SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA – Confissão espontânea (I)

Na Exposição de Motivos da reforma do Código Penal restaram esclarecidas as razões de ser relacionada a confissão espontânea como causa mitigadora da pena, ficando clara naquela oportunidade a intenção do legislador ao incluir esta circunstância dentre aquelas que atenuam a pena. Pelo que se depreende dessa Exposição, a confissão tem “como estímulo à verdade processual, ao agente que confessa espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime, sem a exigência, em vigor, de ser a autoria ignorada ou imputada a outrem”.

Constata-se, assim, que a intenção do legislador ao beneficiar o infrator que confessa espontaneamente o crime, tem por finalidade encontrar a verdade processual. Isto é, possibilitar que, ao final do feito, o julgamento represente a verdade sobre todos os fatos relacionados com o crime julgado, aplicando-se a justiça, tão difícil de ser realizada, quando não impossível, nas hipóteses em que o réu nega a participação no crime e ainda apresenta álibi verossímil.

Esta verdade processual representa o objetivo e a necessidade não somente do julgador que profere a decisão, mas também de toda a estrutura do Estado, o qual, ao regrar condutas impondo sanções àquelas por ele consideradas desregradas, pretende que sejam punidas exclusivamente as que se enquadram na previsão legal.

Tanto para o Estado como para o juiz, na maioria das vezes, esta verdade processual não aflora senão quando o réu confessa a autoria do crime em todas as suas circunstâncias.

Por outro lado, não se ignora a péssima estrutura das instituições responsáveis pela investigação dos fatos criminosos, sem falar das notícias de corrupção nos quadros responsáveis pela produção de prova na fase de inquérito. As dificuldades de toda ordem para se produzir uma boa investigação, onde, grande número de vezes, até mesmo os órgãos responsáveis pela perícia sequer dispõem de equipamentos, e mesmo materiais, para realizarem perícias confiáveis, além de inúmeras outras dificuldades que podem ser elencadas.

Quanto ao Ministério Público, responsável pela produção das provas da acusação nas ações penais públicas, assim como as privadas sujeitas à representação, na esmagadora das vezes não investiga os fatos da denúncia, baseando sua acusação nas provas colhidas na fase policial, muitas vezes nas circunstâncias atrás vistas.

Na fase judicial também constatam-se falhas e omissões enormes. É comum juízes simplesmente ratificarem depoimentos tomados na fase policial, principalmente das testemunhas de acusação, sem se importarem quanto a estas provas representarem ou não a verdade sobre os fatos. Quem atua na vida forense não pode dizer que nunca viu ou ouviu dizer que representantes do Ministério Público assinam atas de audiência como se tivessem participado deste ato, quando não estiveram presentes. Esta mesma afirmação cabe às defesas dativas, quando, muitas vezes, há troca de favores entre defesa e juiz. A defesa freqüentemente ajuda o juiz ao aceitar o ônus de defender o réu, pois sem ela não é possível praticar atos processuais, à exceção do interrogatório do réu, e o juiz não exige que participe efetivamente da instrução do processo.

Esta é a nossa realidade quanto à produção de provas nos feitos criminais, e que, na maioria das vezes, são as únicas que embasarão a condenação ou absolvição do acusado.

Feita esta análise, não é difícil mensurar a importância da confissão para a busca da verdade processual pretendida pelo legislador, conforme dito na exposição de motivos.

Justamente por não estar alheio à importância da confissão do acusado, foi que o legislador pátrio posteriormente à reforma da parte geral do nosso código, em legislações esparsas, por diversas vezes incutiu a esta circunstância fator de diminuição de pena, e até mesmo fatos a ensejarem o perdão judicial ou a extinção da punibilidade.

Nesta linha podemos citar a Lei 8.137/90, a qual, ao tratar de ilícitos fiscais, previu que a confissão espontânea em tais delitos cometidos por quadrilha, ou em co-autoria, que revele a identidade de co-autor ou partícipe, assim como toda a circunstância, fará jus à diminuição da pena em um a dois terços.

Outra previsão legal é a do art. 6º da Lei 9.034/95, a qual regula especialmente crimes organizados, onde novamente a contribuição espontânea do acusado, ao possibilitar o esclarecimento dos autores da infração penal, também autoriza a diminuição de um a dois terços da pena.

Temos ainda a Lei 9.613/98, que cuidou do crime de lavagem de dinheiro, onde restou previsto que quando o autor, co-autor ou partícipe colaborar espontaneamente para esclarecimento da infração que implique a condenação penal, ou a localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime, terá direito à redução da pena em um a dois terços, a qual será cumprida em regime aberto, podendo ainda o juiz deixar de aplicar a pena ou substituí-la por restritiva de direito.

Recentemente, a nova Lei Antitóxicos (10.409/02), também dando o merecido relevo à confissão, previu a redução da pena ou o perdão judicial àqueles acusados que colaboram com o processo na descoberta da verdade dos fatos, inclusive sem fazer qualquer exigência da espontaneidade.

Estas são algumas leis especiais que cuidam de diversas condutas infracionais específicas, como, no caso, crimes fiscais, crimes organizados e lavagem de dinheiro, onde o legislador conferiu tratamento de causa diminuidora de reprimenda, perdão judicial ou extinção da punibilidade, aos infratores que confessam o crime. De todas elas extrai-se o objetivo da aplicação desta benesse: incentivar a confissão para obter ou chegar próximo da verdade processual, conseguindo, com isso, o apenamento de todos os infratores.

Jorge Vicente Silva

é pós-graduado em Pedagogia em nível superior e especialista em Direito Processual Penal pela PUCPR.

E-mail: jorgevicentesilva@hotmail.com . Site: jorgevicentesilva.com.br

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