Abagges esperam justiça no caso Evandro

?Sinto felicidade e pavor. Quem vê o indivíduo ali pensa: será que vai mesmo preso? Depois vai preso e soltam. Será que vai haver justiça mesmo?? O comentário em tom de desabafo foi feito por Celina Cordeiro Abagge, 66 anos, um nome que ficou famoso no Paraná. Ela é acusada de assassinar durante um suposto ritual de magia negra o garotinho Evandro Ramos Caetano, em seu apartamento no centro da cidade.

Faltando três meses para sentar-se novamente no banco dos réus do Tribunal do Júri, Celina espera um desfecho para essa novela que mudou para sempre a sua vida e de sua família. ?Para nós (ela e a filha Beatriz, que é acusada de co-autoria do crime), nada importa. Só mostrar para o mundo que a gente realmente é inocente. Agora os algozes, os que montaram isso aí, é com a justiça da terra e divina?, torce.

Nesta entrevista exclusiva à Tribuna, Celina reafirma a sua inocência e da filha e confessa que está preocupada em ter que enfrentar o júri novamente. ?Vemos tantas armações, tantas coisas incorretas, que às vezes fico apreensiva. Tenho certeza que iremos demonstrar que somos inocentes. É só ver as provas nos autos?, citou. Por outro lado, fala que ir a júri é semelhante à ?hora da forca?. ?Você está ali com a corda no pescoço, só esperando que puxem a corda?, comparou.

Tortura

Como se não bastasse o grau de complicação do caso, o processo ainda é recheado de abusos, como a denúncia de tortura por parte das rés pela polícia. Desde o início Celina disse que foi torturada junto com a filha, Beatriz Abagge, hoje com 41 anos, mas só depois da prisão do coronel Valdir Copetti Neves é que as pessoas passaram a acreditar. ?A minha preocupação é que com tanta evidência tem gente que ainda nos condena. Estou preocupada porque eu achava que o Ministério Público era um órgão de Justiça, mas agora percebo que é um órgão só condenatório. Eles estão ali para condenar, não importa quem. Eles não querem ouvir, nem investigar?, criticou.

Ela se refere principalmente à decisão do Ministério Público de recorrer da decisão dos jurados, que absolveu Airton Bardelli e Sérgio Cristofolini, também acusados de matar o garotinho no ritual de magia negra. Segundo Celina, outro acusado – Osvaldo Marceneiro, que foi condenado, confessou e delatou Cristofolini e Bardelli, porque foi torturado.

Drama vira livro e filme

Os sete anos em que ficou  presa e o drama que viveu inspiraram Celina Abagge a escrever um livro, que já está na editora há oito meses, pronto para ser publicado. A obra, que ainda não tem título definido, conta histórias trágicas e ao mesmo tempo cômicas vividas por ela e por sua filha Beatriz Abagge, 41 anos, durante os três anos e nove meses em que as duas ficaram recolhidas na Penitenciária Feminina, em Piraquara. Também conta o drama da prisão domiciliar, que mãe e filha cumpriram durante três anos e três meses. Além de depoimentos, dela e da filha, também há o drama da família que sofreu discriminação da sociedade, além da angústia de ver Celina e Beatriz recolhidas no xadrez. O caso também será retratado nas telas através de um filme.

Celina disse que tentou escrever mas ao reviver a história chorava muito. Durante uma entrevista à jornalista Vânia Velt, se ofereceu para ser sua ?ghost writer? (escritora fantasma) e o livro começou a tomar forma.

Tortura deforma acusado

 ?Existem provas. Osvaldo Marceneiro ficou todo deformado. Quando estávamos presas, dom Pedro Fedalto foi visitá-lo e nos contou que o órgão sexual dele estava todo deformado, como se fosse um bife. Quase acabaram com a vida do rapaz?, indignou-se.

Outro fato apontado por Celina é o encontro do corpo de Evandro. ?O grupo Tigre tinha feito um arrastão no mesmo local e não encontrou nada. Meses depois a PM acha. Isso no mínimo é estranho?, comentou.

As mulheres Abagge podem até ser absolvidas uma segunda vez pela lei dos homens. Mas ao que tudo indica, nada poderá curar o trauma dessa dura experiência. ?Até hoje não sabemos quem são aqueles homens encapuzados, que nos torturaram. Por que eles não aparecem? Por que o coronel Neves diz que esqueceu quem são? Talvez porque quem apanhe não esquece, mas quem bate tem memória curta?, finalizou.

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