Frederico Eduardo Z. Glitz

Tradição jurídica e o comércio internacional

Quando se fala de comércio internacional são muito comuns as referências a ampla liberdade de trânsito de bens, pessoas e serviços através das fronteiras nacionais, ou seja, a consagração do chamado “livre comércio”.

Esta fórmula, contudo, pode parecer mais generosa do que realmente é. Isso porque o comércio internacional não é, como aparenta ser, alheio a condicionamentos de ordem política, econômica ou jurídica específicas de cada país.

Em verdade cada Estado mantém, ainda, em cada um daqueles sentidos, grande peso na definição dos limites ao acesso aos seus próprios territórios e mercados. Com isso se reafirma a tradicional fórmula da soberania nacional.

Por outro lado, contudo, também é verdade que cada vez mais o país deve se adequar aos ditames de origem internacional. Quer porque com eles o Estado concordou, por meio dos mais diversos Tratados, por exemplo, quer porque, em alguma medida, está obrigado a respeitá-los, independentemente da natureza dessa obrigatoriedade (decisões de Cortes Internacionais, como o Tribunal Penal Internacional, por exemplo).

Assim, em termos estritamente jurídicos, passa-se, hoje, a discutir qual é a repercussão da globalização para o espaço de liberdade que cada país tem de determinar suas próprias regras atinentes ao comércio realizado pelos seus nacionais. Em outras palavras é o desafio de se entender a globalização e as conseqüências dela para o poder relativo de o Estado ditar as regras do “jogo” comercial.

O comércio internacional tem, em verdade, demonstrado que o esquema clássico totalmente lastreado na atuação legislativa estatal não é mais absoluto. Em termos contratuais, por exemplo, reconhece-se a existência, validade e efeitos de cláusulas, costumes e soluções empresariais e negociais quer elas sejam reconhecidas pela lei de cada país ou não.

Os agentes de comércio internacional, os transportadores e os Tribunais nacionais já sabem disso quando, cotidianamente se deparam com cláusulas de transferências de riscos sobre a mercadoria (Incoterms) ou com os modelos de documentação de embarque ou interpretem a forma de realizar o pagamento de uma carta de crédito.

Apesar disso, o padrão de pensamento jurídico, especialmente o brasileiro, continua atrelado ao formal da lei, estático e não criativo. A inserção em mercado global, contudo, passa a exigir também soluções jurídicas adaptadas globalmente.

Este esforço, por certo, não é exclusivo dos empresários envolvidos com exportações e importações. Ele ultrapassa a fronteira do público e privado para alcançar todos aqueles que agem como agentes econômicos (inclusive o Estado), instituição de ensino e formadores de opinião.

Por certo, portanto, não se trata apenas de adaptar apenas a infra-estrutura material de um país a uma melhor capacidade de produção e exportação, mas a mentalidade de seus operadores para atuarem transnacionalmente. Talvez este seja o maior desafio do Comércio Internacional brasileiro.

Frederico Eduardo Z. Glitz é Advogado, Professor da Faculdade de Direito da Unibrasil e Universidade Positivo. Diretor Científico Instituto de Pesquisas em Comércio Internacional – Inter.

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