Gangues amedrontam famílias e dividem o São Braz

No entardecer, as portas e janelas das casas já são fechadas. Cortinas impedem a entrada dos últimos raios de luz e também escondem o medo dos moradores do São Braz. Mães acendem velas para santos, pedindo proteção aos filhos que ainda estão na rua.

Pais ficam de olho no relógio, aguardando a hora da chegada do ônibus para ir ao ponto, buscar as filhas que estudam ou trabalham até tarde. Qualquer estampido é confundido com tiro. Famílias se perguntam: quem será a próxima vítima?

O clima de insegurança toma conta do bairro, desde que duas gangues rivais começaram a disputar valentia e território. Da brincadeira de jovens que se encontravam numa esquina para bater papo, surgiu o Comando do Extermínio (CDE). Do outro lado, apareceu a turma da Vila do Sapo (VDS).

Não tardou para as drogas tomarem conta dos dois grupos, que conseguiram armas (possivelmente com traficantes) e passaram a se matar. Há quem jure que até comerciantes têm colaborado com um ou outro bando, custeando mortes de indivíduos que lhes causavam problemas.

Desespero

O número de vítimas e o desespero das mães fez com que muitas passassem a buscar os assassinos de seus filhos. “Jurei em cima do caixão do meu menino, que não sossegaria até ver os autores daquela brutalidade na cadeia”, disse uma delas. Foi montado um dossiê dos marginais – muitos menores de idade – que passeiam impunemente pelo bairro.

Há fotos de jovens armados, cópias de conversas tiradas de sites de relacionamentos e documentos. Tem o registro até do momento em que comemoravam a morte de mais um . “Só os fortes sobrevivem”, usam como lema.

Não é necessário ser um espião para chegar aos membros das gangues. Basta ouvir a população. “Quem mora aqui tem medo de morrer”, garante uma mulher, que teve um filho assassinado e outros ameaçados. “

Tem muita gente que foi embora, depois de perder alguém da família ou sofrer ameaça”, revela outra mãe, que já se mudou do bairro, mas não esqueceu seu sofrimento.

População deve ajudar

Márcio Barros

Átila Alberti
Patrulhamentos não inibem ações.

“Somente com a ajuda da população conseguiremos combater e impedir a ação de gangues no bairro”, afirma o tenente Márcio Roberto da Silveira, comandante da 4.ª Companhia, do 12.º Batalhão da Polícia Militar, responsável pelo policiamento no São Braz. Segundo ele, a PM faz bloqueios, batidas policiais, blitz e usa o módulo móvel com freqüência.

No entanto, afirma que a polícia não é onipresente e precisa de informações que indiquem onde os crimes estão acontecendo e quem os está praticando. “Patrulhamos a região com várias ações, mas é impossível adivinhar onde um membro desses grupos vai agir”, explicou.

No últimos dias, a viatura do Projeto Povo São Braz recebeu diversas ligações anônimas. “Recebemos alguns nomes e já os estamos monitorando, além disso, vamos intensificar o patrulhamento, mas é essencial que a população tenha os telefones tanto da viatura, da companhia e da delegacia sempre à mão”, completou. Os números são: 9917-4241 da viatura do Projeto Povo São Braz, 3272-0719 da 4.ª Companhia e o da delegacia é 3372-3111.

Supostos líderes já foram presos

Mara Cornelsen e Márcio Barros

Robson Correia da Cruz e Diego dos Santos (homônimo do rapaz baleado), apontados como líderes do Comando do Exte,rmínio (CDE) estão presos. Foram capturados após o assassinato de Daniel Garcia Ribas, ocorrido em novembro passado, no centro de Curitiba.

Ambos confirmaram que decretaram a morte do jovem, só porque ele começou a namorar uma garota que residia no território da CDE. Daniel morava do outro lado.

A geografia do bairro, dominada pelas gangues, impõe desde laços afetivos até locais em que se pode ou não pegar ônibus, freqüentar bar ou ir a uma farmácia. A esperança da polícia era de que, com estas prisões, os garotos se conscientizassem dos riscos que correm, quando optam pelo crime. Mas de nada adiantou. Os novos atentados confirmam que as gangues voltaram a agir, para desespero das famílias que lá residem.

Comércio

Uma comerciante contou que já pensa em fechar o comércio e sair da vila. “Já fui assaltada oito vezes. Se foram os integrantes das gangues eu não posso afirmar, mas como asgangues agem sempre, qualquer coisa a gente já acha que foram eles”, contou.

Negócio de traficante

Átila Alberti
Rogério: dívida de drogas.

Apesar das denúncias relacionadas à ação das gangues, a polícia ainda não está levando a sério o assunto. O delegado Rogério Martin de Castro, do 12.º Distrito Policial (Santa Felicidade) assegura que os membros dos grupos rivais são apenas usuários de drogas e não assassinos.

Diz também que os traficantes da região não se envolvem com as gangues, mas as famílias asseguram que drogas e violência mantêm estreitas ligações. Ainda segundo Castro, as mortes de Cristiano de Freitas de Oliveira, 21, e o atentado contra Diego dos Santos, 18, tiveram como motivo dívida de drogas e não a briga de grupos rivais.

Crime

Cristiano foi perseguido pelo bairro e baleado. Correu até um bar na esquina das Ruas Nelson Thomaz e Milton Carlos de Oliveira, no Jardim Montana, onde tombou morto.

Enquanto a polícia atendia a morte de Cristiano, Diego foi baleado. Ele seguia pela Rua Ney Romanó, onde foi abordado por quatro indivíduos num Pálio e ferido. Diego segue internado.