidade entre as gangues que comandam a Vila Torres, a reportagem do Paraná-Online entrou na favela em busca de mais informações sobre a realidade de quem mora ali. Escoltada por policiais do 12.º Batalhão da Polícia Militar, e enfrentando olhares de ?poucos amigos?, a equipe falou com uma doméstica, de 37 anos, mãe de um dos traficante da área e membro da gangue. Houve pouco tempo para conversar, devido à aglomeração de pessoas que intimidava a reportagem.

Destino

O depoimento da doméstica se assemelha ao de centenas de mulheres que moram na vila e que perderam os filhos para as drogas. ?Meu filho começou como usuário e hoje é traficante. Já disse que ele está procurando a morte e, por isso, comprei seu caixão?, desabafou. ?Não quero passar o que outras mãe passam, que é ter que pedir dinheiro para os vizinhos para poder dar um funeral decente pro filho?, explicou.

O garoto já foi baleado e foi detido cinco vezes. Está em liberdade há poucas semanas e deveria prestar serviços comunitários. Porém, o garoto parece não se importar com isso. ?Ele continua traficando. Choro dia e noite, já tentei interná-lo várias vezes e não consegui. Hoje, tento poupar meus outros quatro filhos, mas sei que, aqui, o destino deles não será diferente?, contou. Ela se referia, em especial, ao menino de 4 anos, que já identifica o cheiro de maconha e o barulho de tiros.

Impotência

A doméstica pensou em se mudar, mas teve que desistir da idéia por causa do adolescente. ?Ele disse que não vai comigo. Por isso resolvi ficar, ao lado dele.

É uma dor muito grande saber que vou perdê-lo e esse é o futuro da maioria das crianças que moram aqui?, disse, enquanto cuidava para que os filhos pequenos não saíssem do portão.

Fogo avisa quando chega a droga

Foto: Átila Alberti

Polícia está de olho nos usuários que vão comprar drogas.

Na Vila Torres, fogueiras nas ruas não significam que os moradores querem se aquecer, mas que a ?boca está quente?, ou seja, que chegou droga na favela. O uso de entorpecentes entre os moradores não é o que traz à grande parte do dinheiro para os traficantes, uma vez que os ?clientes? são outros. Segundo o tenente Sérgio, comandante da 5.º Companhia do 12.º BPM, são pessoas de classe média que entram na favela em busca de maconha, cocaína e crack.

Por conta disso, os policiais estão cadastrando as pessoas que não moram, mas que freqüentam a vila. Placas de carros são anotadas e a vida dos proprietários é investigada. ?Não queremos cercear o direito de ir e vir de ninguém, mas queremos saber quem são essas pessoas, pois são elas que mantém o tráfico e a violência?, contou.

Conivência

Em buscas de informações sobre usuários e traficantes, policiais do 12.º BPM, tanto os fardados quanto os de serviço de inteligência, garantem que entram na favela sem medo. Segundo eles, o perigo existe como em qualquer lugar e, todas as vezes que a polícia sofreu algum atentado, foi em abordagens, quando houve reação.

A maior dificuldade da polícia está em conseguir ajuda da população, que muitas vezes é conivente com os marginais. ?Quando um policial fardado entra, os bandidos desaparecem e entram no barraco de quem nem conhecem. Ninguém os denuncia?, contou um dos PMs do serviço reservado.

É do telefone 181 – Narcodenúncia, que a polícia consegue muitas informações sobre os traficantes. ?Não temos como descobrir quem liga, mas se mesmo assim houver receio, recomendamos que usem um telefone público. É só com a ajuda de quem mora lá que vamos conseguir prender os criminosos?, finalizou o comandante.

Vidas pela metade

Foto: Átila Alberti

Algumas crianças são usadas por bandidos.

Nas ruas da Vila Torres há muitas crianças. Mas elas não estão ali brincando, como aparentam. Fazem parte da engrenagem que move o tráfico de drogas. São os chamados ?aviõezinhos?, responsáveis por guardar as armas, quando a polícia chega, e entregar a droga para os usuários. ?Quando aparecemos de viatura, todo mundo entra nos barracos. Ficam apenas as crianças, que aparentam ser inofensivas. Depois que vamos embora, os moradores nos contam que elas seguravam as armas para que os maiores não fossem presos. Muitas vezes não agüentam nem o peso do revólver?, relatou o segundo-tenente Maceno, do 12.º BPM.

Fogueteiro

Na segunda-feira, quando o garoto de 13 anos, que pertencia a gangue ?De baixo? foi morto, um menino de 11, do grupo rival, foi quem comemorou soltando fogos de artifício. Ele segue o caminho dos irmãos, de 16 e 18 anos, que pertenciam à gangue ?De cima?, e que foram assassinados em 2005. No mesmo ano, o pai dos três foi morto pelos inimigos dos filhos.

Com a guerra entre os dois bandos, que são compostos em sua maioria por adolescente e crianças, quem sofre são os pais. Fazer parte da família de um inimigo é praticamente sentença de morte.

A doméstica, mãe de um traficante de 17, e que mora na área da ?gangue de cima? foi obrigada a retirar os filhos da creche e a procurar médico e dentista fora da vila. Tanto a escola quanto a unidade de saúde estão situadas na outra parte da favela, por isso, só tem acesso a esses serviços quem mora lá. ?Quando levava as crianças para creche ou ia ao médico, era ameaçada pelos inimigos do meu filho. Nós não podemos entrar no território deles e nem eles podem vir aqui?, contou.

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