Operação Ressurreição

Polícia faz operação contra grupo suspeito de driblar o rodízio de funerárias em Curitiba

Um operação para desarticular uma quadrilha que fraudava o Seguro DPVAT (Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre) foi deflagrada na manhã desta terça-feira (26) pela Polícia Civil. Doze pessoas foram presas, entre elas quatro motoristas do Instituto Médico-Legal (IML). Um médico da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Colombo, na Região Metropolitana de Curitiba, é investigado.

Além dos mandados de prisão, que foram expedidos em caráter temporário, foram cumpridos também 14 de busca e apreensão e três de condução coercitiva. A operação – chamada de Ressurreição – acontece em Curitiba, Almirante Tamandaré, Colombo, Pinhais, Piraquara e em Ponta Grossa, nos Campos Gerais.

Segundo a polícia, a quadrilha era comandada por agentes funerários que agiam para driblar o rodízio das funerárias de Curitiba. As investigações começaram em julho de 2015, depois que o diretor-geral da Polícia Científica do Paraná, Hemerson Bertassoni Alves, constatou que havia algo errado internamente.  “Fizemos um mapeamento interno dessas irregularidades e a denúncia foi entregue à Polícia Civil, que fez todas as diligências necessárias”,

Conforme informou o delegado Renato Bastos Figueroa, que comandou as investigações, os registros da morte de Silmara de Campos Ferreira teriam desaparecido do IML. “Descobrimos que ela foi enterrada na Lapa, através do esquema realizado pela quadrilha e começamos a investigar”, explicou.

De acordo com as investigações, os mentores do esquema eram Marcio Clovis Baldi da Silva, Tiago Alcaide Ferreira e Luciano Alis Ferreira. Eles tinham ajuda de motoristas do IML, donos de um despachante e de funerárias que funcionavam na região metropolitana de Curitiba.

Como tudo funcionava

Os investigados passavam o dia e especialmente a madrugada atrás de corpos de vítimas de acidentes de trânsito ou morte natural. “Eles pagavam aproximadamente R$ 700 aos motoristas do IML para que eles dessem informações privilegiadas e em tempo real dos óbitos ocorridos na capital, região metropolitana e em Ponta Grossa. A partir dessas informações, a quadrilha agia”, explicou o delegado.

Com as informações, a quadrilha agia de duas formas: no caso das mortes em acidentes de trânsito, os investigados conseguiram que familiares assinassem procurações para dar entrada no seguro DPVAT – cujo valor pode chegar até R$ 13,5 mil. “Uma pequena parte deste dinheiro era repassada à família dos mortos e o restante ficava com a quadrilha. A alegação era de que o restante era gasto nas despesas do enterro”, disse Renato Figueroa.

Foto: Gerson Klaina.

Nos casos de mortes naturais, após ser informada pelos motoristas envolvidos, a quadrilha ligava para o IML se passando por parentes da vítima cancelando atendimento do Instituto. O médico da UPA de Colombo era acionado para atestar o óbito e direcionar o serviço funerário para as empresas ligadas ao esquema.

A polícia investiga se o médico, que foi conduzido coercitivamente, era conivente com os criminosos ou se foi uma vítima desta quadrilha. Um advogado e um funcionário de um banco que repassava informações de contas bancárias de terceiros também são investigados. Os três foram conduzidos para prestar depoimento.

Segundo a polícia, a quadrilha usava todo tipo de artimanha para enganar parentes das vítimas e se aproveitavam, obviamente, do momento de fragilidade. “Nos casos de ‘morte natural’, inúmeras são as conversas onde eles se passam por policiais militares e também por servidores do IML, para direcionarem o sepultamento para funerárias ‘parceiras’, onde ganham uma comissão, fraudando documentos para essa finalidade”, explicou o delegado.

Morto, estava vivo

Um dos documentos falsificados foi um boletim de ocorrência no qual um dos suspeitos, Luciano Alis Ferreira, tentou fraudar a morte do próprio pai, Luiz Gonzaga Ferreira. “Luciano chegou a fazer um Boletim de Ocorrência no dia 25 de fevereiro de 2015 comunicando a morte do pai vítima de atropelamento. Para a surpresa dos investigadores, o ‘morto’ apareceu em uma das conversas interceptadas autorizadas pela Justiça”.

Na gravação, Luciano disse ao pai: “Vou pedir uns R$ 8 mil, R$ 10 mil agora que está na mão. Não vou nem avisar o Tiago. Vamos só nós dois pai, ganhar uns R$ 4 mil”. A polícia apura agora se Luiz Gonzaga fazia parte do esquema ou se foi vítima do próprio filho. Outro caso de filho que tentou forjar a morte do próprio pai também foi registrado pelos policiais, mas o crime não se consumou porque a seguradora desconfiou das informações repassadas.

Apesar de todas as informações já obtidas pelas investigações, o Núcleo de Repressão a Crimes Econômicos (Nurce) não soube precisar quantos foram os casos e há quanto tempo a quadrilha agia. “Um dos presos estava há 20 anos trabalhando na área funerária, mas não podemos afirmar que ele agia todo este tempo. Quanto ao prejuízo em valores, dependemos, agora, que a seguradora responsável pelo DPVAT nos passe as informações”, explicou Renato Figueroa.

Durante a operação, os policiais apreenderam R$ 4.800 que acreditamos ser para o pagamento dos motoristas do IML. Cinco armas e munições, além de rádios comunicadores, também foram apreendidas na casa dos investigados. A próxima fase das investigações deve, segundo o delegado, apontar mais envolvidos no esquema. 

Quadrilha é suspeita de driblar a fila de funerárias em Curitiba. Foto: Arquivo.