Doentes mentais e idosos eram obrigados a viver na imundície

Três integrantes da mesma família foram presas sob acusação de manter 63 pessoas, entre elas uma criança de 8 anos, em condições desumanas. Beabir Faria, 57 anos, a filha dela, Andréa Estevã Faria, 24, e o irmão de Beabir, Jamir Francisco Faria, 61, foram presos em flagrante por maus-tratos e cárcere privado.

De acordo com a polícia, eles são os proprietárias do Asilo Tia Leoni, na Rua Charles Darwin, no Jardim Aristocrata, em São José dos Pinhais.

O asilo funcionava regularmente. Na entrada havia quartos limpos e até uma banheira de hidromassagem e uma piscina. ?Quando pessoas interessadas em internar parentes ou quando a fiscalização chegava, era mostrada essa parte, mas os internos ficavam recolhidos em anexos nos fundos, sem condições de higiene e trancafiados por fora?, contou o delegado Paulo Silveira, titular da DP do município.

Ele disse que a irregularidade foi descoberta após uma denúncia feita ao Ministério Público, de que o local funcionava como um depósito de gente e que os maus-tratos aconteciam no período noturno. Diante da informação o Ministério Público comunicou a Secretaria de Saúde do município que, por sua vez, acionou a vigilância sanitária,

a Guarda Municipal e as polícias Civil e Militar. Foi formada uma força-tarefa e às 22h de anteontem, o grupo foi até o local. ?Houve certa resistência para que entrássemos para verificar a situação?, contou o secretário municipal de Saúde, Aldrian Cortes Matoso.

Imundície

O delegado disse que as 62 pessoas, algumas delas com deficiência mental e outras com idade avançada e problemas de saúde, eram mantidas em apenas três quartos.

?Os colchões eram jogados no chão. Baldes eram usados como sanitários e quando entramos estavam cheios de fezes?, comentou o delegado. Ele disse que também foram encontrados internos dormindo em cima de fezes, que não se sabe se eram deles ou de outros internos.

?Os quartos eram trancados com chave por fora. Como havia muitos doentes mentais, corria-se o risco de algum deles incendiar os colchões e todos morrerem carbonizados?, acrescentou o chefe de investigação, Altair Ferreira.

O delegado disse que foi recolhida farta documentação no local. ?Vamos verificar de que forma eram feitos os pagamentos. Alguns internos nos informaram que entregaram o cartão bancário que recebiam a aposentadoria para os proprietários do asilo?, contou Silveira. Ele disse que as investigações continuam para apurar se outras pessoas estavam envolvidas na administração do asilo.

Pacientes contam dramas

Alguns internos queriam contar sua situação e como viviam. Ludovica Solminhski, 57 anos, disse que vive no local há seis anos, apesar de o asilo só existir há menos de três. Antes era uma casa de prostituição. ?Eu dei meu cartão de aposentadoria para a mulher e ela recebia R$ 350,00?, contou Ludovica. Ela disse que tinha que ajudar na limpeza do local. ?Vim parar aqui porque tenho pressão alta. Agora já sarei, queria ir para a minha casa. Aqui fico trancada, eles não me deixam nem ir na igreja. É muito ruim. A comida não tem sabor?, reclamou. A única coisa boa, que Ludovica achou foi Sebastião Ferreira. Ele não fala, mas Ludovica, que passeia com ele pelo pátio de mãos dadas, diz que ele também é aposentado e que também ganha R$ 350,00 mensalmente.
Já Valdirene Wolcheski, 35 anos, parecia estar gostando das ?visitas? no local, queria falar com todos ao mesmo tempo. Não importando se eram repórteres, autoridades, médicos. Abordava quem passava ao seu lado. ?Minha irmã me deixou aqui. Agora quero ir embora?, desabafou.

Internações sem critério

Entre os internos havia seis detentos ou ex-presos do Complexo Médico Penal. ?Encontramos a documentação em um armário. Por se tratar de presos com problemas de psiquiatria, pode ser que o juiz tenha determinado que eles cumprissem pena em prisão domiciliar e a própria família os tenha internado. Vamos comunicar a Vara de Execuções Penais para saber em que situação essas pessoas foram parar neste asilo?, disse Altair. Uma criança, de 8 anos, foi encontrada trancada dentro de uma cozinha, com um doente mental.

Os internos contaram que passavam fome. O delegado lembrou que o Estatuto do Idoso determina que asilos têm que ter uma enfermeira e um médico de plantão. ?Da mesma forma, estabelecimentos que cuidam de doentes mentais também tem que cumprir certos requisitos?, salientou. ?Apuramos que os próprios doentes que administravam sua medicação?, comentou Altair.

Fiscalização vai aumentar

São José dos Pinhais tem 22 asilos cadastrados, segundo o secretário municipal de saúde, Aldrian Cortes Matoso. Destes, sete são casas destinadas a doentes mentais e o restante a idosos. ?Sempre fazemos fiscalizações, mas em horário comercial. Nunca foi encontrada nenhuma irregularidade, porque aos fiscais somente era mostrada a parte da frente, onde as condições de higiene são boas?, informou Aldrian. Ele informou que as fiscalizações vão ocorrer durante 24 horas. Ontem, médicos examinaram os internos para identificar a situação clínica de cada um. Também foi fornecida alimentação para as pessoas abrigadas no local.

Voltar ao topo