Situação jurídica do nascituro

A presente discussão possui singular importância se observada a inclusão dos Direitos da Personalidade (arts. 11 a 21) do novo Código Civil.

Em nosso ordenamento jurídico, convém destacar, o nascituro não está elencado como incapaz, nem como capaz, posto que o artigo 2.º do Código Civil persistiu, a par de críticas antigas, na positivação da teoria natalista, ressalvando, contudo, os direitos do nascituro desde a concepção.

A questão se amplia se analisadas as proposições feitas pela teoria natalista e teoria concepcionista, visto que cada qual possui uma ótica diferenciada sob o início da personalidade civil. Para a teoria natalista (Pontes de Miranda, Caio Mário da Silva Pereira), o nascituro possui apenas “mera expectativa de vida” pois que a personalidade civil só se adquire com o nascimento com vida, sendo considerado até lá apenas parte das vísceras maternas.

Noutro lado, há a teoria concepcionista (Planiol, Teixeira de Freitas), que possui duas vertentes, quais sejam: a verdadeiramente concepcionista, que preconiza os direitos do nascituro desde a sua concepção, sem qualquer outra condição; e a concepcionista da personalidade condicionada (Eduardo Espínola e Espínola Filho), que reconhece a personalidade desde a concepção, porém sob a condição de infans conceptus, isto é, desde que nasça com vida.

A teoria natalista, portanto, apregoa que embora o nascituro possua mera expectativa de personalidade, estão garantidos os direitos do nascituro para o que lhe for juridicamente proveitoso. Em contrapartida, a teoria concepcionista destaca que se o nascituro possui direitos, é sujeito de direitos, então há personalidade, é pessoa. Se não fosse pessoa, enfatiza, como justificar que o nascituro possa ter o direito de estado de filho (1.597s CC); direito à curatela (1.778s CC), à representação, direito de ser adotado, à doação, e ter posse em seu nome (877s CPC)? Em síntese quer dizer que se não é pessoa, não é nada, e o nada não se representa.

Analisando alguns direitos assegurados aos nascituros podemos nos posicionar de forma mais segura em relação a uma das três correntes mencionadas acerca do início da personalidade civil da pessoa.

O artigo 1.609 do Código Civil sintetiza o disposto no artigo 26 do Estatuto da Criança e do Adolescente, e no artigo 1.º da Lei n.º 8.560/92, dispõe que o nascituro pode vir a ter reconhecida a sua paternidade por escritura pública ou escrito particular arquivado em cartório, testamento ou manifestação direta e expressa perante o juiz, de forma que considera o nascituro como sujeito de direitos, portanto, pessoa.

O artigo 1.621 do Código Civil preconiza que “a adoção depende de consentimento dos pais ou dos representantes legais”, estendendo a necessidade de anuência às pessoas capazes, e não apenas incapazes ou nascituro como dispunha o antigo artigo 372. Todavia, não excluiu taxativamente a possibilidade de o nascituro vir a ser considerado uma pessoa. O artigo 542 do Codex Civilis torna válida as doações feitas ao nascituro, de forma que o está considerando pessoa, pois que sujeito de direitos.

O artigo 877s do Estatuto Processual Civil instrumentaliza a posse em nome do nascituro; os natalistas afirmam que se está preservando apenas a expectativa de direitos, posto que “não há como re-presentar pessoa que ainda não existe”. Entretanto, tais argumentações nos parecem carecer de maior racionalidade, visto que só uma pessoa é sujeito de direitos, de forma que se tenta mascarar ao máximo a teoria concepcionista da personalidade condicionada.

Pela singela explanação vislumbramos que o Código Civil pátrio, a rigor, segue a teoria concepcionista da personalidade condicionada, visto que, conquanto estabeleça o início da personalidade civil com o nascimento com vida, acaba pondo os direitos do nascituro a salvo desde a concepção, de forma que este sempre terá seu direito resguardado, diferente do que dispunham os romanos, para quem, por exemplo, não se admitia sequer a representação (non pupilus qui in utero est). Crítica plausível é a que se aduz ao legislador do novel Código Civil em ter perenizado a discussão acerca da situação jurídica do nascituro, ou seja, considerou a teoria natalista como início da personalidade civil, mas pôs ressalvas a esta, de forma que em nosso entender já deveria ter positivado a teoria concepcionista da personalidade condicional, no seguinte sentido: Art. 2.º – A personalidade civil da pessoa começa desde a concepção, condicionada ao nascimento com vida, o que evitaria algumas aberrações ligadas ao biodireito, tais como a mudança de cromossomos do embrião, de forma a mudar o sexo do nascituro; a eliminação de embriões por não serem considerados sujeitos de direito, visto não possuírem personalidade jurídica; entre outros aspectos relacionados à fase embrionária do nascituro, que já repercutem no mundo jurídico.

Alexandre Sturion de Paula

é bacharelando em Direito pela Universidade Norte do Paraná-Unopar.

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