TST aplica rigor da processualística do direito privado para excluir direitos trabalhistas já reconhecidos

A Seção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho reformou decisão das instâncias inferiores isentando o banco do Estado do Paraná de pagar as verbas trabalhistas reconhecidas e decorrentes do contrato de trabalho reconhecido com o banco, por contratação irregular de estagiário para trabalho direto e permanente.

Para a cassação das vantagens de bancário deferidas na decisão recorrida o TST, SDI-1, por maioria, reformou a decisão do TRT-Pr ao entendimento de que o trabalhador havia obtido reconhecimento nas instâncias inferiores ao direito a créditos pecuniários que não tinha pedido.

Não obstante, todavia, o próprio Acórdão do TST, E-RR-578194/1999-2, que o autor esclareceu na inicial que desenvolveu trabalho exclusivo, remunerado, subordinado, permanente e essencial à finalidade econômica do banco, pedindo a nulidade do contrato de prestação de serviços, com base no artigo 9.º da Consolidação das Leis do Trabalho, por nulos os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na CLT.

E que, também, por exercer as mesmas atividades que os bancários efetivos, pleiteou, expressamente, o reconhecimento como empregado e direito a verbas trabalhistas, inclusive as decorrentes de convenção coletiva da categoria, tais como ajuda-alimentação, taxa de produtividade, adicional por tempo de serviço, gratificação semestral, gratificação e quebra de caixa.

Em nosso entendimento, a decisão, por maioria, do TST, SDI-1 é equivocada, afastando-se dos contornos próprios do direito do trabalho que não adota os rigores processualísticos do direito comum privado, tendo regramento próprio com base na oralidade do processo, devendo o pedido atender de forma simples apenas o disposto na norma suficiente disciplinada pelo artigo 840 consolidado:

?Art. 840. A reclamação poderá ser escrita ou verbal.

§ 1.º – Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do presidente da Junta, ou do juiz de Direito, a quem for dirigida, a qualificação do reclamante e do reclamado, uma breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante.?

E essa conclusão menos formalista é que por certo deu suporte à condenação do banco aos créditos pecuniários deferidos em razão de que o exigido pelo direito processual civil se dá em razão do entendimento de que ainda prevaleça na Justiça do Trabalho o jus postulandi, vige no direito do trabalho a simplicidade, incumbindo ao juiz a qualificação jurídica dos fatos, em decorrência do milenar brocardo ?da mihi factum dabo tibo jus?.

Tendo o direito do trabalho regulação própria, a adoção dos critérios mais rigorosos importados do direito processual do direito comum de interesse patrimonial não pode ser admissível, bastando a simples descrição dos fatos que pode ser breve, dispensados maiores formalismos. O acertamento da pretensão incumbe ao Juiz Trabalhista, cujos poderes são maiores que aqueles do Juízo Comum, embora nem sempre sejam aceitos como tais e exercidos, não se dando prevalência aos princípios norteadores da Carta Cidadã à prevalência do social, da responsalilidade do capital pela empregabilidade, com salário digno.

Quando se estabeleceu a singeleza de exposição dos fatos e do pedido simplificado apoiado no princípio da oralidade, a intenção do legislador era de impedir, desde o início do exercício do direito de ação pelo trabalhador, quaisquer entendimentos que privilegiem o formalismo processual, em detrimento do direito material que se põe diante da necessidade de uma tutela jurisdicional.

Essa adoção do princípio da oralidade, menos formal, atende inclusive aos enunciados constitucionais em favor da dignidade da pessoa humana, prestigiando o Juiz, transformando-o num agente social e não num paciente da sociedade. O princípio da inércia, típico do processo civil, não se aplica ao Judiciário Trabalhista.

Esse entendimento já foi até mesmo pacificado pelo colendo Tribunal Superior do Trabalho, cujo entendimento foi cristalizado pelo Enunciado 263, segundo o qual: ?O indeferimento da petição inicial, por encontrar-se desacompanhada de documento indispensável à propositura da ação ou não preencher outro requisito legal, somente é cabível se, após intimada para suprir a irregularidade em dez dias, a parte não o fizer.?

E observe o MM. Juízo que esse entendimento, a par de prestigiar o informalismo típico do processo do trabalho, acaba por consagrar a aplicação do próprio Código de Processo Civil, cujo artigo 284 é de clareza solar:

?Art. 284. Verificando o juiz que a petição inicial não preenche os requisitos exigidos nos arts. 282 e 283, ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor a emende, ou a complete, no prazo de 10 (dez) dias.?

Em nosso entendimento o reclamante indicou em sua peça inicial à suficiência os fundamentos jurídicos do pedido que as defesas puderam à exaustão contestar os fatos alegados, utilizando-se inclusive do abuso de defesa, deixando de atender à obrigação legal da lealdade e boa fé, usando o processo para conseguir objetivo ilegal (não pagamento dos créditos pecuniários decorrentes da relação de trabalho reconhecida) e pleiteados ainda que de forma simples na exordial.

