Projeto polemiza penas a menores

Um projeto de autoria do deputado federal Alfredo Kaefer (PSDB/PR) sobre a definição de sentenças para menores infratores não está encontrando total apoio entre os especialistas da área. Pela proposta, o juiz irá definir a sentença para a aplicação de medidas socio-educativas, de acordo com a gravidade do delito, depois de analisar laudos psicológicos, sociológicos e educacionais. Com essa medida, o deputado entende que passa ser desnecessária a discussão sobre a maioridade penal. 

?A idéia é que o adolescente infrator seja ouvido por uma equipe de profissionais e o juiz decida qual será a punição, levando em conta a idade cronológica e o perfil psicológico. Se ele cometer um delito típico da idade a punição será menor. No entanto, o jovem que já tem passagem pela polícia e envolvimento com drogas comprovado seria analisado com mais rigor?, defendeu Kaefer. O deputado afirma que em países como Estados Unidos e Europa já existem modelos semelhantes a esse, com bons resultados.

Quando um adolescente comente um ato infracional ele é levado para uma delegacia de polícia para que seja feito o registro. Dependendo da gravidade da situação, o promotor de justiça é acionado para ouvir o menor, que pode ser devolvido para a família ou encaminhado para o juiz aplicar a detenção provisória. Em até 45 dias é definida uma sentença, que vai desde a prestação de serviços comunitários até a internação em centros de socioeducação com a privação de liberdade, que pode chegar a até três anos. No Paraná funcionam 18 centros, quatro somente na região de Curitiba, que abrigam hoje 700 adolescentes em privação de liberdade. Outros sete mil menores cumprem medidas em regime aberto.

Para a promotora de justiça do Centro de Apoio Operacional da Promotoria da Criança e do Adolescente, Marcela Marinho Rodrigues, esse modelo aplicado atualmente funciona de forma célere, e o projeto proposto pelo deputado Kaefer poderá representar um retrocesso. ?É um projeto de impossível aplicação?, argumenta a promotora, que entende que a proposta pode gerar ainda conflitos de competência entre as varas criminal e civil. Além disso, não existiria estrutura profissional suficiente para adotar esse sistema.

A secretária de Estado da Criança e Juventude, Telma Alves de Oliveira, afirma que a definição de laudo para definir a sentença só irá trazer subjetividade ao julgamento. ?O laudo passa por avaliações subjetivas. Muitas vezes um terapeuta leva anos para compreender a dinâmica de um sujeito. Por isso, acho absurdo condicionar?, comentou. Telma comentou ainda que esse novo modelo poderá criar uma rede de possibilidades de avaliações encomendadas, que só venham a atrapalhar o processo. 

?Não somos violentos por natureza?

?Não somos violentos por natureza, e é isso que queríamos que a sociedade soubesse?, afirma G.N.E., de 18 anos, que há três cumpre sentença num educandário na região de Curitiba. Esse e outros pensamentos são o que cerca de 80 adolescentes de três centros de socioeducação – São Francisco, Joana Miguel Richa e Fazenda Rio Grande – expuseram no projeto Luz, Câmara… Paz!, desenvolvido pela Ciranda – Central de Notícias dos Direitos da Infância e Adolescência, dentro dessas unidades.

O projeto, que resultou em um jornal e um vídeo produzidos integralmente por esses jovens, abordam temas como a sociedade, violência sexual, desigualdade, família, trabalho infantil e redução da maioridade penal. Nesses materiais eles expressam seus pensamentos, que gostariam que fossem ouvidos fora dos muros das unidades. (RO)

Lógicas diferentes para as punições

Aplicar a mesma lógica de punição dos adultos para os adolescentes não traz resultados positivos, garantem os especialistas. O contrário, ou seja, aplicar medidas de socioeducação ao invés da punição pura e simples poderia ter um efeito melhor nos adultos. Derrubar os preconceitos que existem em relação aos menores infratores também poderia ajudar.

?Os adolescentes não são protagonistas da violência, mas sim, vítimas dela?, afirma a promotora de justiça Marcela Marinho Rodrigues. Segundo ela, muitos menores que cometem atos infracionais sofreram violência na primeira infância. Isso demonstra que para se diminuir a violência urbana é preciso investir na inclusão social. ?Fico triste quando a população vê o problema do menor infrator só de maneira pontual e individual?, disse a promotora.

O projeto do deputado Alfredo Kaefer, na avaliação da psicóloga e coordenadora de uma das alas do Centro de Socioeducação São Francisco, em Piraquara, Iliete Sansana Gallotti, até poderia ser útil se existisse uma estrutura eficiente. ?Porém, sabemos que muitas comarcas não teriam condições de atender essas exigências?, disse. Para ela, ao invés de pensar em modificar uma estrutura que funciona bem, é preciso investir para derrubar o preconceito da sociedade. ?Muitos jovens que passam pelo processo de recuperação em unidades de privação de liberdade, mesmo que tenham cursos profissionalizantes e um bom desempenho, encontram dificuldades de ingressar no mercado de trabalho?, comentou.

E é uma oportunidade que a grande maioria desses jovens espera encontrar fora dos educandários, garante a instrutora de digitação, Maria José Quaresma, que trabalha há nove anos com menores em recuperação. ?Muitos têm o objetivo de trabalhar, ajudar a família e voltar para a sociedade com uma outra visão. Mas infelizmente essa mesma sociedade ainda continua rotulando esse jovem?, afirmou.

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