Vestígios de mudança no jornalismo

O jornal é um texto instigante para leitores curiosos e sem preconceitos. A curiosidade permite que interesses particulares possam ser satisfeitos com informações atualizadíssimas (ainda mais se a leitura se der no tempo real do jornal eletrônico). A ausência de preconceitos permite ao leitor realizar vôos rasantes no território variado das seções, dos cadernos, dos assuntos, dos comentaristas.

Jornal tem a ver com a liberdade de escolha (desde o próprio exemplar comprado em banca) e de tempo de leitura. Gosto de rever jornais antigos (costume que me proporcionou muitos estudos e escritos), e, sobretudo, gosto do tempo de calma e silêncio para uma leitura em diagonal para a primeira seleção daquilo que me interessa. As páginas viradas com cuidado para evitar o desfolhamento dos cadernos, a sofreguidão de encontrar o texto para o qual fui despertada na manchete da primeira página, a ansiedade de reencontrar os articulistas admirados e respeitados, a disponibilidade para encontrar o que nem sei mas se encontra à minha espera nas letras impressas, e que, quando encontrado, será gulosamente devorado numa leitura atenta e, muitas vezes, surpresa e incomodada.

A liberdade de ler não importa o quê, nem mesmo a quem o texto foi originalmente endereçado. A liberdade de ultrapassar a idade e ler o que diz respeito à infância que já vai longe – à juventude nem tão perto que a possa ver, mas nem tão distante que impeça seu reencontro parcial à velhice, que me espera com olhar fatalizado e mãos inclementes. Ler o que diz respeito a tempos pré-aposentadoria, pós-primeira dentição, antenúpcias, intermaternidades e outras épocas mais.

Experimentando a alegria dessa leitura livre de amarras temporais, encontrei a notícia no caderno Folhateen, de 11 de junho, de que os jovens decidem trocar as horas de imobilidade diante do computador por melhores tempos de passeios, conversas e leituras de livros. Duvidei de meus olhos. Mas estavam lá as palavras animadoras de alguns jovens entre 14 e 18 anos dispostos a abandonar a página eletrônica e a interatividade neurótica por uma conversa silenciosa e desafiadora de um livro.

Sem a interferência direta da escola muitas vezes a patrocinadora de tempos estendidos de copia e cola lá estava o reconhecimento da juventude de que ?Você fica meio louca, sabe??, ou ?Tem uma hora que chega.? ou ?Amo ler, mas detesto ler no computador?.

Confesso que me senti dividida. De um lado, a euforia por estar a cada semana mais familiarizada com o computador, arriscando até a trocar o e-mail pela participação em blogs! De outro, surpresa por descobrir que a atração pelos livros não era apenas manifestação de idade avançada. Entre sentir-me mais jovem e ver os jovens buscarem fontes mais convencionais de lazer e saber, prefiro sempre a segunda via.

São tênues sinais de mudança, em forma de leve fumaça. Para que se tornem mensagens quânticas falta muito exercício ainda. Mas depois de tantas previsões pessimistas sobre a decadência do escrito em papel, soa esperançosa a notícia de que o computador pode estar induzindo leitores a trocá-lo pelos livros, num positivo, eletrônico e maravilhoso tiro no próprio pé dessa maquininha útil, mas devoradora do tempo.

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