Experiência revoltante

Voltar para o carro depois de um bate-papo com os amigos e encontrar a porta arrombada, com um vazio no compartimento onde estava o aparelho de som, não é nada agradável. Dá uma sensação de impotência, de raiva, de frustração. Mas passa ligeiro. Logo se avalia que o prejuízo material é recuperável, que um atentado à integridade física seria muito pior, e que, infelizmente, todos estamos sujeitos a estes dissabores num país com alto índice de criminalidade.

O que não se recupera tão facilmente é a confiança na figura policial que deveria resguardar a segurança da população. A PM paranaense, que carrega história de mais de 150 anos, é composta por imensa maioria de gente séria. Mas ainda precisa aprimorar o controle e a repressão sobre os bandidos escondidos debaixo da farda, que causam injusta desconfiança generalizada em quem paga seus salários – o povo.

No último fim de semana, experimentei a sensação de ter o aparelho de som furtado no Largo da Ordem. O mesmo ocorreu com um amigo que estacionou logo atrás e com pelo menos outros quatro proprietários de veículos, todos com portas e vidros arrombados na mesma rua, quase em frente à Igreja do Rosário.

Pequeno alívio foi encontrar uma viatura da PM a uma quadra dali – poderiam ter visto alguém, prendido algum suspeito. Mas a dupla de policiais não parecia muito preocupada. Disseram tranqüilamente que era o tipo de situação comum, que ocorre aos montes nos finais de semana. ?Já roubam nesse horário, porque sabem que tem bastante ocorrência?, disse um deles. Estranhamente, os PMs guardavam outro carro supostamente arrombado e disseram não poder deixá-lo ali sozinho – enquanto vários outros, logo adiante, estavam na mesma situação, alguns com alarme disparado. Orientaram a sempre deixar o carro no estacionamento e a prestar queixa no Ciac do 3.º Distrito Policial (Mercês).

Se a situação toda causou apenas transtorno e algum prejuízo, ver aqueles mesmos policiais na televisão, participando ativamente do esquema de furtos nas ruas do centro histórico, trouxe revolta. Não quero nem pensar na possibilidade de o meu aparelho de som também ter sido roubado por eles, e não por um daqueles moleques bem-vestidos que perambulam por ali. Pagar um turbilhão de impostos – incluindo, por conseqüência, os salários do funcionalismo público – e pedir ajuda ao servidor que pode ter te roubado é, no mínimo, fazer papel de palhaço.

Nunca concordei com muitos dos jargões do meio policial (o mais grotesco é o fascistóide ?bandido bom é bandido morto?). Mas um deles é absolutamente verdadeiro: o pior criminoso é o criminoso fardado (bom lembrar que a farda serve como referência para qualquer autoridade constituída, não só à PM). Aproveitar-se da condição profissional para aderir ao crime é um golpe sujo e traiçoeiro em quem paga para ser protegido. Contra o bandido comum, ao menos, estamos prevenidos. Que o comando da Polícia Militar e a Justiça Militar abandonem todos os resquícios de corporativismo para excluir quem mancha a corporação.

Carlos Simon é jornalista e repórter da Tribuna do Paraná

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