Examinando a questão da formalidade exigida no direito do trabalho quando à inicial, a jurisprudência trabalhista tem o entendimento seguinte: ?(TRT17-001920) PETIÇÃO INICIAL TRABALHISTA – REQUISITOS. ?A petição inicial trabalhista não precisa descer a minúcias, bastando que identifique a relação com datas de início, término (se houver) e valor (normalmente, e a quantia referente ao último salário). ?Afinal, como diz Pedro Vidal Neto ?A própria lei limita os requisitos da inicial a uma breve exposição dos fatos, sem exigir fundamentação jurídica e dispensando formalidades?? (Jorge Luiz Souto Maior in Petição Inicial no Processo Civil, no Processo do Trabalho)? (Recurso Ordinário n.º 40.2002.3.17.0.8 (1608/2003), TRT da 17ª Região/ES, Rel. Juiz Cláudio Armando Couce de Menezes. j. 11.2.2003, unânime, DO 11.3.2003).

Ao adotar o TST, SDI-1 processualística processual mais rigorosa, abandonando a simplicidade autorizada pelo princípio da oralidade prevalente no direito do trabalho, nossa conclusão é que a decisão é equivocada, representando retrocesso social, premiando o banco que se beneficiou da própria torpeza em utilizar as energias do trabalhador que não mais podem ser repostas, pagando-lhe remuneração incompatível com os serviços prestados, o que caracteriza, inclusive, enriquecimento ilícito.

Leia mais.

Jornal O Estado do Paraná, Caderno Direito e Justiça, edição de 23/9/07.

?Saber pedir faz a diferença em ação de vínculo empregatício

A Seção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho isentou o Banco do Estado do Paraná S.A. de pagar indenização a trabalhador sem vínculo de emprego, mas com relação de trabalho. Por maioria, a SDI-1 reformou entendimento da Terceira Turma que mantinha direitos pecuniários ao antigo contratado do banco, que receberia o que não tinha pedido.

O trabalhador foi admitido pelo banco em novembro de 1989 para exercer a função de escriturário. A empresa não procedeu ao registro em sua carteira de trabalho, alegando que ele era apenas prestador de serviços (ou estagiário). Com ele, o banco fazia somente sucessivos contratos de prestação de serviços. Dispensado sem justa causa em dezembro de 1994, não recebeu verbas rescisórias e trabalhistas.

Na reclamação trabalhista, no entanto, o autor argumentou que desenvolveu trabalho exclusivo, remunerado, subordinado, permanente e essencial à finalidade econômica do banco. Pediu nulidade dos contratos de prestação de serviços, com base no artigo 9.º da Consolidação das Leis do Trabalho, que diz serem nulos os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na CLT.

Por exercer as mesmas atividades que os bancários efetivos, o trabalhador pediu, expressamente, reconhecimento como empregado e direito a verbas trabalhistas, inclusive as decorrentes de convenção coletiva da categoria, tais como ajuda-alimentação, taxa de produtividade, adicional por tempo de serviço, gratificação semestral, gratificação e quebra de caixa.

Na contestação, o Banco do Estado do Paraná alegou a impossibilidade jurídica do pedido, com base no artigo 37, inciso II, da Constituição Federal, que exige concurso público para investidura em emprego público. Segundo a empresa, o trabalhador ingressou no banco primeiro como estagiário e depois no quadro de provimento não-efetivo, sem prestação de concurso público.

A 2.ª Vara do Trabalho de Maringá (PR) sentenciou ser ilegal a contratação do bancário, mediante vínculo de estágio de estudante, e reconheceu todos os direitos pecuniários cabíveis da relação de emprego. Deixou, porém, de declarar a efetivação do vínculo empregatício entre as partes, por desobediência ao mandamento constitucional da admissão por concurso público.

Ao recorrer ao TRT da 9.ª Região, o banco argumentou que a sentença violou os artigos 128 e 460 do CPC ao condenar o reclamado ao pagamento de indenização por relação de trabalho, sem que houvesse qualquer pedido específico do autor neste sentido. Para a empresa, o juiz extrapolou os limites da lide, com julgamento ?extra petita? (além do pedido), pois o trabalhador requereu o reconhecimento do vínculo de emprego e não o pagamento de indenização pelo reconhecimento de relação de emprego.

Sem sucesso nos recursos ao TRT e à Terceira Turma do TST, que entendiam não haver julgamento ?extra petita?, o banco apelou com embargos. Na SDI-1, o voto do relator, ministro Brito Pereira, era por não conhecer do pleito da empresa. No entanto, a maioria acabou por acatar a divergência do ministro Milton de Moura França, que conhecia dos embargos e determinava excluir da condenação a indenização decorrente das parcelas relativas à condição de bancário.

Redator designado dos embargos, o ministro Moura França ressaltou o impedimento do regular exercício do direito de defesa do banco, garantido pelo artigo 5.º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal. O pedido específico impôs à empresa o ônus de se defender exclusivamente em relação a essa realidade jurídica. Houve, na sentença, ofensa literal dos artigos 128 e 460 do CPC, pois ?não era permitido condenar o reclamado a pagar as verbas indenizatórias, sob o fundamento de que houve relação de trabalho, porque esse não foi o pedido principal, e muito menos sucessivo?.

(E-RR-578194/1999-2)

Link:

http://www.parana-online.com.br/noticias/index.php?
op=ver&id= 306256&caderno=5

Luiz Salvador é presidente da Abrat (www.abrat.adv.br), secretário geral da ALAL (www.alal.info), representante brasileiro no Departamento de Saúde do Trabalhador da Jutra (www.jutra.org), assessor jurídico da Aepetro e da Ativa, membro integrante do corpo técnico do Diap e atual secretário da CNDS do Conselho Federal da OAB. promove@onda.com.br www.defesadotrabalhador.com.br

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